Hoje pela manhã o céu estava bem nublado, a grama estava com aquele mesmo cheirinho de molhada e tinham até algumas flores roxas perto da cabana, acho que os mortos que estavam aqui foram embora. Sabe pai? Eu estou tão feliz, acho que aqui eu estou conseguindo ser eu mesmo. A aura pode até parecer maluca e realmente é, porém lá no fundo ela é uma simples menina com medo do passado. Ela me lembra um pouco a Estella, me recordo até hoje do dia que ela não passou na faculdade e o pai dela praticamente expulsou ela de casa. Pai você tinha que ver, a Estella ficou tão mal, ela se culpava por tudo e nem sequer queria comer. Esse período da vida dela ela passou lá em casa e eu arrumei para cabeça, além da mamãe a Estella também estava depressiva, foi um verdadeiro rebuliço.
Por volta das dez horas da manhã a aura levantou e já veio direto me dar um abraço quentinho. Ela ainda estava com aquela roupa de enfermeira e eu não aguentei, fiz um montão de piada e a aura não riu de nenhuma, pelo contrário, pegou o sapato do pé e lançou em mim. Não sei o que essas mulheres tem, uma hora estão rindo e outra hora querem te matar, vai entender. Depois dessa crise de estresse da aura nós fomos comer o último pacote de bolacha enquanto admiravamos as borboletas voando.
Pela tarde eu e a aura entramos na mata para buscar alguma coisa para comer, parecemos aquelas pessoas de reality show, estamos praticamente no meio do mato lutando para sobreviver. Eu me lembro de alguns arbustos e árvores que davam fruto e elas estavam exatamente do mesmo jeito, com um único diferencial, não tinha fruto. Eu e a aura então decidimos voltar para a cabana, porém no caminho eu encontrei um peixinho pulando no lago e eu tive a brilhante ideia de pescar. Eu então corri até a cabana e peguei as antigas varas de pesca que eu pescava com o meu pai e depois fui até o lago e passei o tempo tentando pescar algum peixinho com a aura. Era óbvio que não íamos pescar nada, até então minhas habilidades de pesca não são lá uma das melhores, mas quando estávamos quase desistindo a aura deu um grito e começou a puxar a vara, eu na hora segurei naquela vara de madeira junto com a aura e começamos a puxar juntos e saiu daquele lago quando menos esperamos um peixe bem grandão. Na hora do desespero eu puxei com força a vara e a corda acabou arrebentando e eu e a aura desabando naquele lago. Eu não consegui fazer outra coisa a não ser rir da aura toda molhada. Ela nem se quer abriu um sorriso, apenas ficou gritando:
-EU VOU TE MATAR TOOMAS. AQUI DEVE TER SAPO, TOOMAS.
Eu não consegui parar de rir, mas peguei ela no colo e levei até a beira e depois saí do lago. Nós estávamos totalmente molhados e com cheiro de água com lodo. A aura estava com o cabelo todo verde por causa do musgo e minha perna estava cheia de sanguessugas. Eu não sabia se eu dava risada ou se eu ajudava a aura. Eu então tirei os sanguessugas da perna e fui ajudar a aura a se secar e voltamos para a cabana dessa forma, completamente molhado, mas pelo menos conseguimos pescar aquele peixão.
Durante o caminho a aura ficou demonstrando sua revolta e não parava de me olhava com aqueles olhos de raiva, mas o que eu podia fazer? Eu então abracei ela e enchi a testa dela de beijo, mas confesso que o gosto da aura não estava bom, não viu, estava uma mistura de lodo com suor, nada tão bom de se sentir.
No fim da tarde ao chegar na cabana nós fomos assar aquele grande peixe e saboreamos cada pedaço e depois decidimos tirar aquela roupa molhada por conta do cheiro forte que ela estava exalando, porém quando a aura tirou a roupa de enfermeira eu não consegui ficar quieto com o que eu vi e perguntei:
-Aura?
A aura então se virou e disse:
-As marcas né?
Eu não sei explicar, pelo corpo da aura tinham várias cicatrizes e na cintura uma marca roxa como se fosse de correntes. A aura estava com a barriga toda roxa e as pernas completamente machucadas. Eu então me aproximei dela e toquei em cada ferida, e a aura ficou apenas observando enquanto guardava as lágrimas no olho. Ela então segurou na minha mão e falou:
-Toomas para, por favor.
Depois disso nós se sentamos na cama e a aura começou a chorar enquanto gaguejava para tentar falar comigo e eu não tive outra reação a não ser dizer:
-O que são essas marcas aura?
A aura então olhando para cima disse em alto tom:
-Essas marcas Toomas? ESSAS MARCAS SÃO AS MARCAS QUE AQUELE NOJENTO DO THALES DEIXOU EM MIM. AS MARCAS QUE O MARIDO PERFEITO QUE MEU PAI ARRUMOU PARA MIM DEIXOU NO MEU CORPO.
Depois disso a aura desabou em choro e eu como tentativa de acalmar ela coloquei a cabeça dela sobre meus ombros e a abracei. A aura então chorando me disse:
-Ele me acorrentava Toomas, ele me prendia em correntes quando eu não obedecia ele e me batia sem nenhuma dó. Além dos abusos psicológicos que ele fazia todo dia. Toomas ele mentia para todos mundo, chegou até a dizer para o meu pai que eu estava ficando doida, que ele me prendia na corrente para que eu não me matasse. Toomas ele mente e todos acreditam.
Eu então acariciando os cabelos dela falei:
-Desculpa aura, eu não deveria ter perguntado, me desculpa.
A aura então levantou do meu colo e disse:
-Não Toomas, eu preciso falar, eu preciso.
E passamos a tarde toda naquela cama enquanto a aura me contava cada detalhe do que aquele monstro fez com ela. A aura a cada detalhe que contava perdia o ar, aquele homem é um monstro,abusava dela e ainda por cima a traia com qualquer uma que aparecesse e para melhorar o pai dela é cego, ele não enxerga o mal que o Thales estava fazendo com a sua filha. A aura sem dúvidas estava muito mais presa que eu, era apenas uma garota desesperada, uma menina que precisava de um apoio, era apenas uma criança presa no corpo de um adulto ou talvez um adulto que estava preso no corpo de uma criança. Sabe aura? Eu te amo, eu te amo tanto.
Passamos a noite conversando enquanto os grilos e as cigarras faziam uma bela serenata. Pai do céu se me escutas, por favor, proteja essa menina, guie os nossos passos e não permita que mais nenhum abusador toque nela. Senhor? Eu te amo, mas me ensine a amar cada vez mais. E só mais uma coisa, se você permitir deixe que eu veja um dia a Aura em um altar, me permita tirar o véu do rosto dela e quem sabe até ter vários filhinhos. Pai? Eu entrego em sua mão as nossas vidas. Amém!
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Diário de um injustiçado
Mystery / ThrillerToomas Herivan é um garoto nascido na Espanha, sendo conhecido pelo assassinato dos seus dois melhores amigos. O homicídio duplo virou tema de diversas manchetes de jornal pela cidade de Pamplona,fazendo com que Toomas recebesse o apelido de "sicári...