Capítulo 48 - Comunhão de bens

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Fernando

Será que foi porque nos casamos jovens demais? Será que, por sermos tão novos, não conseguimos lidar com os problemas do casamento?

No fim a minha mãe tinha razão. Ela dizia que na primeira dificuldade iríamos desistir. Dizia que não seríamos capazes de encarar as dificuldades da vida de casados.

Nenhum de nós lhe dava ouvidos. Como poderíamos acreditar nela? Parecíamos tão sensatos. Mesmo casando aos dezoito, tínhamos mais maturidade do que era esperado para nossa idade. Todo o lance de ser pais nos fez amadurecer depressa.

Mas ali estávamos, provando que ela estava certa: separados.

O casamento já ia mal, mas foi no nosso terceiro aniversário que tudo desabou. Eduardo tinha quatro anos. Nove meses haviam se passado desde que Sabrina descobriu que eu menti sobre minha aprovação na USP.

Quando ela disse que nunca mais me olharia do mesmo jeito, ela não estava brincando. Depois desse dia nosso casamento, que já não estava grande coisa, desceu para zero na escala de "felicidade do casal".

Não estou aqui dizendo que paramos de nos falar ou nos tocar completamente. Só que havia momentos, muitos momentos, em que nos tratávamos como estranhos.

Coisas banais que ela fazia, como esquecer portas e gavetas dos armários abertas, como se elas fossem se fechar sozinhas, me irritavam. Coisas triviais que eu fazia, como esquecer os sapatos jogados em qualquer lugar da casa, a enlouqueciam.

De repente estávamos brigando por idiotices como toalha em cima da cama e controle remoto fora do lugar.

Os ressentimentos que estávamos guardando um do outro faziam essas coisas banais parecerem desaforos imperdoáveis.

A questão é que antes tentávamos ser diretos e abertos para falar sobre o que nos incomodava. Mas nove meses gastando nossas mentes com pequenas questões estúpidas do cotidiano foi capaz de deteriorar nossa comunicação, nossa sinceridade, nosso relacionamento.

O domingo, antes eleito como o dia oficial de aproveitar um tempo de qualidade em família, devido à falta de tempo do resto da semana, já não significava nada.

Virou o dia de ficar em casa sozinho, assistir filmes ruins e comer as sobras do dia anterior como almoço. Minha esposa e filho o passavam na casa da mãe dela. Eu não era convidado. Muito menos queria ir.

O fato é que Sabrina passava quase todo o tempo disponível na casa de sua mãe.

Não importava mais. Eu tinha parado de ligar. Se ela queria ir, que fosse. Ao menos eu não teria que lidar com o incômodo de ver tanta infelicidade no rosto dela.

Era isso, Sabrina estava infeliz com o casamento. Eu também não estava feliz, mas a diferença é que eu queria resolver. Já ela, eu não sabia o que queria. Eu só tinha uma certeza: do jeito que estava, não dava para continuar.

Teve um domingo em que as coisas mudaram. Era o nosso terceiro aniversário de casamento e não tinha como ignorar. Até tentamos, mas os nossos pais se reuniram pelas nossas costas e decidiram organizar um grande almoço de comemoração.

Por volta de uma da tarde, estávamos no jardim da casa dos meus pais, embaixo da árvore gigante que devia ser mais velha que a soma da idade deles. Balões redondos decorativos, que pareciam pérolas gigantes, estavam presos nos galhos. A mesa exagerada estava repleta de coisas que ninguém ali aguentaria comer. Maior parte iria para o lixo.

Fiquei irritado. Para quê toda essa atenção em um aniversário que, para os aniversariantes, já não significava tanto?

Apesar de Sabrina e eu não termos trocado uma palavra sequer, conseguimos levar o almoço numa boa. Isso só até a minha mãe, sentada à minha direita, lançar a seguinte pergunta:

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