Capítulo 19 - Camisa vomitada e sapatos encharcados

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Foi uma má ideia. Não, uma péssima ideia.

— Eu sinto muito, Fernando, achei que ia ser divertido — Sabrina disse, triste.

— O que poderia ser mais divertido que uma camisa toda vomitada e sapatos encharcados? — mostrei a mim mesmo fazendo cara de quem tinha ganhado um prêmio.

Era para ser engraçado, mas eu não estava com humor algum, por isso saiu irônico e um tanto ríspido. Ela ficou ainda pior.

Eu estava chateado com tudo que tinha ocorrido, mas não podia culpá-la só porque foi ela quem insistiu em ir.

Paramos na porta da casa dela finalmente nos abrigando da chuva. De onde estávamos vindo? Da festa de aniversário de alguma colega de Sabrina que eu não me lembrava o nome, mas lembrava do nome que Cláudia deu:

— EI! O QUE ESTÃO ACHANDO DA FESTA DA BANANA? — gritou sobre a música alta com a voz irritante de bêbado.

Música? Eu não considerava aquele tipo de coisa como música. E isso não tinha a ver com o meu convívio diário com Julio, a pessoa mais exigente e insuportável do planeta no quesito qualidade musical.

No entanto, parecia que só eu alí pensava assim, ou então os outros estavam bêbados demais para prestar atenção na letra asquerosa.

Não querendo dar uma de fiscal de gosto musical alheio nem nada assim. A minha chateação era porque o meu filho estava tendo contato com aquilo. Óbvio que ele não compreendia, mas eu tinha recém descoberto que, aos quatro meses de gestação, o bebê começa a captar o som de música.

Eu estava ansioso por uma oportunidade de reproduzir minhas músicas para ele.

O médico explicou a importância de criar laços emocionais com o bebê durante a gestação, ler para ele, conversar, acariciar a barriga. Sabrina já estava fazendo isso, mas para mim faltava oportunidade.

E quando finalmente a oportunidade surgiu, ali estávamos nós, cercados por um bando de adolescentes bêbados e escutando música de qualidade duvidosa.

Detalhe importante: o pai de Sabrina estava viajando, por isso ela conseguiu sair. Ela estava proibida de sair da casa depois das sete — e qualquer outro horário se a companhia fosse eu —, mas como a mãe dela andava preocupada com o estado deprimido da Sabrina, acabou permitindo.

Então era meio que justificável ela ter se empolgado tanto e insistindo tanto em ir. Sabrina era praticamente uma prisioneira. Ficava trancafiada dentro de casa o tempo todo. Era da escola para casa e acabou.

Era isso, Sabrina estava de castigo. Ela não só quebrou a regra da "porta aberta" como engravidou no processo, então a proibição em me ver fazia parte fundamental desse castigo sem data para acabar.

A única exceção à proibição de contato comigo era no que dizia respeito ao acompanhamento médico da gestação, ao menos nisso ele se mostrou razoável.

Eu nem consigo imaginar Sabrina, uma adolescente que mal completou dezessete anos, lidando com uma avalanche de exames, orientações médicas minuciosas, consultas frequentes, e toda a pressão emocional que vem junto com a responsabilidade de cuidar de si mesma e de uma vida se formando dentro de seu corpo, sem a presença do pai da criança, a minha presença, ao seu lado.

Se para mim lidar com tudo aquilo já era avassalador, imagina para ela. E, por mais que eu conseguisse acompanhá-la ao médico, isso não era suficiente. Sabrina estava grávida, emocionalmente vulnerável, com o humor inconstante, apavorada com a responsabilidade de ser mãe, ela precisava de mim por perto. Mas como isso seria possível se ela não podia sair de casa e eu já não era bem-vindo lá?

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