Capítulo 02: Uma Nova Amiga?

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Após uma hora intensa com Melissa, a vampira simplesmente se foi, como uma sombra que se dissolvia na luz do amanhecer. Rafael, perdido em seus próprios pensamentos, sentia o peso da indecisão pairando sobre ele. Ele precisava encontrar Sofia e Victor para avisá-los da iminente invasão da Camarilla, mas a memória da noite com Melissa ainda o consumia, como uma chama que não se apagava. Ao mesmo tempo, a imagem da garota que saíra cambaleando da casa noturna não saía de sua mente. Ele já a havia escolhido como seu alimento, e a fome que o guiava era tão avassaladora quanto um desejo incontrolável.

Depois de um bom tempo de busca, ele finalmente a rastreou até o Boa Esperança. As luzes das casas, com suas cortinas fechadas, iluminavam as ruas tranquilas, criando um contraste vívido com a agitação que havia deixado para trás. À medida que se aproximava da casa dela, um misto de ansiedade e necessidade crescia dentro dele. A ânsia pulsava como um tambor em seu peito, e o ar parecia denso, carregado de expectativa.

Ele entrou na casa da presa com o cuidado de um gato à espreita, seu corpo movendo-se de forma silenciosa e ágil, como um predador à espreita. Ao encontrá-la deitada em sua cama, uma sensação estranha o envolveu. A jovem parecia completamente indefesa, com seus cabelos loiros soltos caindo em cascata sobre o travesseiro. O instinto o puxava para ela; a necessidade de se alimentar era implacável, como uma tempestade prestes a estourar. Rafael nunca se acostumou com a ideia de sugar o sangue de pessoas, mas sabia que era necessário para a sua sobrevivência. Era um ciclo de vida que ele lutava para entender, mas que, no fundo, sempre aceitou.

Quando ele se inclinou sobre ela, a suavidade de sua pele e o calor que emanava o atraíram de maneira quase hipnótica. Ao morder seu pescoço, uma onda de prazer percorreu o corpo da jovem de vinte e poucos anos. Ela acordou com um gemido involuntário, seus olhos se arregalando ao encontrar o olhar penetrante de Rafael. No instante seguinte, ela se afastou com um misto de surpresa e confusão em seu rosto.

— Você! O que você está fazendo?— Ela exclamou, a incredulidade evidente em sua voz, ecoando nas paredes do quarto como um grito em meio ao silêncio da noite.

Mas antes que ele pudesse responder, algo curioso acontece.

— Faz de novo!— ela pede, com um tom leve e cômico misturado a confusão, como se estivesse brincando. Rafael ficou paralisado por um momento, confuso com a situação. Nunca antes alguém reagira dessa forma a um ato tão primitivo e íntimo.

— Como assim, de novo? — ele questionou, sua mente em conflito entre o instinto predatório e a estranheza do momento.

Ela riu, um som que preenchia o quarto de forma inesperada.

— Sério! Isso deve ser muito legal. Você é um vampiro, não? Eu sempre pensei que vampiros eram só lendas. Agora eu tenho um aqui na minha cama!

Rafael não conseguia acreditar na falta de medo dela. O que deveria ser um momento de terror se transformou em uma conversa despreocupada.

— É, eu sou um vampiro — ele diz, tentando manter uma fachada séria.

— Isso é incrível! - Ela se sentou na cama, olhos brilhando de curiosidade.— E você tem alguma super habilidade? Pode voar? Transformar-se em morcego? Ou é só a mordida mesmo?

— Na verdade, eu posso fazer algumas coisas... Mas, não, não consigo voar nem me transformar em morcego — ele disse, tentando ser sério, mas não conseguindo conter um sorriso, começando a relaxar na presença dela.

— Ah, que pena! Isso seria tão legal! — Ela se acomodou na cama, parecendo genuinamente interessada. — Você tem que me contar mais sobre como é ser um vampiro. Quero saber tudo!

E, conforme as palavras dela foram fluindo, Rafael começava a se soltar. Compartilhando um pouco de sua história, da solidão que o acompanhava e de como a vida noturna o isolava do mundo. Para sua surpresa, a presença dela não o assustava, mas o confortava. Era um alívio inexplicável, um calor familiar em meio ao frio de sua existência.

— Você sabe — Jennifer disse, com um sorriso aberto — eu sempre achei que os vampiros eram só uma invenção da ficção. Você é real. — Sua voz era suave, como se estivesse contando um segredo.

Pela primeira vez em meses, Rafael sentiu um sopro de humanidade em seu coração morto. A conexão entre eles foi inesperada e revigorante. Ele percebeu que não estava apenas se alimentando, mas também se permitindo sentir algo que não sentia há muito tempo. Uma emoção pura e crua.

Mas enquanto eles trocavam palavras, Rafael lembrou-se que precisava se afastar. Ele acabou de quebrar a Máscara. Ele não podia permitir que essa conexão crescesse. Seria perigoso para ambos. Ele se levantou, hesitante, e se preparou para ir embora.

— Ei, você vai voltar? — ela perguntou, um pouco hesitante, mas ainda cheia de interesse. — Só para me sugar, quero dizer!

A pergunta o pegou de surpresa. Rafael riu nervosamente.

— Talvez — ele respondeu sem pensar direito, sem saber ao certo como se sentia. Era uma ideia tentadora, mas também alarmante.

— Qual é seu nome, vampiro? — Jennifer perguntou, inclinando-se para mais perto, um sorriso travesso nos lábios.

— Rafael — ele disse, sentindo um misto de segurança e vulnerabilidade.

— Prazer, Rafael. Eu sou a Jennifer — ela se apresentou, o olhar fixo nele com um brilho de expectativa.

Com um último olhar para ela, Rafael se afastou. O desejo de ficar era forte, mas era mais seguro pular pela janela e desaparecer na noite. Ele precisava de tempo para processar tudo isso, para entender o que significava encontrar alguém que não o viu apenas como um predador, mas como um ser humano, mesmo que apenas por um momento.

Enquanto desaparecia na escuridão, um pensamento o acompanhava, um eco persistente em sua mente: "você deve voltar!" Era a Besta falando...

Rafael chegou ao seu domínio antes do amanhecer, o corpo já pesado e os sentidos começando a enfraquecer com a iminência do sol. Ele adentrou uma fábrica abandonada em Santa Cruz, um lugar esquecido pelo tempo, mas perfeito para se esconder da luz solar. As janelas cobertas por tábuas e ferrugem garantiam que nenhum raio de sol o tocaria. O ambiente sujo e decadente não incomodava; para ele, era um santuário.

Rafael precisava descansar. Depois de um curto banho e troca de roupa, ele deitou em um colchão velho, o corpo afundando na espuma gasta. Enquanto fechava os olhos, o peso das horas anteriores finalmente caíam sobre ele, e seus músculos já mortos relaxam. O silêncio ao redor era absoluto, a escuridão total. Apenas os ecos distantes de carros passando pela cidade e os barulhos abafados do mundo exterior chegavam de forma indistinta.

Conforme o "sono" finalmente começava a tomar conta de seu corpo exausto, Rafael pegou o leve golpe da chuva do lado de fora da fábrica. As gotas atingiam as estruturas metálicas com um som suave, quase hipnotizante. Ele se deixou levar por aquele som, seus sentidos gradualmente se apagaram, e, por um breve momento, ele sentiu uma paz que há muito lhe era negada.

Finalmente, Rafael adormeceu profundamente. O dia passaria lentamente acima dele, enquanto a luz do sol se derramaria pela cidade, alheia à existência deste ser que se escondia nas sombras. E, quando a noite retornasse, Rafael estaria pronto mais uma vez para a vida noturna.

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