10 de outubro - Roupas novas

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O nervosismo até foi bom para que eu conseguisse dormir. Geralmente em casos de insônia os guardas nos entregam um comprimido branco que é milagroso,com ele nós dormimos em um pequeno instante de tempo.

O dia estava claro,e as nuvens estavam bem branquinhas. Os guardas chegaram novamente muito cedo e pediram que eu fosse me trocar para ir ao hospital. O vestiário do presídio é muito sujo,porém eu não podia reclamar,até então eu estava indo ver o meu único amigo ainda vivo, né? Confesso que não entendo o porquê de tanta alegria da minha parte,era uma alegria que vinha do coração. Tudo estava perfeito! Eu então me troquei e o guarda me guiou até a ambulância. Lá dentro havia três médicos e dois policiais,todos eles com um rosto sério e com as mãos inquietas. Demorou aproximadamente duas horas,e os guardas me levaram até um dos quartos do hospital,lá havia um senhorzinho e um menino com aproximadamente uns cinco anos de idade,ele tinha em sua mão um ursinho azul com uma pequena gravata vermelha.

Os médicos então entraram no quarto e me pediram para vestir a roupa de hospital. Não fiquei muito estiloso com aquele avental que não cobria nem as minhas pernas, fiquei parecendo um garoto de boate. O avental é bem laranjinha e por baixo dele nós usamos apenas uma cuequinha branca, não consegui me vestir sem rir daquele visual ridículo que sem dúvidas em algum momento poderia receber nota máxima em um desfile de moda. Eu nunca tinha vestido uma roupa tão desconfortável e vergonhosa,mas do que eu podia reclamar? Eu estava ali com um propósito, eu estava ali para dar uma nova chance para o estranho de olhos  azuis.

A hora passava tão depressa  e eu não saía daquele quarto,eu não podia esconder a minha impaciência e então perguntei ao garotinho:

- Olá,tudo bem? Como é o seu nome?

O menino não me respondeu e apenas se virou de costas,os médicos então entraram e junto a eles entrou um menino de mais ou menos treze anos de idade,ele estava muito magro e as suas roupas estavam bem desgastadas,mas os seus olhos não podiam esconder a preocupação dele pelo menininho que estava na maca. Os médicos então examinaram a criança e depois saíram do quarto. O menino mais velho sentou na maca que o mais novo estava,e começou a acariciar os cabelos castanhos do garotinho. Eles pareciam dois irmãozinhos, mas confesso que estranhei o fato de não ter nenhum adulto acompanhando eles. 

Pela tarde o sono começou a bater e eu acabei cochilando,com aquela linda imagem de dois irmãos unidos,pelo menos era o que eu esperava. Eu vivia pedindo um irmãozinho para os meus pais porém a resposta era sempre a mesma:

-Quando você estiver mais grandinho nós vamos trazer um irmãozinho para você, é que a sementinha que está dentro da barriga da mamãe ainda não está madura para ser plantada.

Os meus pais conseguiram me enganar usando a famosa técnica da sementinha, mas eu entendo eles, imagino o quão difícil deve ser criar um filho.

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