capítulo 59

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Para surpresa de Belinda, Dulce não esboçou nenhuma reação. Claro que considerava a mulher de Christopher uma criatura fria, desprovida de emoções, porém não acreditava que alguém pudesse permanecer impassível diante de uma acusação de infidelidade.

— Acho melhor você partir. Hoje — Dulce falou muito calma.

— Oh, partirei, e com prazer! Espero nunca mais tornar a vê-la, ou ao seu marido, ou ao seu irmão. Espere só até o barão Léon saber como vocês me trataram!

— É melhor você lembrar-se de que sir Christopher é um dos cavaleiros preferidos do barão antes de forçá-lo a tomar partido neste caso. Ah, também gostaria de lembrá-la de que o barão continua solteiro.

Por um instante, Belinda pareceu vacilar, sem saber como reagir. Então levantou-se e saiu pisando duro.

Dulce permaneceu imóvel, isolada em seus pensamentos e na sua angústia. Enfim, suas suspeitas pavorosas haviam sido confirmadas.

Christopher não a queria.

Sentia-se derrotada, paralisada, como se todo o castelo houvesse desmoronado, enterrando-a sob toneladas de pedras.

O que foi que Tomáz dissera? Que o amor podia levar a um desespero maior do que a morte. Oh, Deus do Céu, por que tivera que descobrir a verdade terrível contida naquelas palavras? Dulce cobriu o rosto com as mãos e tentou não chorar, não urrar como um animal ferido.

 

— Está tudo bem, minha lady — uma das sentinelas gritou de longe. — Ele não se machucou. Já está se levantando.

Dulce olhou na direção que o soldado apontara, vendo Christopher levantar-se e sair em perseguição à bola.

Lá estava, o grande sir Christopher de Uckerman, com todas as suas conversas sobre honra e lealdade.

Tudo mentira.

— O quê? Você já está exausto? — Christopher indagou, parando ao lado de Tomáz, que respirava com dificuldade. — Pelo visto, não o tenho feito exercitar-se o suficiente.

— É, acho que não. Mas tampouco sou jovem.

— Vamos! — Christopher gritou, apontando para onde estava a bola.

— Por Deus, homem, isto é só um jogo.

— Quer dizer que desiste? Talvez você devesse voltar para o castelo e descansar. Talvez seus dias de luta já tenham terminado sem que eu reparasse.

Morto de ciúmes, Christopher atacava o outro de uma maneira quase inconsciente. Só não conseguia entender por que o amigo não reagia às suas provocações.

— Ah, então você quer me testar, não é? Pois bem, apresse-se, sir Christopher.

Tomáz recomeçou a correr com renovado vigor e, apossando-se da bola, avançou vários metros na direção de St. Ninian's. Sabendo que Dulce os observava do alto das muralhas, Christopher pôs-se ao encalço de Tomáz, não querendo que fosse ele o responsável pela vitória. Na ânsia de tomar a bola do amigo, Christopher empurrou-o com força, fazendo-o perder o equilíbrio e cair na lama.

Nessas alturas Téo, e um grupo de dez camponeses, formaram uma barricada ao redor de Christopher, impedindo a aproximação dos adversários e permitindo que seu líder chegasse à igreja, alcançando o marco da vitória.

Quando a bola tocou a parede externa, gritos encheram o ar, saudando Christopher, Téo e os outros.

Foi somente depois que a gritaria arrefeceu, que Christopher se deu conta de que Tomáz ainda não se levantara.

— Você fez um ótimo trabalho — Dulce comentou, observando como Pascual arrumara o pátio interno. Grandes barris de cerveja estavam dispostos em todos os cantos e uma mesa farta também aguardava os jogadores, pois ela decidira que, ganhando ou perdendo, aqueles que viviam sob a bandeira de Uckerman estariam sedentos e precisariam ter seus esforços re-compensados. Agora, só faltava saber quem ganhara. Anahí desaparecera dentro do castelo, tendo sido chamada por lady Belinda para ajudar na arrumação da bagagem. Entretanto, a irritação óbvia de Belinda pouco incomodava lady de Uckerman. Seria um alívio ver aquela mulher pelas costas.

De repente, um grito festivo chamou-lhe a atenção.

— Nós ganhamos! — exultava o menestrel, que tomara o lugar de Dulce nas muralhas. — Nós ganhamos! Aliviada pelo término do jogo, Dulce buscou o silêncio do jardim. Logo Christopher e os outros estariam no pátio interno, rindo, conversando e bebendo. Ninguém notaria a sua ausência.

 

Sentada num banco de pedra, ela apoiou o rosto nas mãos, o olhar fixo nas flores coloridas, os pensamentos vagando longe. Chegara a esse casamento sem alimentar esperanças românticas, ou tolas ilusões. Se Christopher houvesse deixado claro, desde o início, que pretendia dormir com outras mulheres, era provável que houvesse aceitado, como sendo parte do acordo nupcial. Contudo, não fora o que acontecera. Acabara acreditando que ele manteria os votos de fidelidade, e a desilusão tornara-se insuportável. Pensar que seu marido tentara seduzir a fútil Belinda causava-lhe um sofrimento atroz, especialmente quando ele insistia tanto na importância da lealdade, da honestidade. Oh, Deus, casara-se com um homem sem honra, com um canalha!

Não havia mais nada a fazer. O casamento fora consumado e não lhe restava outro lugar para onde ir.

E o que era pior, queria apoiar-se na força do ódio quando se sentia apenas fragilizada por um amor sem esperanças.

— Minha lady! — Pascual gritou, entrando no jardim, a voz carregada de apreensão.

— O que foi? — ela indagou, aflita, lembrando-se do que Anahí dissera sobre a violência do jogo. — Christopher...?

— Não. Sir Tomáz.

A revelação trouxe-lhe certo alívio, enquanto Dulce corria na direção da pequena multidão que agora atravessava os portões do pátio interno. A frente, vinha Christopher, carregando Tomáz, inconsciente, nos braços.

 

— O que aconteceu?

— Ele caiu e bateu a cabeça.

Tomáz gemeu baixinho e, para surpresa de Christopher, Dulce sorriu.

— Um bom sinal. Leve-o para o salão — ela ordenou. — Pascual, vou precisar de água quente e panos limpos. Tem algum médico na aldeia?

— Não, minha lady. O médico faz visitas periódicas, porém...

— Vá pegar a água e os panos limpos.

— Sim, minha lady. — O administrador correu para a cozinha, ansioso para ajudar de algum modo, sendo imediatamente seguido por Anahí.

Virando-se para o marido, Dulce decidiu-se.

— Leve-o para o nosso quarto. Lá é mais sossegado e a cama, mais macia.

Christopher fitou-a, uma expressão indecifrável no rosto.

Sem dizer uma palavra, fez o que lhe foi pedido, depositando o amigo sobre os lençóis brancos e perfumados.

— Uma pedra?

— Sim — ele respondeu, preocupado demais com o estado de Tomáz para se importar com a maneira quase rude com que a esposa o tratava. O que acontecera a Tomáz fora culpa sua. Cego de ciúmes, acabara empurrando-o e fazendo-o bater a cabeça.

Esposa Rebelde - VondyOnde histórias criam vida. Descubra agora