Capítulo 38: A besta da neblina

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Por mais que Trevor tenha insistido que eu deveria ficar em casa e descansar pelo menos por hoje, eu quis ir para o Asas Iluminadas logo no dia seguinte ao que descobri minha gravidez. Não queria ficar em casa o dia inteiro. Minha reunião com Cassandra hoje foi desmarcada, pois ela resolveria questões relacionadas ao reinício da Ordem do Oleiro. Ao que parece, está cada vez mais próximo o dia em que a Ordem do Oleiro ressurgirá em Torinco.

E o principal sinal disso é que já faz algum tempo que membros da Ordem de Ésefo tem migrado para a cidade. Ao que parece, receberemos ajuda externa para reunir novamente a Ordem em Torinco. Cassandra pediu que ao menos por enquanto, eu não me preocupasse com isso. Talvez por ela saber que em Torinco, eu sou inútil socialmente.

Eu e Trevor fomos ao Asas Iluminadas. Chegando lá, novamente precisei passar pelo que passei quando nos casamos: muitas pessoas vinham nos parabenizar, ao menos agora que havia uma criança em meu ventre, as pessoas lembravam que eu também merecia os parabéns. Ronan estava mais quieto que o comum, Lana e Teseu me olhavam de longe e murmuravam desdenhosamente. Não vi Circe em canto algum, e isso me frustrou, pois queria me distrair ao perguntar a ela como foi seu encontro com Hassan.

Eu suspirei profundamente e resolvi treinar, cumprir de uma vez as horas que ainda faltavam nesta semana.

Resolvi treinar nos alvos em movimento. Treinar sozinha não era tão bom quanto treinar com Circe. Os alvos se moviam em alta velocidade e eu os acertava com maestria, de perto e de longe, lutando para que eu mesma não fosse atingida por seus movimentos rápidos, enquanto descontava na luta todos os meus sentimentos controversos.

Ter um herdeiro me faria ter valor agregado socialmente, ainda mais do que simplesmente ser a esposa de Trevor. No entanto, eu sabia que não era só sobre mim, e as preocupações retornavam na forma de um estresse bruto.

Eu continuei socando aqueles alvos, descontando meu estresse e insegurança, até o momento que uma névoa densa começou a se formar pouco a pouco em volta de mim, de forma que somado ao escuro já presente naquela área, eu não conseguia mais ver os alvos. Eu ri sem humor. Com certeza era mais uma implicância de Teseu. Vez ou outra ele ainda me provocava apenas por esporte.

— Muito engraçado. — Desdenhei, saindo rapidamente da área dos alvos em movimento, antes que ele começasse a me mandar golpes ilusórios.

Entretanto, ao sair percebi que a névoa densa cobria todo o lugar e todos estavam igualmente confusos. Eu acendi uma chama em minha mão e meu primeiro impulso foi procurar Trevor, para descobrir o que estava acontecendo.

Um barulho de explosão preencheu o ambiente. Eu arregalei os olhos desorientada e assumi posição de combate, formando as manoplas em meus braços. Olhei para onde a explosão veio, se me lembrava bem era perto da arena. Uma fumaça de cor mais cinzenta subia, mas sequer tive tempo de ir checar aquilo antes de ouvir mais explosões e dessa vez alguns gritos, vindos de perto da área dos treinos de força. As pessoas começaram a ficar mais agitadas, de repente todos corriam de um lado a outro procurando quem poderia ser o autor de toda essa confusão.

— A porta tá trancada! — Alguém gritou.

Haviam sons de combate. Haviam pessoas lutando, mas era difícil saber se era contra quem havia posto essa névoa, ou uns contra os outros por não estarem enxergando.

Andei na direção que eu sabia ser a porta. Algumas pessoas esbarraram em mim, eu caí e me levantei com dificuldade, tocando minha barriga com preocupação enquanto andava em passos curtos, lentos e cautelosos.

Numa situação dessas, mesmo militares ficam desesperados. Ninguém espera que alguém tenha a audácia de atacar uma base militar. E se tem essa audácia, é porque tem muita confiança.

Meu braço mecânico foi segurado por trás próximo à axila, tive como impulso me virar e socar com meu braço humano, seja lá quem me tocou, com toda a força.

— Argh! Brooke, pelo Oleiro. — Trevor reclamou, se reaproximando. Ele estava próximo o suficiente para que eu conseguisse ver seu rosto, agora levemente queimado, embaçado pela neblina.

Eu arregalei os olhos.

— Me desculpa, eu juro que…

— Tá, não importa. Só preciso tirar você daqui. — Falou.

Permiti que Trevor me guiasse, me puxando pelo braço mecânico em direção à porta da sala de treino.

Mais uma explosão foi ouvida, seguida de mais gritos e eu podia ouvir sons de combate.

— Ei cara, sou eu! Para de ser louco! — Ouvi um rapaz gritar.

— Nessa neblina não dá pra enxergar! — Retrucou.

Meu coração batia acelerado.

— Trevor, o que é tudo isso? — Inquiri.

— Aparentemente os terroristas que hipnotizam pessoas estão aqui. A neblina é comum nos ataques deles. O problema é que até agora ninguém… — A frase de Trevor foi interrompida e ele soltou meu braço quando foi brutalmente atingido e jogado para o lado por um enorme vulto.

Eu arregalei os olhos desorientada tentando encontrá-lo.

— Trevor? — Chamei, refazendo as manoplas em meus punhos. — Trevor, cadê você?! — Gritei.

Tudo que vi na densa neblina foram olhos amarelados cujas pupilas afiadas se comparavam a lâminas e olhavam diretamente para mim, eram pertencentes a uma besta enorme, cuja face era de um lobo e sua pelagem no corpo humanoide era alaranjada. Ele usava uma armadura que parecia feita de cobre, um material reluzente e forte. Seu peitoral, braços e pernas eram protegidos por placas de metal. Aquela fera veio andando até mim e eu refiz as manoplas de fogo em meus braços, entretanto mal deu tempo daquela besta me tocar, pois Trevor, apesar de sua desvantagem de altura, se pôs à minha frente e armou um chute para atingí-lo direto em seu rosto.

No entanto, Trevor sequer conseguiu concluir seu golpe, pois alguém subitamente caiu do teto sobre ele, e com sua altura consideravelmente menor, agarrou-lhe pelas costas com os braços e pernas em um mata-leão. Quando vi aquele cabelo rosado, não tive dúvidas. Antes que Trevor pudesse se livrar dela, ela foi rápida em gritar:

— Anulação total! — Circe declarou.

Dito isso, Trevor que até então ainda estava de pé, levou um forte soco daquela besta fera e subitamente caiu, enquanto Circe pulou de cima dele e agora permanecia de pé com a postura encurvada e a cabeça baixa, seus olhos opacos pareciam sem vida. Meu corpo estremeceu, minha mente confusa tentava raciocinar. Circe havia anulado sua força e resistência sobrehumana por tempo suficiente para que ele pudesse ser nocauteado. Eu arregalei os olhos em desespero e completa confusão, sem conseguir construir raciocínio sobre aquilo. Com as manoplas ainda feitas, eu gritei e saltei na direção da besta fera, no entanto, sem que eu conseguisse acertar um só golpe, ele desapareceu, parecendo se misturar à neblina.

— Esse é meu poder, criança do Hamartía. — Declarou. Eu arregalei os olhos, aquela era a voz grave e macia de Hassan. Nunca o tinha visto transformado. — Já experimentou lutar contra o que não pode ver ou tocar?

Me cerquei do meu fogo e corri, sem saber exatamente para onde, apenas fugindo da besta e tentando afastá-la de Trevor. No entanto, grunhi ao ser agarrada com força por trás, força suficiente que quase achei que quebraria meus ossos. Eu gritei de dor, me debatendo em tentar sair com dificuldade, sentindo mais dor a cada mínimo movimento.

— Eu estou à prova de fogo, e Circe conseguiu me ajudar a derrubar seu marido. Wickham é de fato o prodígio da família. — Ele emitiu um pequeno riso sem humor, sua voz parecia morta e desinteressada, e ainda me imobilizando, ele pôs um pano sobre meu rosto. — Não é nada pessoal, Brooke, mas seu pai vai amar te ver.

Grande Oleiro… me ajude…

É Brooke... Complicado.
O que esperar após esse ataque?

Herdeira de Sangue e Fogo [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora