Quarta Parte (II)

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No dia dezenove de julho costumava-se comemorar meu aniversário, porém naquele ano de 1849 foi diferente, uma vez que ninguém se lembrou da importância da data. Concordo que ainda estava terrivelmente próximo da data de morte de meu pai, e ainda estávamos de luto em casa. Entretanto, senti-me triste por ninguém lembrar-se de nada. Foi como qualquer outro dia desde que meu pai perecera. Acordávamos; Matilda e Suzanne iam até a loja, como faziam sempre. Não estava sendo uma grande novidade para elas tocar o negócio, porque quando meu pai viajava para matar alguém, eram elas mesmas quem tomavam conta da nossa porcaria de loja. Eu e minha mãe ficávamos em casa o dia todo. Ela cuidando dos afazeres do lar, e eu cuidando do estábulo e dos animais.

Agora que meu pai estava morto, eu começava a sentir-me incomodado com minha indolência. Tinha ânsia de fazer algo para ajudar em casa. As meninas faziam, e eu não era mais uma criança. Passei a pensar seriamente em ir trabalhar com elas.

O clima em casa estava péssimo. Ninguém falava muito com ninguém, eu e Matilda não brigávamos, e foi um período de paz lúgubre e silencio introspectivo. No fundo esperava que meu aniversário melhorasse as coisas, e quando o dia chegou, foi como qualquer outro. Nenhuma delas me parabenizou. Nenhuma delas se lembrou.

Fiquei chateado, e quando o fim da tarde se aproximou, decidi ir até a espelunca G, tomar a porra de uma cerveja ou um uísque. Achava que merecia. Sendo assim, saí de casa e disse a minha mãe que estava indo ver Jenny.

Tanto ela quanto padre Martin me faziam visitas, mas invés de ficar melhor com suas presenças, eu acabava mais deprimido, pois sabia que estavam ali para ver como estava passando por aquele luto, e com isso me lembravam que estava de luto. Era uma coisa confusa e ruim, e por mais que gostasse de vê-los, eles faziam me lembrar de minha perda.

Portanto ali estava eu, no dia em que completava dezesseis anos, indo beber uísque, deprimido e com um peso negro no coração.

Alguns dos transeuntes olhavam-me curiosos. Eu era o menino que tinha visto o outro menino ser atropelado por um trem; e o filho do homem que morreu ao quebrar o pescoço. Era algo muito bom para ser olhado. Me sentia como alguma atração de um circo qualquer. Ignorei todos os olhares e segui até o saloon.

Logo que entrei senti aquele cheiro de suor e bebida; ouvi as risadas e as vozes rudes, e me senti bem. Uma pequena onda de tranquilidade atingiu-me, se senti vontade de sorrir.

- Eldred! – alguém gritou antes mesmo que eu desse o terceiro passo lá dentro. Era Harold.

O Saloon G estava sob os efeitos dos raios alaranjados do sol, que penetravam o recinto através das janelas na parede oeste.

Aproximei-me de Harold, que indicou o banco de madeira ao seu lado esquerdo. Sentei-me. Estávamos no balcão, e logo me apoiei no grande móvel sujo de eternas manchas de copo.

- Uísque? – Harold indagou.

- Sim, senhor.

Ele parecia estar sozinho nesse dia, mas havia outros bêbados naquele balcão e ainda mais nas mesas. Vi duas das putas me olhando do fundo do salão e cochichando.

- Por conta da casa – disse Steve assim que me serviu o copo de uísque.

- Obrigado – agradeci e bebi um grande gole.

Minha garganta aqueceu-se, e tive uma leve vontade de tossir, mas segurei.

- Como você está, garoto? – Harold quis saber.

- Estou bem, você sabe como é – tentei fazer-me de desinteressado, porém senti um nó querendo se formar em minha garganta. Bebi mais um gole para desfazê-lo.

Um Caminho Para o InfernoOnde histórias criam vida. Descubra agora