Segunda Parte (V)

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Bob já parecia triste antes mesmo de eu lhe contar que Jenny gostava de mim. Isso aconteceu uns três dias depois do incidente no jantar. Nesses dias vi meus dois amigos, e fugi de Harold. Não queria problemas, por mais que gostasse dele. Também vi Jenny nesses dois dias, contudo, agora ela estava uma vez mais ajudando a avó com uma tarefa qualquer.

Portanto estávamos apenas eu e Bob. Encontrávamo-nos em cima de uma árvore grande e bem recheada de folhas. Já disse antes que não sei o nome dessas coisas. Poderia ser um carvalho, uma seringueira, ou até uma mangueira bem recheada.

Uma vez mais não fazíamos nada de especial. Apenas comíamos um pedaço de bolo que a mãe de Bob nos dera. Estávamos sentados no mesmo galho grosso da árvore, em meio a folhas verdes. Aquilo era um pouco afastado pelo lado norte da cidade, ficava ao lado de uma trilha de terra, usada por vaqueiros e por moleques vagabundos como nós.

- Agradeça sua mãe de novo por mim – disse eu a Bob.

- Pode deixar.

Ele usava uma calça curta marrom, um sapato velho, que devia ser de seu irmão, uma camisa dobrada até o cotovelo e um colete também marrom, já um tanto puído. Eu estava parecido, mas não usava um colete. Estava quente demais.

- Seu pai está viajando? – ele inquiriu assim que enfiou o último pedaço de bolo na boca.

- Não. Deve estar na loja.

- Junto com Matilda – Bob riu. Sabia que eu a odiava.

- Aquela puta – falei com desgosto.

- Sabe quem iria gostar desse bolo?

- Jenny?

- Sim. Jenny. – Bob replicou com um pouco de tristeza em seus olhos castanhos.

Bob era magro e tinha as orelhas um pouco grandes. Sempre me lembrava uma espécie de rato. Ainda mais com aqueles dentes do fundo faltando, deixando assim os da frente em evidência.

- E por falar em Jenny, sabe o que Suzanne me disse? – ainda não tinha contado para ele, e de repente me lembrei que estávamos sozinho naquela árvore, longe dos ouvidos de nossa amiga.

- O quê? – vi certa esperança em seus olhos. Ignorei.

- Que Jenny gosta de mim.

Bob engoliu seco, abriu a boca, e a fechou de novo. Abriu mais uma vez, olhou para baixo e depois para mim, e então sorriu. Um sorriso triste.

- Gosta?

- Gosta. Foi o que Suzanne disse.

- E como ela poderia saber de algo assim?

- Elas ás vezes pensam que são amigas – eu ri. Agora gostava da situação. Gostava de saber que Jenny tinha algum afeto por mim. Gostava disso desde que descobri que também gostava dela.

- Jenny não tem amigas mulheres. Nem mesmo sua irmã – Bob ficou carrancudo.

- Eu sei. E mesmo assim contou.

O menino Bob apenas resmungou alguma concordância e voltou a olhar para baixo, para o chão, que estava uns quatro metros abaixo.

- Você gosta dela também? – ouvi receio em sua voz, e percebi que o próprio Bob gostava de Jenny. Pelo menos me parecia que sim.

- Gosto. Percebi que gosto – eu não queria mentir. Não ia mentir sobre isso. E confesso que senti uma leve pontada de ciúme infantil. Ela era minha, não de Bob. Senti vontade de deixar isso claro, de esfregar em sua cara que Jenny gostava de mim, e não dele. Que era bom ele não se meter nisso. Porém logo em seguida decidi que seria uma criança se agisse assim. E tudo que não podia mais ser era criança.

Um Caminho Para o InfernoOnde histórias criam vida. Descubra agora