24 de dezembro - Saco de balas

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Hoje pela manhã o dia amanheceu com um sol, não um sol qualquer, um belo sol. Sabe? A vida muitas das vezes se passa como uma bela névoa, uma névoa que chega, toca cada pedacinho da terra onde passa e depois se dissipa aos poucos. À quem não curta a névoa, xinga ou até mesmo julga ela, mas não podemos negar que mais fria e devastadora que seja, a névoa é simplesmente linda e tranquila. Sei que pode parecer contrariedade da minha parte por dizer que a névoa é devastadora e tranquila, porém eu me refiro às ações dela. Uma névoa pode tranquilizar uma criança que está chorando sem conseguir dormir ou pode acabar matando um motorista por falta de visão e assim é nossa vida, as vezes fazemos o bem e de vez enquanto praticarmos o mal.

Thomas? Não sei como explicar, mas talvez eu ter roubado, talvez eu ter roubado aquela bolsa tenha feito sentido, talvez eu precisasse ser preso para poder encontrar você, para encontrar a Raquel e reencontrar meu pequeno Adrus. Lembre-se de uma coisa: As vezes quando estiver triste, observe as borboletas, olhe como elas voam e enxergue nelas quem você ama. Pode parecer estranho mas na verdade isso que estou falando se resume nos meus pensamentos que estão um pouco bagunçados, eu só queria enxergar as borboletas novamente, eu só queria poder olhar para elas e lembrar o motivo, o motivo para eu voltar a abrir um sorriso.

Sabe diário? A algumas páginas atrás o Thomas se refere assim a você e pensei em fazer o mesmo. Respirar, respirar fundo, contar até três, seria essa a fórmula para tirar o peso do corpo né? Oxigenar o nosso sangue e aumentar a circulação sanguínea, é o essencial para nós, certo? Talvez sim, para falar a verdade com toda certeza. Já parou para pensar que quando estamos apaixonados nosso coração palpita mais que o normal? Ele manda sangue mais rapidamente para o nosso corpo e junto com o sangue o oxigênio que também aumenta por conta da respiração acelerada. É tão lindo Thomas tão lindo! Agora me responda diário? Por que? Qual seria o motivo do Thomas estar sempre na beira da morte? Falta o que para ele? Falta oxigênio? Ou será que falta sangue? Sabe diário, eu só queria poder descansar sem preocupações, sem o medo, o medo de perder o Thomas.

O meu primeiro dia na penitenciária foi um dos mais turbulentos. Sabe quando você grita, grita e grita na espera que alguém grite mais que você para que você entenda que existe algo ou alguém do seu lado? Foi assim que eu me senti com o Thomas, foi assim que eu me senti com aquele estranho de cabelo bagunçado. E é assim que eu me sinto com esse estranho de corpo desnutrido. Às vezes eu paro e penso: Pai? Foi você? Você que rezou para que eu encontrasse eles? Seria esse um pedido de desculpas? Se sim, saiba que eu te perdoo, saiba que assim como o senhor reza por mim daí de cima, assim eu rezarei por você daqui de baixo.

Agora são por volta das duas da tarde e já estão retirando as barracas de proteção, todos fomos vacinados e grande parte dos prisioneiros já estão se recuperando, então acaba que para evitar qualquer balbúrdia eles já estão desmontando as linhas de proteção o que leva a volta das visitas e das rotinas que já estamos acostumados.

Hoje comemos arroz com polenta e frango,estava bem gostoso, me lembrei do dia que eu roubei uma galinha para comer com o Adrus, o problema é que eu não sei preparar uma galinha então vendemos ela e compramos um saco cheio de doces, foi um dia espetacular e ainda por cima ganhamos brindes raros que vendemos para as crianças na porta da escola e adivinha? Fizemos mais dinheiro e compramos mais doces.

Ah diário, ser criança é tão bom, eu me recordo de todas as brincadeiras que eu brincava e de todas as cicatrizes que eu já formei por conta de quedas, brigas e objetos lançados por um foguetinho de brinquedo. A vida antes era tão fácil e não tínhamos vergonha, pelo menos não a vergonha que eu estou sentindo agora por conta de uma visita que segundo os carcereiros está me esperando. Como assim "me esperando"? Quem me esperaria?

Eu então me levantei,falei com o Vincent, coloquei minha máscara e saí acompanhado de um militar. Chegando naquela bela e iluminada sala de visita eu me deparo com a Raquel, a Raquel vestindo um belo vestido cheio de pequenas nuvens brancas. Como pode nossos encontros serem assim? Serem tão aleatórios e belos? Digamos que talvez eu seja um pouco exagerado, mas que ela é linda, ela com toda certeza é.

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