Capítulo 15 - Você é tão infantil

2.3K 290 337
                                    

— Salve-se quem puder, Fernando?! — Sabrina riu colocando um pedaço grande de algodão doce rosa na boca.

Nunca achei graça nessa coisa, algodão doce. Para mim era o mesmo que comer isopor. Mas quem era eu para recriminar uma grávida? Se ela quisesse comer jiló eu plantaria um pé só para ela.

Do outro lado da prateleira, através dos frascos amarelos de shampoo infantil, vi, de repente, seu sorriso murchar até desaparecer.

— Sabrina?

— Como vou voltar para casa agora? — aquela voz de desamparo era angustiante.

Talvez se eu dissesse uma coisa bem idiota ela trocasse de emoção.

— Espera até a noite. Ele já vai ter esquecido.

— Até parece! Você esqueceria se a sua filha de dezesseis anos dissesse que está grávida?

Chegamos ao final da prateleira e ficamos frente a frente.

Onde estávamos? Em um lugar chamado Mundo do Bebê. Entramos por acaso, enquanto caminhávamos pela rua. É claro que é mentira. Não entramos por acaso, foi a Sabrina quem me arrastou para dentro da loja dizendo que era o bebê que estava pedindo. Se eu já fazia as vontades dela antes, imagina agora com esse argumento.

Mas nem isso a animou. Sabrina estava desolada. Ela colocou o algodão doce da cor de seu cabelo sobre uma montanha de fraldas, olhando para ele como se tivesse acabado de perder a graça. Queria poder fazer alguma coisa. Queria poder tirar aquela tristeza de seu rosto.

— Sabrina...

Ela levantou a cabeça e aí, do nada, mudou de uma pessoa triste para uma pasmada.

— Você viu como ele ficou uma fera?! — arregalou os olhos, estupefata.

Então a bipolaridade bateu forte e ela, provavelmente vendo arco-íris, saiu sorridente ao encontro dele. Os hormônios dela estavam uma loucura. Em menos de um minuto ela já havia acabado de transitar entre tristeza, desespero, medo, alarme e euforia.

— Olha, Fernando! Os carrinhos! — disse correndo para os carrinhos cor de rosa.

O que mais eu podia fazer? Fui atrás.

— Olha esse aqui! É lindo! — ela apontou para uma coisa cheia de babados.

Levantei as sobrancelhas para ela.

— Não acho que ele — apontei para sua barriga — vá gostar dessa coisa rosa.

Sabrina rapidamente tirou o sorriso do rosto.

Ela — pôs a mão na barriga — vai amar coisas rosas.

— Meu filho, vai gostar mais de um carrinho assim. — Segurei o empurrador de um carrinho que tinha a palavra "Guerreiro" escrito em branco na lateral.

As rodas eram enormes e pareciam até à prova de balas. Era verde escuro e todo equipado para a segurança que um bebê precisa.

— Credo — ela fez cara de descaso para o Guerreiro, com aquele nariz afilado lá em cima. — Minha filha não vai entrar nessa coisa. — Sabrina pegou o carrinho rosa, aquele tipo de rosa tra-lá-lá que faz você ver unicórnios vomitando arco-íris.

— Essa coisa nem deve andar — zombei das rodas cheias de, advinha?, pérolas cor-de-rosa.

— E essa coisa aí deve ser tão pesada que nem você vai conseguir guiar. — Ela olhou com desdém. — Parece mais um tanque de guerra.

Arqueei uma sobrancelha, ela também. Ambos olhamos para a pista de teste. Aquele era um desafio. Tirei o Guerreiro do lugar e ela tirou o Unicórnio. A pista dava saída para uma parte aberta ao fundo onde o chão era de ladrilhos. Tinha uma placa chamativa, em rosa fluorescente, avisando para tomar cuidado com os carrinhos ao experimentá-los. Paramos juntos na linha de partida (não era uma linha de partida, mas é aqui que entra a criatividade, oras).

— Quem chegar por último vai ter que beijar os pés do outro — ela disse apertando firme o segurador.

— Então vai preparando sua boquinha aí — mandei beijo no ar, ela fechou a cara.

— No três — estabeleceu com olhar desafiador, eu assenti. — Três! — e saiu na frente cantando "perdedô-ôôr"

— Trapaceira — murmurei indo atrás. — Vou fazer seu unicórnio comer poeira.

Claro que eu alcancei, e passei. O Unicórnio não era de nada.

— Rá! Quem é o perdedor agora? — provoquei.

Sabrina fez cara de brava, a bochecha levemente inflada e as sobrancelhas franzidas com afinco. E como a má perdedora que era, jogou o carrinho em cima do meu. A pancada me atrasou, mas não ia ficar barato. Estreitei os olhos para ela, virei o carrinho e bati no Unicórnio.

— Você é tão infantil!

— Falou a adulta.

Ela bateu de volta, bati também. Que vencesse o melhor.

— Ei! Trombadinhas!

Dentro do uniforme rosa, uma funcionária da loja vinha feito um trem descarrilhado para cima de nós.

— Mas o que vocês estão fazendo?! Eu vou chamar a polícia!

Como nascem as estrelasOnde histórias criam vida. Descubra agora