Capítulo 11

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Enquanto isso nos lábios de Henrique...

Aquele beijo estranho não acabava, e Renato não saía dali. Quando não aguentando mais o afastei. O beijo não chegou nem perto do que acabara de acontecer minutos antes. E o fato de eu sentir essa diferença me perturbava. Muito!

Eu queria fazer isso há muito tempo. - Henrique falou fazendo me sentir culpada. Olhei para trás e ele permanecia ali, parado me observando. Tinha um sorriso enervante nos lábios. 

Eu não sei o que te dizer. Só que eu por muito tempo também quis.

Mas agora não?

Sabe quando você tenta tanto fazer uma coisa e da tudo tão errado que você desiste?

Eu sabia que tinha sido um erro eu sair daquele jeito da boate. Não entendia o que estava acontecendo entre vocês dois.

Nada! - Quase gritei. - Não há nada entre nós!

Eu sei, por isso vim falar com você.

Henrique eu preciso ir. Meu pai está internado, e eu tenho que ficar com ele. - Falei saindo o deixando sem direito de resposta.

Corri até o metrô, não queria que Renato me alcançasse, mas quando olhei para trás senti uma ponta de desapontamento quando percebi que ele não o fez. Desci as escadas correndo, sentindo o peito apertar e um nojo ao lembrar dos lábios do Henrique em mim. - Não era esse o beijo que tanto imaginei acontecer entre nós dois, mas tudo parece ter se voltado para outra pessoa. Renato!

Seu cheiro estava impregnado em minha pele, e a dor que senti ao beijar outro em sua frente, como se tentando o afastar estivesse enfiando uma faca em meu peito e a torcido. As lágrimas desceram dos meus olhos, dentro do metrô cheio, mas me sentia tão só que não via mais ninguém.                       
Não queria sentir, quero poder apagar. Esse tipo de sentimento não faz bem a ninguém. Só destrói...

Cheguei ao hospital e encontrei minha mãe a beira da cama do meu pai. Parecia menos bêbada do que o normal. Ver meus pais juntos era o que mais me motivava a fugir de sentimentos extremos. Paixões, amor, qualquer coisa que fizesse o coração bater mais forte. Minha mãe ainda amava meu pai, e ele certamente amava minha mãe. Mas isso para eles não era o essencial! As pessoas conhecem apenas a história bela do amor. Aquela que enfrenta o mundo e luta contra tudo para ser feliz. Eu vi e vivi na pele o depois. Tudo é muito bonito até virem os filhos, os problemas, as contas, a fofoca, as doenças e na fraqueza do homem o vício. Minha mãe se apaixonou pelo meu pai muito nova, tinha apenas 14 anos e ele 17. Foi aquela coisa arrebatadora que tira o sono, o ar. Lembro que minha dinda me contava como eles eram felizes. Aos 15 anos ela engravidou de mim e meu pai, que havia acabado de se alistar no exército, a levou para morar com ele.  Era tudo felicidade, uma família, mesmo que precoce, mas que se mantinha bem. Meu pai trabalhava duro, vivia para nós duas e fazia todos os sonhos serem realidade. Uma vez quando, depois de 15 dias no quartel, ele voltando para casa ouviu uma conversa sobre um homem que visitou minha mãe todos os dias e então foi o começo do fim. Meu pai começou a desconfiar, eu tinha 4 para 5 anos, e tudo ainda é bem vivo na minha cabeça. Minha mãe jurou que nem sabia do que falavam, que não tinha homem algum, mas ele não acreditou. Um certo dia meu pai voltou antes do tempo, chegando em casa de surpresa e encontrou um homem que entregava os cosméticos que minha mãe vendia para ajudar as despesas, ele ficou enfurecido achando que aquele era o homem de quem todos falavam. E num ato de impensada loucura ele esfaqueou o rapaz, o levando a morte. Minha mãe ficou desesperada, tentou socorrer o rapaz, meu pai ficou furioso e deu três tapas no rosto dela a fazendo desmaiar por causa da força.  Eu graças a deus estava na escola, não presenciei nada. Minha mãe, já no hospital descobriu que estava grávida e claro que meu pai achou que era do outro. Meu pai ficou preso por dois anos, mas foi solto. Todos defenderam minha mãe, até os infelizes que inventaram a fofoca, mas ele não conseguia mais confiar. Com o tempo, depois de perder todas as oportunidades na vida por causa do amor que sentia ele começou a se meter em brigas, vivia em bares, todas as noites voltava para casa embriagado.  Minha mãe só conseguia manter as coisas por que minha dinda as ajudava. Ela era um anjo em nossas vidas e para garantir que eu nunca ficasse desamparada deu uma casa a meus pais, mas deixou em meu nome. Depois de uns anos, creio que pelo desespero que sua vida havia tornado por causa do amor que sentia e que agora era rejeitado, minha mãe começou a beber, cada vez mais e mais dois anos depois que meu pai voltou nasceu Isaque. Quando ela engravidou de Fernando, os dois quase morreram em um parto complicado. Meu pai sofreu demais, pois ainda a amava mesmo não confiando. Era triste vê-los se destruindo. Se não se amassem, cada um seguiria sua vida e tentaria ser feliz. Mas esse maldito sentimento os impedia de se separarem, e isso só os destruía mais. Fernando nasceu de 6 meses, e minha mãe assim que saiu do hospital foi direto para o bar. Nem viu o rostinho lindo dele. Ele foi criado por mim e pelos meus irmãos. Depois disso eu jurei a mim mesma que nunca me deixaria dominar por sentimentos assim. É um sentimento diabólico que deixa cego o outro e que acaba com a vida das pessoas. As que tinham sorte até com seguiam viver a felicidade, mas olhando ao meu redor, as histórias que me cercam vejo que é mais provável a tendência ao fracasso.
E me sentir agora como se nada mais fosse funcionar sem ele perto era desesperador. A forma como a presença dele me afeta, como não consigo controlar meus sentimentos e nem o que eu falo. Não quero perder o controle das minhas emoções. Por esse motivo preciso me afastar. Casamento, família, isso tudo para mim não passa de uma forma do governo ganhar dinheiro nos cartórios e aumentar a população para gerar mais votos. E quanto mais pobres as famílias, mais filhos sem educação que procriarão mais e mais desavisados que só farão sofrer. Entrei tendo o olhar da minha mãe sobre mim.

Sabrina Onde histórias criam vida. Descubra agora