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Acordei alarmada pelo barulho lá de fora, agucei a audição e pude perceber o que, ou melhor, quem, havia me acordado. Lá embaixo no jardim, Tobias gritava ordens aos outros empregados para que se apressassem. Ele era um homem discreto, mas às vezes sua responsabilidade falava mais alto e acabava por chamar mais atenção do que gostaria, o que na verdade, não me incomodava, afinal, ele cumpria suas tarefas de forma exemplar. 

Aparentava mais idade do que realmente tinha, talvez porque, há alguns anos, lhe foi dada a função de chefe dos empregados, função esta que exigia muito esforço e dedicação. Ele sabia exatamente como tudo devia acontecer e exigia ao máximo de todos seus "colegas de trabalho", ele mesmo fazia questão de se referir aos demais empregados do castelo desta forma. 

Muitos cidadãos, que moravam mais perto do castelo, sequer o viam perambulando de um lado para o outro a fim de que tudo estivesse em seu devido lugar. Havia um boato na cidade de que ele era algum tipo de mago ou bruxo, em razão de sua discrição, as pessoas não se davam conta de sua presença, e tinham a impressão de que ele aparecia do nada, como se tivesse surgido das sombras, mas eu sabia que ele não passava despercebido pelas pessoas do castelo. 

Ele tinha mais do que o respeito dos outros funcionários, todos o admiravam e juntos, pareciam um verdadeiro exército, primeiros a levantar, últimos a se deitar.

Eu admirava isso em todos eles, a força e dedicação que empregavam em cada tarefa que lhes era requisitada, apesar disso, nunca tinha os dito de forma direta, eu não era uma princesa do tipo boa com palavras, pelo menos era isso que todos pensavam.

Quando era realmente necessário eu sabia bem me expressar, porém, esses momentos eram raros. Toda vez que eu abria a boca era motivo de dor de cabeça para meu tio. 

Eu era grata por tudo que eles faziam e sabia que, se não todos, boa parte deles tinha ciência disso. Eu não falava, mas demonstrava, ao meu modo e, apesar de tê-los como exemplo, eu ainda estava deitada e não havia aberto meus olhos. 

Tinha percebido que a claridade já tinha invadido todo o ambiente. Mesmo de olhos fechados eu sabia exatamente como estava cada canto do meu quarto: os lençóis brancos da grande cama estavam intactos do lado esquerdo, uma vez que, aprendi a me controlar durante o sono e me mexer o menos possível; na grande poltrona vermelha, próxima à janela, encontravam-se minhas roupas que usaria hoje mesmo e, ao lado dela, meu par de botas, gastos pelo excesso de uso.

Com exceção das belas flores que se encontravam em um vaso em cima da cômoda, todo o restante do ambiente estava frio e sem vida, já que o sol não tinha dado o ar da graça de fato, mas por bondade ou não, já havia concedido a todos o aviso, através de sua luz, mais um dia tinha chegado.

Ainda deitada, agradeci mentalmente por Tobias ser tão exigente, seus gritos me tiraram do sonho que me aprisionava. Não era a primeira vez que o tinha, e sabia que não seria a última, mas hoje tinha sido diferente, tinha sido mais intenso. Sentia todo meu corpo pesado e sem força, como se minhas energias tivessem sido sugadas enquanto dormia.

Pela primeira vez em muitos anos, desejei passar mais alguns instantes deitada, apenas ouvindo tudo ao meu redor, mas eu não poderia me dar ao luxo, não hoje. Abri meus olhos e percebi, para meu desagrado, que o dia tinha amanhecido mais cedo do que o normal. 

Se o sol se apressara, eu também me apressaria. Não perderia mais tempo, afinal, tinha atividades a serem cumpridas e que não poderiam esperar mais, eu as tinha deixado de lado o máximo possível.

Sentei-me na cama, espreguicei-me e olhei através da janela. A manhã estava bela, como de costume. Era assim que eu gostava que meus dias começassem, nada de escuridão trazida por grossas cortinas ou qualquer outra coisa que impedisse a luz matinal me acordar tão suavemente.

Amor FatiOnde histórias criam vida. Descubra agora