DEZEMBRO

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•• VOCÊ e o que não dizemos! ••
Quando os olhos falam, as palavras silenciam.
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Eu bem que poderia usar aquela frase de *Procurando Nemo* para descrever minha situação atual: 'Continue a nadar, continue a nadar.' Porque, de certo modo, é isso que estou fazendo - tentando seguir em frente, tentando respirar. Mas essa frase, por mais simples que pareça, diz muito sobre mim, sobre Donavan, e principalmente sobre a confusão que nos cerca. Estamos todos tentando nadar em um mar de emoções, de segredos, e de tudo aquilo que fica preso entre o que queremos e o que devemos.

Hoje é o aniversário de casamento do meu pai com Bárbara. E o que dizer sobre isso? Talvez eu devesse sentir felicidade por ele, por eles. Mas, honestamente, tudo parece tão fora de lugar. Eles estão felizes, eu sei, mas eu não consigo encaixar essa felicidade no que sinto. Não consigo apagar a sensação de que, de alguma forma, esse casamento apenas amplifica a confusão em que vivo. Meu pai encontrou alguém para recomeçar, para seguir em frente, mas onde isso me deixa? E onde isso deixa Donavan, que parece tão distante e ao mesmo tempo tão próximo?

Tudo o que consigo pensar é que, assim como o Nemo, estou nadando em círculos, tentando achar meu lugar nesse oceano de incertezas.

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A VIDA APÓS O CASAMENTO seguiu de forma tranquila. Uma rotina comum, como de qualquer outra família. Conviver com Donavan era fácil; ele tem uma calma que me deixava à vontade, sem nada que me incomodasse, quer dizer - quando ele não estava secretamente me vigiando nas festas. Quem me desafiava diariamente era sua mãe, Bárbara. Era difícil me acostumar com a ideia de tê-la como madrasta, mas por amor ao meu pai, e especialmente por Donavan, eu sempre mantinha a cordialidade, apesar das minhas expressões faciais demonstrarem o contrário.

Durante meses, me esforcei para ser uma "boa menina", mesmo que às vezes fosse difícil não perder a paciência. Não que Bárbara fosse má; ao contrário, ela fazia meu pai feliz, e isso já deveria bastar para que eu me sentisse grata. Mas havia algo em mim que ainda resistia em gostar dela. Talvez pareça imaturo, mas sentir afeto por Bárbara era como trair a memória da minha mãe. Pior ainda, era como se, ao gostar de Bárbara, eu estivesse de alguma forma esquecendo minha mãe.
Por isso, mantenho uma distância segura.

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- Precisa de ajuda? - caminhou a passos largos em minha direção.

Era sexta-feira e eu estava na garagem sobre a escada pegando uma caixa na última prateleira, o sol já estava se pondo quando Donavan chegou da rua, com a sua motocicleta.

- Eu consigo, pode deixar. - respondi fazendo força puxando a caixa pesada.

Donavan passou por mim com aquele olhar intenso, como se algo o detivesse, hesitando à beira da porta da cozinha. Naquele breve instante, enquanto ele hesitava, meus pés vacilaram na escada, e antes que pudesse reagir, senti seu corpo firme amparando minha queda. Ele se colocou à minha frente, como um escudo, enquanto o chão recebia as latas de tinta que se abriram em uma explosão de cores, fazendo um barulho estrondoso.
A tinta verde espalhou-se por todo lado, cobrindo-nos completamente, e o caos se transformou em algo inesperado, uma nova combinação de verde foi criada acidentalmente.
O verde tentação!
Meu corpo estava colado ao dele, e pude sentir o ritmo irregular de seus batimentos, ecoando os meus.

Nossos lábios se tocaram de leve, quase como se fosse um acidente do destino. Donavan permaneceu imóvel, suas palavras presas na garganta, enquanto eu murmurava um pedido de desculpas. Mas seus olhos, ah, seus olhos, traíram-no no momento em que me afastei e a tinta verde molhou minha camiseta, revelando mais do que eu pretendia. A exclamada "Puxa vida!" escapou de seus lábios, e soube que algo mudara.
Minha camiseta branca curta, agora molhada, deixava evidente que eu estava sem sutiã, e pela primeira vez, Donavan viu além da amizade que sempre nos envolveu. Ele viu uma mulher diante de si, uma mulher que despertava seu desejo. E, para minha surpresa, eu gostei da forma como seus olhos me desejaram.
Ele se levantou rapidamente, desviando o olhar, tentando esconder o que não poderia mais ser ignorado. Mas a tensão entre nós já estava ali, suspensa no ar, na mistura da tinta e dos sentimentos que até então haviam sido mantidos sob controle.

EU, VOCÊ e o que não dizemos!Onde histórias criam vida. Descubra agora