Capítulo 11 - Precisamos conversar

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— Fernando, precisamos conversar.

Ah, aquelas duas palavras... Elas não seriam uma preocupação se a primeira não estivesse ali indicando que as duas seguintes eram para mim.

Parei com o CD a meio caminho de encaixá-lo na prateleira de relíquias e me virei. Dei de cara com uma pessoa que eu certamente conhecia, mas que, naquele momento, parecia estranha. Eu nunca havia encarado aquele olhar. Não com tanta frieza. Tinha algo de letal nele e eu não tinha certeza se queria descobrir o que era.

Os olhos fixos, a postura rígida, o nariz em pé, neutralidade no rosto: Ela vai terminar, foi a primeira coisa que pensei. Me livrei do CD jogando em cima de uma prateleira qualquer, sem tirar os olhos dos dela.

— Vamos lá fora — coloquei a mão no fim das costas dela para guiá-la para fora do corredor. Seu corpo ficou tenso, senti. Quase como rejeitando o meu toque, mas não me afastei.

O que será que eu fiz?, me perguntei ao chegar na área de instrumentos.

Quando passamos por Julio, meu superior, ele fez cara feia.

— Preciso sair por um minuto. Não demoro.

— Claro que não demora — ele disse sério, depois direcionou o olhar para Sabrina, que continuava andando de nariz em pé como se o mundo não a merecesse.

Julio era o tipo de pessoa que você não gostaria de ter como chefe. Se eu não estivesse tão determinado a poupar dinheiro para comprar um carro, já teria dado o fora daquela gravadora musical.

Estava aí mais um motivo para eu ficar preocupado com a aparição de Sabrina: Julio. Ela não ia lá exatamente para ele não ter mais o que falar de mim. A não ser, claro, que agora ela estivesse tão brava que queria mais era que eu me explodisse. Mas por quê? Minha cabeça estava a mil procurando algo que me desse pistas do motivo. A última vez que nos vimos foi há dois dias, na casa dela, e, até onde eu sabia, estávamos bem. Chegamos ao lado de fora, mas no último degrau meu pé ficou parado no ar. Claro.

Tivemos uma discussão no dia anterior, por mensagem. Não foi exatamente catastrófico. Na verdade, foi uma coisa banal, ao menos para mim. Mas agora, pensando melhor, percebi que não nos falamos desde o último: "você quem sabe, Fernando".

Sabrina parou de caminhar ao chegar na sombra de uma árvore de folhas avermelhadas, que chacoalhava demais por causa do vento. Fui atrás dela e parei a uma distância de dois passos.

— Sabrina? — chamei.

Suas mãos estavam fechadas em punho. Os ombros rígidos. A única coisa que se mexia nela era o emaranhado de cabelos rosa sendo levados pelo vento para o lado. Ela se virou devagar. Devagar demais. Quando vi seu rosto, vi também lágrimas querendo transbordar dos olhos alagados. Eu ia dar um passo em sua direção, mas o ato foi interrompido quando ela disse:

— Estou grávida.

Como nascem as estrelasOnde histórias criam vida. Descubra agora