Capítulo 40 - Quero ver bem de per...

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Talvez ele não me reconhecesse. O fatídico dia em que dei um fora nele era noite, estava escuro e ele tinha tomado uísque. Me agarrei a essa esperança.

No instante em que me viu, no entanto, os olhos de Rodrigo se arregalaram.

— Vou deixar vocês trabalharem — Otávio disse e saiu, me dando uma encarada dura por eu não ter me aproximado para apertar a mão do novo chefe de finanças quando ele nos apresentou.

Fiquei parada olhando para ele pelos cinco segundos seguintes, até que ele se levantou, passou para a frente da mesa e, encostando despojadamente nela, disse:

— Ora, ora, mas que surpresa, não? Sabrina — e cruzou os braços.

Aquele sorrisinho no rosto deixou bem claro que ele não iria simplesmente esquecer.

Por um instante fiquei na dúvida se eu deveria ser submissa, já que ele era o meu superior, ou encarar de igual para igual, devido ao tom da nossa interação de duas noites atrás.

— Pois é — cruzei os braços e levantei o queixo.

Escolhi a opção dois. Era bom deixar claro que ele não me intimidava.

Ele ficou me encarando por tempo demais. Levantei as sobrancelhas em questionamento para ver se ele se tocava. Meus cabelos, mal presos, se soltaram.

— Me tira uma dúvida... — ele descruzou os braços e apoiou as mãos na mesa. — Como conseguiu estágio em um banco com esse cabelo?

Que grosseria. Isso é pergunta que se faça?

A verdade é que eu me arrependia profundamente de ter pintado o cabelo de novo.

Foi no aniversário de dois anos de casamento/meu aniversário de 20 anos. Fiz aquilo porque Fernando dizia que sentia falta do meu "cabelo de algodão doce". Agora, dois anos depois, da raiz até o meio estava natural, mas do meio até as pontas era só o rosa desbotado.

— Consegui o estágio porque sou boa — mantive o queixo erguido.

— Boa em que?

— No que faço.

— O que você faz?

— Você queria uma estagiária para trabalhar ou para bater papo?

Rodrigo riu, como se tivesse gostado da resposta. Então se afastou da mesa.

— Tem razão. Vamos trabalhar — disse, enquanto caminhava tranquilamente pela sala.

Ele foi até uma área recuada da sala, onde uma estrutura de trabalho típica para estagiários estava montada. Rodrigo retirou as coisas da superfície da mesa estreita e a carregou sem esforço, posicionando-a ao lado da sua própria. Depois puxou uma cadeira e olhou para mim.

— Venha, Sabrina. Me mostre o quanto era verdade quando você disse que é boa — deu dois tapinhas no acento da cadeira. — Quero ver bem de perto.

Eu estava ferrada.

Qualquer um encararia a constante supervisão de Rodrigo como uma paranóia comum ao pessoal de finanças, sempre na expectativa de que estagiários vão colocar um zero a mais nas contas. Mas eu sabia que ele estava fazendo para se vingar do fora que dei nele.

— Olha isso aqui, — ele apontava para valores nos meus balancetes — está tudo errado, faz de novo.

Eu fazia tudo de novo. Dava o mesmo resultado.

— Agora está certo.

Como não matar?

Antes de ir embora ele teve a audácia de perguntar se eu não queria tomar o drinque mais tarde.

Como nascem as estrelasOnde histórias criam vida. Descubra agora