Capítulo 56 - Fernando, eu estou...

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Meu coração ardia impiedosamente ao encerrar a chamada com a advogada. Ela disse que me enviaria os detalhes por e-mail e eu desejei não ter e-mail para não receber porcaria nenhuma. Eu não queria isso. Eu não queria perder Fernando para sempre. Mas ele também procurou um advogado, então o que eu podia fazer a não ser aceitar o fato de que ele não se sentia igual a mim?

Será que ele nunca me amou como e eu amei? Mas e aquelas memórias tão afetuosas de momentos que vivemos juntos? Todas as coisas lindas que Fernando um dia me disse... a forma de me olhar, como se fosse completamente apaixonado por mim... e a forma de me abraçar, como se eu fosse seu mundo...

Minhas lembranças estavam enganadas? Eu precisava colocá-las à prova. Foi por isso que, assim que levamos o cachorro de volta e Diana se despediu de Eduardo, fomos para nossa antiga casa.

Ao contrário do que eu esperava, não foi emocionalmente difícil entrar lá. Na verdade, eu só percebi o quanto sentia saudades daquele lugar.

Não estava tão empoeirado quanto eu imaginei. Eduardo e eu exploramos a sala e cozinha enquanto ele vibrava de felicidade ao apontar para objetos peculiares, como a almofada rosa claro em formato de coração. Embora fosse minha, ela era motivo de disputa entre nós três na hora de assistir filmes, deitados no sofá.

Eduardo apontar para aquela almofada no sofá me remeteu à cena em que eu criticava a cafonice dos presentes do Dia dos Namorados, quando nós três estávamos passeando no shopping. Havia corações para todos os lados, flores e até fontes de chocolate:

— Que ixu, mamãe? — Eduardo de três anos perguntou naquele dia, apontando para um coração rosa claro de pelúcia maior que ele mesmo.

— É coisa que gente brega dá de presente, meu anjinho — expliquei.

— Que é bega?

Coloquei a mão na boca imediatamente. Eduardo estava na fase de repetir tudo o que ouvia, e "brega" não era uma palavra que eu gostaria que ele levasse para a creche.

— Ensinando vocabulário novo para o nosso filho? — Fernando deu um sorriso travesso.

Na manhã seguinte, Dia dos Namorados propriamente dito, Fernando me acordou com flores, chocolate e o maldito coração rosa de pelúcia, tudo o que eu havia criticado no dia anterior.

— Eu não queria ser brega, sabe? Mas minha esposa também é minha namorada, e que tipo de namorado eu seria se não lhe desse um presente bem cafona?

Pulei no pescoço dele e o abracei forte, dizendo toda emocionada:

— Você é o melhor namorado e o melhor marido do mundo.

Agora, encarando o meu coração de pelúcia jogado no sofá, eu sentia o meu coração de verdade se derreter. Aquela lembrança era real, o jeito que ele me abraçou naquele dia foi real.

O som desafinado de uma flauta me fez olhar para Eduardo. Ele estava soprando a flauta roxa de plástico. Aquilo foi um gatilho de lembrança para momentos em que Fernando e eu estávamos no tapete com Eduardo, cada um com seus livros tentando estudar para faculdade, e Eduardo começava a soprar a flauta com toda a força do seu pulmão:

— Me lembra por que exatamente você comprou uma flauta para o nosso filho de um ano e dois meses — disse Fernando, semicerrando os olhos para mim.

— Você não estava lá, não viu o show escandaloso que ele deu querendo ela, não pode me julgar — coloquei as mãos nos ouvidos, uma vã tentativa de encobrir o barulho agudo da flauta.

— Eu vou te julgar eternamente por ter aumentado o potencial de barulho do nosso pequeno inimigo do silêncio.

Engatinhei até Eduardo, que estava sentado do outro lado de Fernando, e o peguei.

Como nascem as estrelasOnde histórias criam vida. Descubra agora