Capítulo 37

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Cinco dias. Apenas cinco dias para arranjar ao menos metade do dinheiro que Carlos Henrique devia aos agiotas. Esse fora o prazo recebido por Lúcio Mauro.

Com o ultimato, a porta de trás do sedã preto abriu-se. Um dos bandidos no banco da frente, o barbudo, solicitou ao rapaz que descesse do veículo. O aspirante a farmacêutico olhou em volta.

Viu apenas algumas poucas casas mais simples. Já estava bem afastados do centro da cidade, e o jovem imaginava que não teria nenhum transporte para voltar.

Tentou usar esse argumento com os dois, porém a arma que fora apontada para sua face o fez mudar de ideia e acatar a ordem.

Lúcio desceu do carro preto. Cantando pneus, o veículo afastou-se. O rapaz retirou o celular do bolso, encerrando a gravação que havia feito da conversa com os meliantes.

Sabia que aquilo não serviria de provas para a polícia, pois não era uma gravação com autorização da justiça. Poderia ser, no entanto, algo de útil de alguma forma.

Felizmente, o sinal da operadora ainda era detectado, mesmo já tão na área periférica da cidade. Foi o que precisava para solicitar um táxi.

Não queria ter aquele gasto, todavia era algo inevitável. Ainda tinha muita coisa para resolver naquele dia.

Um bom tempo depois, estava de volta em casa, no mesmo local onde os bandidos o haviam capturado.

Tirou a chave do seu carro do bolso, torcendo para que mais ninguém o interrompesse. Já dentro do seu veículo, olhou para o relógio do seu celular. Já eram duas da tarde.

Também vira diversas notificações de chamadas e mensagens de Ludmila. Sua cúmplice estava bem nervosa e impaciente com sua demora.

Sem tardar mais, Lúcio Mauro acelerou para chegar ao condomínio onde a falsa amante de Carlos Henrique morava.

Como de costume, estacionou numa rua próxima, perto do centro comercial. Antes de descer do carro, procurou pensar um pouco.

Se fosse quitar a dívida de Carlos, o dinheiro de seu velho carrinho não seria o suficiente. Deveria também usar o montante conseguido com a farsa do seguro.

Infelizmente, teria que usar tanto a sua parte como a de Ludmila. Aquilo, no entanto, era praticamente impossível, pois estava prestes a subir para também ser cobrado por sua cúmplice.

Desceu do carro, caminhando para o apartamento da loira. Fez o seu tradicional caminho, galgando os degraus até a morada da jovem.

Pouco tempo depois, já estava na sala de estar de sua comparsa. Tentou dar-lhe um beijo, contudo Ludmila rejeitou. Parecia estar bem nervosa e chateada.

— O que foi, linda? — indagou Lúcio, com voz mansa e preocupada.

— Você sabe o que foi — respondeu a outra, bem impaciente. — As provas do final do semestre tão chegando, e eu não posso fazer enquanto não quitar a dívida na faculdade. Não posso ser reprovada por um motivo tão idiota. Só que você parece não tá nem aí. Eu te pedi vária vezes o dinheiro, poxa. Mas parece que você não quer ajudar, que nem se importa, mesmo depois de todo o sacrifício que eu fiz.

Lúcio adiantou-se para Ludmila. Mesmo com a resistência da loira, abraçou-a. Deixando transparecer a preocupação em sua voz, o rapaz declarou:

— Não é isso, meu amor. Nunca que eu faria isso com você. Eu me preocupo, e muito. Tanto que ofereci a minha parte da grana pra ajudar você.

Ainda próximo da outra, o jovem segurou com suas duas mãos a face da moça. Lúcio apertou os lábios. Com desespero em seu rosto e voz trêmula, o filho de Vera desabafou:

— Se eu pareci nem me importar, nem falar muito com você foi pra te proteger. Eu tô correndo muito perigo agora, e não quero que nada de mal te aconteça. Eu não vou me perdoar se acontecer alguma coisa de ruim contigo.

Ludmila franziu o cenho, sem entender a declaração de Lúcio Mauro. Ao ser questionado pela moça por conta daquelas palavras, o rapaz, de modo leve, soltou-a.

Com gestos e olhar perdidos, ele caminhou até o sofá, sentando-se. Passou a mão no rosto, tentando desfazer-se do espanto. Vendo-o naquela situação, Ludmila acomodou-se ao seu lado.

Sem dizer palavra, Lúcio retirou o celular de sua mão e colocou-o sobre a mesa de centro. O estudante abriu um aplicativo, colocando para tocar a gravação que havia feito dos agiotas.

Calados, ouviram toda a conversa e ameaças feita no sedã preto. A gravação encerrou-se, e ainda ficaram em silêncio, encarando a tela desligada do telefone.

Ainda fitando o vidro negro, Lúcio declarou:

— Eles chegaram em mim perto de casa, antes de eu vir pra cá. Por isso que me atrasei. Foram pra longe. Agora, tenho que conseguir muito dinheiro antes que eles façam mal a mim ou a você.

Ludmila levantou-se. Deu dois passos e parou, desistindo de ir aonde quer que queria ter ido. Estava de costas para Lúcio, sem revelar-lhe a expressão que fazia. Após um tempo em silêncio, a moça falou:

— Então quer dizer que você não pode me dar o dinheiro? Que eu vou reprovar?

Lúcio também se levantou. Com voz falha, o rapaz respondia:

— Não é porque eu não quero, é porque eu posso morrer. Aliás, nós dois podemos morrer. Eu preciso do meu dinheiro e do seu pra salvar a gente. Até o meu carro vou ter que vender pra conseguir livrar nossa cara.

Sempre carinhoso, ele a abraçou por trás. Ludmila virou-se para seu companheiro, ainda em seus braços.

Ela ergueu o rosto, fitando no fundo dos olhos verde-esmeralda daquele rapaz. Desse modo, a loira revelou:

— Eles estão atrás de você, não de nós dois. Na verdade, nem sabem que eu existo.

— Sim, meu amor, mas do jeito que eles me encontraram, podem encontrar você também. Podem tentar te usar, ameaçar você ou fazer algum mal pra me atingir.

— Ou não podem. Até agora, só sabem que você tava envolvido com Carlos Henrique, não eu.

Lúcio franziu o cenho. Sem entender direito, o filho de Vera alertou:

— Por favor, entenda que eu tô correndo perigo.

Desfazendo-se de qualquer expressão em seu rosto, Ludmila declarou:

— Eu não me importo. Nunca liguei, na verdade. E, acredite, meu querido, não vou começar a me importar agora.

Parente Serpente [Livro Completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora