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Luke

O sofá de Rose é o mais confortável em que alguma vez me sentei. Acho que se encostasse a cabeça neste, adormecia. Só agora me dou conta do quão cansado estou; não tenho dormido muito e ando sempre de um lado para o outro – seja de carro ou a pé.

Beberico o chá que a avó da Alison me deu há momentos e espero que ela volte da cozinha. Consigo ouvir barulhos de gavetas a abrir e a fechar e de talheres a bater uns nos outros. O líquido desce pela minha garganta aquecendo o meu corpo; apesar de a casa ter aquecedores por todo o lado, o frio parece entranhar-se nas paredes. Fecho as minhas mãos em torno da caneca - que tem um Pai Natal desenhado - e aprecio o calor que esta transmite.

Ouço um estrondo vindo da cozinha e rapidamente pouso a bebida na mesa de centro e apresso-me a chegar junto de Rose.

"Está tudo bem?!" – pergunto, quando vejo a avó da Alison de joelhos no chão, de costas para mim.

"Sim, sim querido! Não te preocupes, foi só o tabuleiro das bolachas que caiu." – ela diz, virando-se para trás.

"As bolachas partiram-se?" – não acredito que perguntei isto. – "Hum... quer dizer, o tabuleiro partiu-se? Magoou-se?" – sou tão ridículo que até me apetece rir da minha estupidez.

Rose levanta-se e solta uma gargalhada. Olho para o chão e vejo que este está cheio de migalhas do que antes eram bolachas. Oh, vá lá! Elas cheiravam mesmo bem!, penso.

"Está tudo bem, Luke. Mas agora vamos ter que comer bolachas do pacote. Vai para a sala que já as levo." – ela diz e eu assinto com a cabeça (aborrecido, porque aqueles biscoitos de chocolate estavam mesmo com óptimo aspeto) e volto para a sala.

O sofá escarlate acolhe-me de novo e eu fico a pensar na sorte que me calhou. Achei que ia ser muito mais difícil encontrar a Alison. Ok, não a encontrei a ela, mas encontrei a avó... É um começo.

Depois de explicar a Rose quem eu era e de ter comido o meu cupcake – a que ela se ofereceu para pagar apesar de eu negar –, esta convidou-me a ir a sua casa para falarmos mais pormenorizadamente sobre Alison. Apenas disse que a neta não se encontrava na cidade, mas que voltaria em breve. Rose acrescentou que é curioso o motivo de ela cá não estar. Não sei porquê, mas vou descobrir daqui a pouco. Fiquei desiludido por não a poder ver já, mas vão haver oportunidades; nem que reserve o meu quarto de hotel por mais uma semana.

Desvio o meu olhar para a porta da cozinha e vejo a avó da Alison andar até junto de mim e sentar-se a meu lado com o tabuleiro nas mãos. Estas bolachas não parecem tão boas, mas servem perfeitamente. Ela coloca-o em cima da mesa de centro e eu arrasto a minha caneca de chá um pouco para o lado, dando-lhe assim mais espaço.

Pego numa bolacha e mergulho-a no chá (que penso ser de camomila), trincando-a depois. O contraste de sabores faz uma óptima combinação na minha boca. Mergulho outra bolacha na bebida e como-a de uma só vez de seguida. Estou a tentar queimar tempo, porque não sei como hei-de começar a conversa. Vejo pelo canto do olho Rose remexer-se no sofá, e percebo pela postura que vai começar a falar. Agradeço-lhe mentalmente por isso.

"Então, andas à procura da minha neta...?" – ela meio que pergunta e eu sinto-me constrangido no meio disto tudo. É como quando conheci o pai da minha primeira namorada. Ele fazia-me sentir exatamente desta maneira; como num interrogatório (não que as situações fossem semelhantes).

"S...Sim. Eu já lhe expliquei a história toda. Já sabe de onde nos conhecemos e essas coisas mais relevantes. Eu só queria reencontrá-la e falar com ela, apenas isso. Tinha ido à antiga casa dela, mas está abandonada."

"Sim, pois está. Como sabias a morada?" – Rose questiona com o sobrolho franzido. Como eu disse: interrogatório.

"A minha mãe tinha-a." – respondo simplesmente e a mulher respira fundo.

"Não fazes ideia de onde a Alison está, pois não?"

"Não, não mesmo. Quer dizer, pensei que estivesse em Queens com os pais, mas afinal..."

"Luke, os pais da Alison já morreram." – Rose conta e eu arregalo os olhos em surpresa. Morreram? Como é que os meus pais não sabem disso? – "Morreram naquele verão em que era suposto irem visitar-te." – está explicado. – "Não contactei a tua família porque no acidente perdeu-se tudo. A casa onde moravam nunca mais foi habitada e eu também só lá fui uma vez depois do sucedido." – percebo que está afetada com o assunto, mas não dá a entender isso. De repente entendo: morreram, a casa onde moravam ficou desabitada, Alison não está cá, voltaria em breve ...mas podia não ser o breve que eu esperava.

"Espere... A Alison morreu?!" – dou por mim com as mãos a tremer e, muito rapidamente, Rose tira-me a caneca das mãos. A memória da minha brincadeira com a Alison nos ramos passa-me pela cabeça e sinto um vazio por dentro como quando descobri que aquela casa estava abandonada. Controlo as lágrimas que se formavam nos cantos dos meus olhos e impeço-as de cair. Finalmente – e, felizmente – a mulher de cabelos castanhos responde:

"Não! Credo, não, não!" – inclina-se e bate três vezes na madeira da mesa de centro. Sinto o meu corpo relaxar e respiro fundo duas vezes, dando depois alguns goles no chá.

"Assustou-me." – murmuro.

"Desculpa, não era minha intenção, Luke. Mas a Alison está bem. Ela ficou em coma alguns meses depois do acidente, mas, felizmente, despertou e não ficou com sequelas. Ela mudou-se para casa dos tios, aqui em Brooklyn." – aqueles dois adultos da fotografia deviam de ser eles.

"Então, onde está ela agora?" – pergunto e Rose solta uma risada que me deixa confuso. Ainda agora estávamos a falar de assuntos sérios e agora ela ri-se.

"Está num sítio que bem conheces, Luke." – diz e eu arqueio uma sobrancelha. – "Ela está em Sydney."

"Em Sydney?! Mas ainda há uma semana atrás eu estava lá!"

"Eu sei. E ela ainda há uma semana atrás estava aqui." – até me apetece rir com a situação. Existe coisa mais bizarra? – "Ela foi procurar-te Luke."

"Procurar-me? A mim?" – questiono com a voz a sair-me mais aguda do que o costume. Rose assente com a cabeça. – "Ela... Ela lembra-se de mim?"

"Oh Luke, claro que se lembra! Ela encontrou uma foto onde tu estavas e..."

"Espere, espere. A foto..." – procuro nos bolsos pela primeira fotografia que encontrei. Encontro-a e mostro-a à avó da Alison. – "Encaixava nesta? Na outra metade estava eu?"

"Sim, exatamente."

"Posso... posso ligar-lhe?" pergunto, um pouco relutante.

"Claro, eu vou buscar o meu telemóvel." – levanta-se do sofá e sobe as escadas, provavelmente para ir ao quarto.

Começo a roer as unhas de nervosismo. Vou falar com ela. Vou realmente falar com a Alison.

Ouço passos e percebo que Rose está de volta.

"Aqui está." – ela estende-me o telemóvel e o número de Alison já se encontra no ecrã.

Carrego no botão verde e espero.

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photograph » luke hemmingsOnde histórias criam vida. Descubra agora