Capítulo 28: Gritos viscerais

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Eu arqueei ambas as sobrancelhas e arregalei os olhos.

— Vidente Cassandra? — Inquiri, a encarando por cima dos ombros, ainda com os pés na janela. — O que faz aqui?

Cassandra me encarava com seriedade.

— Algo me dizia que você precisava de uma visita. Eu sou uma vidente, afinal. — Ela declarou, se aproximando. — Desça da janela, Brooke. Pode acabar se acidentando.

Eu ri de nervoso.

— Eu vivia descendo pela janela da minha torre, pode crer que isso não é um problema. — Respondi, com a voz trêmula.

Os olhos de Cassandra foram para a mochila em meu ombro.

— Trevor me recebeu na entrada e contou que vocês discutiram e você trancou o quarto. Agora eu te vejo parada na janela com uma mochila no ombro. Não tem nada que queira me dizer? — Cassandra arqueou uma sobrancelha. — Eu garanti sua sobrevivência e sou responsável por você. Me deve explicações.

Eu ri sem humor. Na verdade, não só ri como gargalhei, enquanto descia da janela. As gargalhadas vieram acompanhadas de lágrimas enquanto eu me aproximava da vidente, a encarando de forma ensandecida.

— Eu não quero que cuide de mim. Eu quero viver. — Expressei, com um sorriso desapegado, abrindo os braços. — Eu cansei, vidente Cassandra. Eu cansei de acreditar nas histórias antigas, o Oleiro… ele não se importa mais. Eu cansei de ouvir você. Eu cansei de sofrer.

Cassandra me olhou de forma enigmática e então estendeu seu cajado ao meu lado e vi a pedra na ponta brilhar. Olhei para trás num reflexo e vi uma densidade dourada cobrir toda a janela, e então ficar invisível. Eu franzi o cenho e fiz uma pequena corrida até a janela, e percebi que quando tentava estender minha mão para fora, minhas mãos tocavam o que parecia uma parede invisível. Eu arqueei ambas as sobrancelhas e me voltei para Cassandra, desacreditada.

— Você vai me prender? É sério? — Inquiri, com a voz rasgada e enraivecida.

Cassandra suspirou profundamente.

— Brooke, se você quiser ir, é um direito seu, e as consequências também são suas. Mas não antes de conversarmos. — Cassandra se aproximou da porta do quarto, fechando-a atrás de si antes de voltar para perto de mim. Fiquei me perguntando como ela a abriu. — Nas nossas duas reuniões, eu te perguntei se estava tudo bem. E tenho certeza que há mais coisas que tem passado e não me contou.

Eu balancei a cabeça, sem conseguir conter minha indignação.

— É óbvio que eu não tô bem. Olha pra minha vida, Cassandra. Não tenho sequer dignidade. Tudo que você viu desde que acordou não é metade de tudo que já tive que passar. — Esbravejei.

— E é isso que eu quero que você confie em mim para dizer, Brooke. — Cassandra manteve seu tom de firmeza e ternura. — Eu quero que confie em mim para dizer o que te causa tanta raiva. Eu sei que há algo errado, mas você mesma precisa me contar. — Explicou.

Eu apertei meus cabelos entre minhas mãos, contornando Cassandra e me sentando na cama, entrelaçando minhas mãos enquanto a olhava com meus olhos cansados.

— Tudo tem estado horrível. As pessoas acham que minha vida melhorou porque mudei para essa casa, mas desde que cheguei aqui o Hamartía tem invadido meus sonhos para falar comigo, tenho que lidar com o fato do Trevor ser meu marido e não me ver como um ser humano, eu sinto medo de ser traída porque tenho certeza que não sou amada, e no fundo eu sei que se eu não fosse humana nada disso estaria doendo tanto. — Toquei meu próprio busto, sentindo as lágrimas escorrendo novamente. — Se eu for, vou ser mais feliz. Longe dessa cidade, longe desses sentimentos. Me desculpe por dizer isso mas eu não quero mais ser humana, vidente. Eu não quero a centelha divina. Eu só quero um pouco de misericórdia, só quero nem que for uma fagulha de felicidade e insensibilidade a esse mundo horrível.

Herdeira de Sangue e Fogo [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora