Capítulo 32

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Um pouco de pressão na tampa e a vasilha estava bem vedada. Agora, só precisava colocar na parte mais alta da geladeira.

Dessa forma, a falsa torta de carne de cachorro estaria fresca para comer no dia seguinte. Seria o seu almoço.

Lúcio Mauro fechou a porta da geladeira de sua cozinha. Antes, porém, pegou a caixa de leite na porta do eletrodoméstico.

Derramou um pouco do líquido branco numa xícara, levando a louça até o micro-ondas.

Trinta segundos, e o leite já estava morno. Logo em seguida, completou a xícara com café, adicionando uma colher de açúcar mascavo e um pouco de canela.

Colocou o recipiente sobre o pires e sentou-se à mesa. No completo silêncio e escuridão da madrugada, começou a beber a sua xícara de café com leite e canela.

No seu celular, o relógio indicava-lhe que já havia passado das três da manhã. Riu com o canto da boca, pois lembrou-se de um filme de terror que havia assistido dias atrás.

Na história, um dos personagens, um padre, dizia que as três horas da madrugada era conhecida como a hora morta. Nesse momento, os demônios caminhavam sobre a terra para zombar da Santíssima Trindade.

Lúcio nunca fora religioso, não acreditava muito nesse fato. Para o estudante, aquela hora fora somente o momento ideal para ele sair, na surdina, da casa de Maria Efigênia. Até mesmo o porteiro da vila não estava mais acordado.

Terminou de saborear a sua xícara, lavando a louça e guardando-a no escorredor de pratos. Logo em seguida, subiu para o primeiro andar, até o quarto de sua mãe.

Não acendeu a luz. Andou até a janela do quarto de Vera Lúcia. Afastou um pouco as cortinas, encarando a casa de Maria Efigênia.

A lâmpada da sala ainda estava acesa. Afinal, não faria sentido uma morta levantar-se para desligar a iluminação.

Também, deixou a televisão ligada no canal que aquela senhora costumava assistir. Sabia que não estavam mais nos anos 90, e as emissoras tinha programação 24 horas ininterruptas.

Logo, se Efigênia estava assistindo o seu culto no televisor quando teve a parada cardíaca, nada mais natural do que a TV ainda estar ligada.

Logo, como não há mais a interrupção de sinal, o aparelho não deve mais se desligar sozinho.

Lúcio afastou-se da janela, caminhando de volta para o seu quarto. Lá, ligou a luminária, jogando luzes e sombras no seu cômodo.

Estava empolgado demais para conseguir dormir. Mais um plano seu funcionara perfeitamente. Queria, portanto, poder vangloriar-se com alguém, nem que fosse consigo mesmo.

Apoiou o seu celular no tripé à frente da sua cama. Acomodou-se na beirada do seu leito, ficando de frente para a lente do aparelho.

Esticou a mão, tocando no botão vermelho do aplicativo de gravação. Começou a filmar-se.

— Foi um sucesso a torta de cachorro da Mamãe Dolores. Claro que eu não usei de verdade a carne daquele bicho, era só carne moída. — Riu com o canto da boca. — Aliás, aquele rato era muito pequeno. Dava nem pra fazer uma empadinha de festa, quem dirá uma torta salgada inteira.

Colocou a mão na boca, trincando os dentes para não rir alto. Àquela hora da madrugada, o silêncio em Vila Margarida era tanto que até mesmo o porteiro conseguiria ouvir a sua gargalhada.

— Claro que eu limpei tudo lá, usei luva e tudo. Até mesmo as migalhas da torta coloquei num saquinho pra trazer. Tive que segurar a velha pra ela não sair gritando antes da planta fazer efeito, mas isso não é problema, pois não tem como encontrarem digitais na pele.

Parente Serpente [Livro Completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora