Numa cama de hospital (Rethes)

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SABE AQUELAS VEZES em que você está prestes a fazer uma loucura e seu coração parece amarrado? Tipo quando você vai cortar o cabelo sozinha mesmo sem ter nenhuma experiência, ou quando vai invadir uma casa abandonada? (Eu já fiz as duas coisas, então sei bem do que estou falando) então... foi exatamente assim que me senti ao pular de um precipício, só que um pouquinho pior .

Eu nunca tive medo de altura, é claro. Quando eu tinha sete anos, escalava as mais altas árvores, e com dez já podia invocar ventos que me arrancavam do chão. Mas, meu irmão... meu irmão, Kyl, era um tremendo medroso. Ele era apenas um dominador do solo, e suas habilidades eram muito inferiores às minhas. Ele só foi capaz de produzir algo notável aos quatorze anos, e ainda assim foi apenas um trevinho. Por isso eu sempre zombava dele e me vangloriava.

O meu irmão.

Sempre fomos apenas nós dois no mundo, desde quando eu podia lembrar. Ele era dois anos mais novo, mas era o chefe da casa, e fazia questão de me proteger - embora, naturalmente, na hora "h" era eu quem o protegia. Pensar nele me causava uma intensa melancolia.

A sensação de cair era horrorosa. Naquele momento, eu me senti mais Kyl e menos Therry. Me senti uma medrosa. Eu só percebi que não caía mais quando o vento cessou, e a pressão fez minha cabeça parecer enorme. Eu pestanejei, olhando ao redor.

- Mas que...?

Eu estava em um quarto de uma ala hospitalar - mais precisamente sentada na cama. Era como se minha mente tivesse dado um nó. Até onde era fisicamente possível, pessoas que despencavam de penhascos não poderiam aparecer intactas e diretamente em um hospital.

As cortinas ao meu redor eram azuis, com desenhos curiosos em dourado. Azul e dourado. Eu me lembrava de ter estudado as cores das cidades com Kyl, quando éramos pequenos. Ele e eu tínhamos um jogo, no qual o objetivo era citar todos as Terras e suas respectivas cores sem errar, e o perdedor lavaria a louça. De acordo com o nosso jogo, eu estava em...

Varri as cortinas para o lado com a mão, saltando para fora da cama. Agora que tinha a visão completa do hospital, podia ver que as paredes eram azuis, e do teto pendiam muitos sinos de vento balançantes. Eu sabia que aquilo era uma aldeia dentro de uma Terra. E só havia uma Terra que possuía aldeias.

Ali fora estavam Rogi, parado de punhos cerrados e com um morceguinho empoleirado no ombro e Finnie e Stiven, que conversavam entre sussurros.

- Que merda é essa? - me precipitei para Rogi - Estamos em...

Fui interrompida pela porta da ala hospilar, que abriu-se com estardalhaço. Ali estavam três pessoas - um homem alto de longos cabelos escuros e pele num tom de café torrado, um rapaz pálido, cujos olhos muito azuis estavam arregalados, e uma moça morena com o cabelo castanho-escuro até o pescoço. Recuei, parando ao lado de Rogi. Todos os três estavam usando cotas de malha azul-douradas e empunhavam espadas, como se estivessem prontos para uma grande batalha.

- Sim - disse o homem de pele escura - vocês estão em Mont, Terra dos Mutantes.

Os outros que iam chegando e abrindo as cortinas em torno das camas, se juntavam a nós perplexos. Maky não podia voltar à sua forma humana, ou apareceria nua, portanto permaneceu no ombro de Rogi, como um bom morcego.

- Eu sabia. - cruzei os braços - Não precisava de uma entrada dramática como essa. E, a propósito, azul e dourado, hm? Seria a Aldeia da Água?

- Claramente. - a moça morena revirou os olhos - Não precisa ser um gênio para adivinhar isso. Azul: água; verde: tempestade; roxo: solo.

- Você esqueceu uma - provoquei. - amarelo: dominante completo.

A moça morena revirou os olhos.

Missão Secreta - Parte 2Onde histórias criam vida. Descubra agora