Capítulo 59 - Oi, meu nome é Fer...

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Fernando

Foi estranho receber uma ligação dela em um domingo de manhã. Não porque era domingo, não porque era manhã e nem porque era ela.

Foi estranho porque eu esperei por isso durante cinco anos. E mais estranho porque eu ainda esperava.

Os antigos amigos dela falavam muitas coisas. Alguns diziam que ela estava com depressão crônica, internada em um hospício. Outros diziam que ela havia cometido suicídio. Tinha ainda os que diziam que ela estava viciada em drogas.

E tinha eu que não falava nada, porque não sabia de nada da sua vida. Também não teria como saber, ela não deixou rastros para ninguém.

Significa dizer que tive que continuar casado com ela todo esse tempo, pois se quisesse me divorciar teria que ser por meio de um burocrático processo judicial.

Significa dizer também que não consegui me livrar da casa, que continuava vazia e, provavelmente, decorada por teias de aranha. Mas ao menos consegui me livrar do apartamento, que foi comprado no mesmo dia em que o corretor anunciou a venda.

Minha tentativa de continuar morando naquele lugar, vendo a lembrança dele em cada parte da casa, me fez afundar em uma escuridão que acreditei ser incapaz de escapar. A gente nunca se cura se permanecer no local em que adoecemos, é o que dizem. No entanto, há feridas que, não importa para onde a gente corra, nunca serão curadas.

O novo apartamento era pequeno e tinha tudo o que eu precisava depois de passar o dia inteiro fora: cama. Porque era só para isso que eu voltava todas as noites, exatamente na hora de dormir.

Ela marcou às sete da manhã no parque da roda gigante. Era longe, quase na saída da cidade. Nunca tínhamos estado lá juntos.

Quando cheguei estava vazio, claro, era cedo demais para haver pessoas circulando. Além de um senhor de idade, do outro lado, varrendo as folhas do chão de taboas, não havia mais ninguém.

A roda gigante que marcou minha infância agora estava velha e enferrujada. A nova atração do parque eram os pedalinhos de pato na lagoa.

Decidi esperar perto da lagoa, de onde eu tinha uma vista ampla e a veria chegar, se ela de fato viesse.

Uma parte minha duvidava que ela apareceria. Cinco anos era muito tempo, ela já teria se esquecido do que fomos no passado. Não havia motivo para me procurar.

A uma boa distância, avistei um carro preto, de vidro escuro, estacionar perto do meu carro, mas ninguém saiu de lá por um tempo consideravelmente longo.

Caminhei devagar, prestando atenção ao som dos meus sapatos nas taboas. Meus passos diminuiriam ainda mais quando uma pessoa desceu do carro e veio em minha direção.

Deixei a minha mente aberta, livre de pensamentos, livre de lembranças.

Já perto o suficiente para enxergar o verde em seus olhos, reparei que o cabelo castanho claro estava curto, muito acima dos ombros.

Parecia mais alta, talvez por causa das botas. Mais magra, e isso não era por causa do sobretudo preto. Quando parou na minha frente, tive certeza de que ela não era mais a mesma. Essa era uma mulher crescida.

— Oi, Fernando — nem baixa, nem alta, a voz dela pareceu capaz de tomar conta de todo o ambiente.

— Oi, Sabrina — respondi, sem conseguir evitar um tom de voz frio.

O mundo parecia estar todo em silêncio. Só o som das nossas vozes e da natureza.

Sabrina ficou me encarando, os olhos indecifráveis. Como ela não disse mais nada, falei:

Como nascem as estrelasOnde histórias criam vida. Descubra agora