Prólogo

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Eu vou pro inferno.

Mas não pense que isso me preocupa muito, porque não. Não mais. Se tivesse algum dia me preocupado com a fúria e o castigo de Deus, eu teria ao menos tentado parar de fazer o que fazia. Coisa que nunca tentei. Sempre segui cometendo os terríveis pecados na minha louca juventude.

Tenho certeza que se perguntasse ao padre Martin, ele me enrolaria, diria um monte de baboseiras, e por fim me enganaria e não diria palavra por palavra que vou para o inferno. O padre Martin sempre tentou me tirar da estrada para a perdição, mesmo quando já não havia mais volta. Mesmo quando ele sabia que eu iria queimar por toda a eternidade no fogo do inferno. Ele era um bom homem. Sempre pareceu gostar de mim, desde que eu era apenas um garoto. Todavia, não tenho mais a oportunidade de ouvir suas boas mentiras ou de me divertir um pouco com o modo honesto com que ele tentava me ludibriar e dizer que Deus tinha um plano para mim. Padre Martin achava me enganar porque para ele eu não passava primeiro de um moleque burro, e depois de um homem terrivelmente complicado, mas ainda assim burro.

Acho que o que mais me incomoda em tudo isso, eu digo, em toda a minha história, não é tanto as maldades e atrocidades que cometi, mas sim o mal que minhas ações desprezíveis e egoístas causaram nas pessoas que mais amei na vida. Pensar nisso me corrói o peito ao ponto de eu soltar um gemido de dor. Juro; chega a ser uma dor física pensar em todas as desgraças que aconteceram. Contudo, não consigo pensar em outra vida para mim. Gostei dela. Pelo menos de parte de minha existência. Penso hoje que o que aconteceu, aconteceu. Tento ficar em paz... nem sempre consigo.

Devo admitir que meus melhores anos foram aqueles em cometi mais pecados, aqueles em que carimbei minha passagem apenas de ida para o inferno. Gostaria de saber o que o padre Martin acharia dessa admissão. De verdade, gostaria de olhar para ele e ver o que diria.

Como já falei antes, não posso perguntar mais nada para ele; porque o padre Martin agora está morto. Está na companhia de seu Jesus. A cabeça do padre Martin explodiu. Bem, não chegou a explodir, esse é apenas o modo como eu às vezes digo quando alguém leva um tiro na cabeça.

O que mais me incomoda na morte do padre é que ele levou o tiro por minha causa. Eu gostava dele. Aquele dia foi terrível. Lembro-me do olhar em seu rosto. Lembro-me das lágrimas em suas bochechas; lembro-me da iluminação amarelada daquela noite, e lembro-me do som do tiro e depois do som do corpo mole do padre caindo no chão de terra. Em seguida as mulheres berraram em desespero, e eu tive que sufocar o meu próprio grito de horror. O desgraçado tinha matado o padre Martin! O meu padre Martin.

Contudo, estou me adiantando na história. A morte do padre foi depois de muito tempo. Para sabermos como o padre morreu, temos que saber o porquê eles o usaram contra mim. E para saber isso, temos primeiro que saber como entrei nessa vida de crimes e tantos pecados. Tenho que contar como me vi no caminho irreversível para o inferno. E acho que tudo deve ter começado quando vi meu pai matando um homem. Foi há tanto tempo. Tanto tempo que até me dá vontade de chorar ao lembrar daqueles dias, daquele dia em específico; do sol, do som do riacho e da risada de Jenny, minha querida Jenny. Como sinto falta de tudo isso.

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