Um Caminho Para o Inferno

Sexta Parte (IX)

Menos de uma semana depois eu estava em Tortuga.

Ninguém desconfiou que Abigail foi assassinada. A carta, aparentemente, desvendou o mistério. E mesmo que não desvendasse, nada nunca seria ligado a mim.

Fiquei pensando na morte dela na viagem de dois dias até Tortuga. Não que eu estivesse atormentado com isso, mas confesso que a lembrança dela sorrindo com a mala na mão ainda me partia o coração. Depois comecei a pensar que nunca mais a comeria, que nunca mais veria ou pesaria aqueles seios em minhas mãos, e isso me deixou um pouco infeliz. Quando estava chegando a Tortuga, resolvi esquecer tudo isso. Tinha ido fazer algo muito importante. Estava cortando as pontas soltas na minha vida.

Não avisei ninguém onde estava indo. Disse apenas que estava indo trabalhar, e para Eustace falei que tinha algo a resolver. Ele não se importou, uma vez que não tinha nenhum plano para os próximos dias.

Passei a noite toda no saloon onde tinha conversado com Boca alguns dias antes. Bebi duas doses de uísque e nada mais. Não queria estar bêbado quando encontrasse aquele desgraçado do meu tio.

O saloon estava cheio e apostava que a metade eram forasteiros, de forma que esperava passar despercebido.

Enquanto estava encostado no balcão, fumando um cigarro e bebendo lentamente, não sabia o que esperar do encontro. Sabia apenas que dessa vez seria diferente. Dessa vez o filho da puta pagaria.

Com alguma ansiedade esperei o movimento do saloon diminuir, e saí. A cidade já dormia, era quase meia noite. Sabia que aquele ladrão gordo estaria roncando em sua cama.

Ainda estava frio e chovia fraco, por isso vestia um grande casaco por cima de um colete. Trazia meu chapéu na cabeça e minha arma no coldre.

Toquei Lúcifer através das ruas lamacentas e estreitas de Tortuga até que cheguei na casa afastada de meu tio Herbert; aquela casa que lembrava tanto a minha própria. Apeei e amarrei meu cavalo na mesma cerca que eu e Matilda amarramos Zig e Hans há sete anos.

Reparei com desgosto que meu tio havia prosperado, já que a trilha que ligava Tortuga até sua casa estava mais larga e mais bem cuidada. Vi também um pequeno estábulo construído atrás da casa.

O céu estava repleto de nuvens cheias e escuras. Achava que choveria ainda mais nas próximas horas.

Quando cheguei ao alpendre ainda não sabia o que ia fazer, e isso deixou-me apreensivo. Pensei em Matilda, e recordei daquele seu sorriso repugnante. Eu tinha que entrar ali e resolver aquela história. Dei uma última olhada em volta para ver se não havia ninguém por ali. A única construção mais próxima do que a cidade em si era uma casa do outro lado da trilha, há uns trezentos metros. Aquela moradia podia me trazer problemas.

Não ouvia nada além da chuva ou de um guinchar de porcos em algum canto. Achei bom o bastante para que eu entrasse.

Tentei a porta da frente. Trancada.

- Então você é um filho da puta precavido - sussurrei para a noite.

Tirei minha arma do coldre e dei a volta na casa. As janelas estavam fechadas com cortinas, impedindo que eu visse qualquer coisa lá dentro. Cheguei até o quintal e vi o pequeno estábulo. Antes de invadir a casa fui até a nova construção, arriei a calça e mijei na porta dupla. Sacudi e guardei o pinto e fui sorrindo até a porta dos fundos. Eu já estava todo molhado e um pouco irritado. A prosperidade dele me enfureceu. Subi no alpendre dos fundos da casa de tio Herbert e me vi livre da chuva. Havia duas janelas viradas para mim. Essas duas estavam com as cortinas abertas. Através de uma via a cozinha organizada da tia Gertrude, e pela outra vi uma cama com um boi gordo dormindo ao lado de uma mulher. Era o quarto do safado. Sentindo a excitação já familiar correndo pelo meu sangue, tentei a porta dos fundos. Estava aberta! E se estivesse fechada, o que eu faria? Bom, certamente a arrombaria.