Capítulo 08: Acusado

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Rafael continuava encarando Melissa com intensidade. Ele estava imóvel, como se o tempo ao redor deles tivesse parado por completo. Sua mente se perdia em pensamentos confusos. Melissa, como de costume, mantinha a postura serena, elegante, sem demonstrar qualquer perturbação. Vestia um de seus vestidos pretos habituais, aqueles que pareciam ter sido feitos sob medida para ela, como se fossem parte integrante de sua própria essência.

Os olhos de Melissa tinham uma presença própria. Não eram apenas parte de seu rosto, mas algo que comunicava muito mais do que palavras poderiam dizer. Havia algo neles que Rafael não conseguia decifrar. Talvez fosse a profundidade do olhar, o brilho sutil que refletia uma mistura de sensações que ele não conseguia categorizar. Ou talvez fosse aquele sorrisinho que, de maneira quase permanente, repousava em seus lábios. Era um sorriso pequeno, mas carregado de significado, um sorriso que sempre deixava Rafael em dúvida sobre o que se passava pela mente dela.

Ela o encarava de volta, como se estivesse completamente ciente do efeito que causava. E, naquele breve instante, ela deu uma piscada. Não foi um gesto deliberado, ou pelo menos, parecia não ser. Foi algo sutil, talvez até inconsciente, mas que teve um impacto imenso. Aquele pequeno gesto fez com que seu coração disparasse por um momento, enquanto sua mente tentava interpretar o que aquilo significava.

A relação entre Rafael e Melissa sempre foi envolta em um mistério denso, como se cada um carregasse dentro de si segredos que não poderiam ser compartilhados. Por mais que os dois trocassem olhares ou gestos como aquele, parecia sempre haver um abismo intransponível entre eles, uma barreira invisível que os mantinha distantes, ainda que fisicamente próximos.

Por fim, Melissa desviou o olhar, com a mesma calma com que piscara anteriormente. Seu sorriso ainda estava lá, mas agora parecia um pouco mais distante, mais etéreo. Ela ajustou um dos colares em seu pescoço, como se o gesto fosse algo trivial, mas que, para Rafael, parecia quase teatral.

— Acho que você cometeu um crime em nosso território, colega — disse uma voz firme, carregada de autoridade, cortando o silêncio do ambiente. Rafael, ainda envolto em seus próprios pensamentos, foi obrigado a retornar sua atenção para a situação presente. O comentário não foi feito com agressividade, mas com uma calma inquietante, como se quem falava estivesse completamente no controle do momento, aguardando com paciência o desenrolar dos acontecimentos.

Rafael levantou os olhos e encarou o homem que havia falado. Ele parecia ser o líder daquele esquadrão, um grupo que, momentos antes, cercara Rafael de forma eficiente e silenciosa. O líder era um sujeito de aparência imponente, seus traços duros e a postura ereta indicavam anos de experiência e liderança. Seu olhar era frio, avaliativo, como se estivesse pesando cada movimento, cada reação de Rafael. Havia uma certa impaciência contida em seus olhos, embora o tom de sua voz fosse calmo e controlado.

Rafael observou seus dedos cobertos de poeira enquanto o que restava de Jamón escorria por entre eles, caindo lentamente ao chão. O corpo desintegrado de Jamón agora era apenas um monte de pó que, até poucos instantes atrás, havia sido uma figura poderosa e imponente.

Com um olhar impassível, Rafael limpou as mãos, batendo uma contra a outra para se livrar dos últimos resquícios do que antes era Jamón. Ele ergueu os olhos, encarando o esquadrão que se formava ao seu redor. Seus rostos estavam rígidos, expressões congeladas.

— Território? — ele repetiu, com um toque de desdém na voz. — Esse território é nosso!

O homem à frente de Rafael esboçou um sorrisinho, um daqueles que carregava um misto de ironia e condescendência. Era o tipo de sorriso que alguém dava quando sabia estar em uma posição superior, quando a resposta certa estava diante de seus olhos, mas a outra pessoa simplesmente não conseguia enxergá-la. Ele balançou a cabeça lentamente, com um movimento que lembrava um professor experiente ouvindo pacientemente a resposta errada de um aluno do ensino fundamental.

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