Capítulo 6

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Brandon

A música tocando na sala tem uma batida leve e completamente sem ritmo. Mas tem potencial. A voz da cantora é mal colocada, apesar de ser afinada. Não consigo evitar de achar que ela está sofrendo ao pronunciar cada palavra da letra.
Olho através da sala pra encontrar Riggs encostada na mesa de reunião, com os olhos fechados e o rosto ao alto. Ela quase parece estar se divertindo com a música.
Como ela pode achar satisfação em algo tão ruim é um mistério pra mim.
Me encosto na cadeira e o ar que passa pelo meu nariz está com um cheiro doce, bem feminino. Lógico, ela precisa me irritar também somente com a memória de seu corpo na minha cadeira. Suspiro meio deslocado dos meus pensamentos.
Além do drama, é também por isso que eu não trabalho com mulheres. Os pequenos e fascinantes detalhes que fazem delas seres tão interessantes.
Aposto que ela nem imaginou que seu perfume fosse impregnar na minha cadeira e surtar meus pensamentos o dia todo. Mas da forma que eu vejo as coisas, estou condenado a passar um dia sob a tortura olfativa da presença dela em algo meu.
Meus punhos cerram instintivamente.
Ela tem sorte de não ser atraente.
Seus olhos abrem e ela me encontra aqui encostado, perdido em tantos pensamentos de uma só vez que nem tenho uma opinião conclusiva sobre a banda que acabamos de ouvir.
- Tem algumas falhas de execução na música. Mas no geral é boa. - ela diz completamente alheia ao meu desinteresse.
- Boa? Você entende menos de música do que um surdo. - esbravejo, nitidamente mal humorado.
- Surdos entendem de ritmo melhor do que ninguém. - ela observa se movendo até o outro canto da sala.
"Ah ela não vai mexer no meu violão...", antes que eu conclua ela pega o violão do suporte e confere a afinação.
- Riggs. - falo com o coração levemente em choque arrítmico.
Ela volta a música e coloca outra melodia, dedilhando com destreza o instrumento musical. Eu nem consigo escutar direito, só concentro meus olhos em vê-la tocando meu violão.
- É mais ou menos por aí. - ela termina os acordes e me olha.
- Você está tocando meu violão autografado por Paul Stanley. - falo entre os dentes.
- Paul Stanley? - ela arregala os olhos e sorri. - Uau! Eu amo o Kiss!
- Devolva o violão. - grito.
Em vez de fazer o que falo ela dá uma corridinha até a bolsa e pega o celular, me entregando o aparelho.
- Bate uma foto minha com o violão. - ela manda e eu desacredito que isso esteja acontecendo comigo.
- O que eu preciso fazer pra você sumir? - pergunto no limite da minha paciência.
- Ora, vamos, sr. McAllister. Só uma foto. - ela balança o violão e eu tiro a foto, impressionado pela sua falta de respeito (e medo). - Eu toquei um violão que passou pelas mãos de Paul Stanley. Ponto pra mim!
Ela finalmente coloca o instrumento no lugar e volta pegar o celular comigo na mesa.
Ela está descalça. Obviamente está tão à vontade que seus sapatos não são necessários. E isso que estamos somente em seu primeiro dia de trabalho. Daqui uns meses ela vai estar o que? Pelada aqui dentro, certamente.
Ela estica a mão para pegar seu aparelho telefônico e eu o deixo "acidentalmente de propósito" cair dentro do meu copo de água.
Um mergulho perfeito. Nem espalhou água ao redor do copo, nem nada. Ela me olha e fecha a cara.
Assim na proximidade eu consigo notar que sua pele é absolutamente perfeita, parece inclusive que é tão macia que faz meus dedos se esfregarem uns nos outros em curiosidade de tocá-la.
Seus lábios rosados são grossos, entreabertos na surpresa e na exasperação pela minha pequena peça. Tiro seu celular de dentro da água e entrego em sua mão.
- Ops. - digo com um sorriso satisfeito.
Ela me aperta os olhos e vai para longe verificar os danos, mas sinto que mentalmente fui mandado à merda, ao inferno e a qualquer outro lugar ruim. Ela só conteve os xingamentos dentro de sua boca.
- Melhor rezar pro material do celular ser resistente como o da sua saia. - brinco ciente do conteúdo ofensivo da minha piada.
- Tomara. Se for inconstante como seu humor não funciona nunca mais. - ela me remeda inabalável.
Danielle Riggs não tem só o tamanho de uma montanha, ela é a própria.
O interfone toca e Jeremy me informa sobre a chegada de Larissa. Peço que a deixe entrar e ao contrário do que eu imaginei Danielle não demonstra nenhum interesse na presença da musa em minha sala.
Lissa está usando um vestido arrebatador que marca completamente as curvas de seu corpo incrível. Os cabelos estão presos num rabo de cavalo alto e a maquiagem é impecável. Ela sorri pra mim e me levanto para beijar sua boca num abraço rápido.
- Danielle Riggs, minha assistente. - eu apresento como se fosse o anfitrião de um espetáculo.
- Ouvi falar de você ontem durante o jantar inteiro. Mark não conseguia parar de dizer o quanto você é sagaz. - Larissa se dirige a Danielle e a cumprimenta com um beijo na bochecha.
- Mark é ótimo. Almocei com ele hoje. - Riggs responde efusivamente. Fico meio relutante com a ideia de Mark virar o assunto em comum das duas.
- Ele é mesmo. - Lissa fala simpática. - Seja bem vinda, Danielle, não deixe Brandon te açoitar. - ela brinca e Danielle faz uma cara de inquietude. Só Deus sabe o que se passa na cabeça dela nessa hora. Na minha estou com um chicote nas mãos.
- Brandon? Ele não a faz chamá-lo de senhor? Que alívio saber que ele guarda a mecanicidade e completa falta de sentimentos pro trabalho. - Riggs tem um sério problema de verborragia. Penso em encaminhá-la com urgência a um médico.
Larissa ri mais do que deveria e a olho feio.
- Já gostei dela. - Larissa diz pra mim e forço um sorriso.
- Pelo menos um de vocês dois gosta! Uau! - ela exclama, sem nenhum limite. Olho feio pra ela desta vez.
- Vou deixar os dois trabalharem. - Larissa se torna subitamente consciente da tensão no ambiente.
Enquanto ela se afasta eu e Danielle observamos. Sei que estamos olhando e pensando a mesma coisa. Mas me sinto gratificado em ser o titular do corpo de Larissa. Eu gosto de saber e sentir que ela é desejada. Me excita.
Lissa se vira na porta e lança um beijo na minha direção. Eu sorrio.
- Se você soubesse como fica bem melhor assim, sorriria mais. - Riggs observa.
- Quando eu quiser sua opinião, eu peço. - volto ao meu humor ácido e pego o telefone. - Jeremy, Danielle vai te passar uma lista de instrumentos que quer ter no escritório. Providencie.
- Uma lista de instrumentos? - ela me olha curiosa. Eu gosto das expressões que ela faz.
- Assim você mantém suas patas longe dos meus itens colecionáveis. E pode melhorar essa bosta de música que acha que tem potencial. - digo impaciente. "Será que eu tenho que explicar tudo o tempo todo?", começo a perder a pouca paciência que me resta.
- Então está pedindo a minha opinião? - ela sorri. "Cara, nada abala essa mulher?", eu não consigo evitar de sorrir pra ela.
- Somente sobre as músicas. Não se anime! - volto pra minha mesa acomodando as mãos nos bolsos e a vejo ir de encontro a Jeremy lá fora. - Danielle. - falo com meu desdém próprio e lembro dela falando de Mark. - Mark é ótimo! - afino a voz num gesto exagerado para imitar Riggs e sua efusividade. Sopro o ar no "pffff" o mais depreciativo que consigo.

Não demora nem um dia pra que meu escritório tenha até uma bateria estrategicamente colocada no canto onde fica a mesa de reuniões. Riggs me convence a chamar a banda que escutamos juntos, aquela bem ruim, para uma reunião após um novo arranjo para a música.
- Quantos instrumentos você toca? - pergunto exausto, me sentando no sofá e servindo dois copos de bourbon. Ela pega o dela antes mesmo que eu ofereça.
- Piano, cello, violão, contrabaixo e bateria. Embora cello e baixo tenham muitas similaridades. - ela diz colocando os pés sobre o sofá.
- Tire os pés do sofá, Riggs. - ordeno e ela balança o braço pra mim, me ignorando completamente antes de um gole da bebida. - Como conseguiu aprender tudo isso?
- A combinação perfeita entre muito tempo livre na adolescência e uma indecisão crônica. - ela acaricia a própria cabeça e o barulho de suas unhas no couro cabeludo me arrepiam a nuca.
Preciso respirar fundo.
- Eu nunca consegui decidir nada na vida. Deve ser porque meu pai sempre decidiu por mim. Não sei nem se gosto mais de homens ou mulheres. - ela ri e sua voz me aumenta a pulsação.
Estou prestes a ter uma ereção sob o efeito de uma mulher que eu nem desejo e nem gosto. Seu efeito sobre mim é contraditório. Eu começo a sentir o meio das minhas pernas inchar dolorosamente.
Tento pensar na coisa menos sexual que eu consigo. Um atropelamento. Uma tia doente. E ela continua rindo.
- Pare de rir. - grito bravo. Riggs me olha atônita. - Já deu seu horário. Tchau.
- Já inventaram remédio pra bipolaridade, senhor. Você devia experimentar. Um comprimidinho ao dia. - ela se levanta e respiro fundo.
Riggs recolhe suas coisas e se despede de mim. Estou tão concentrado que nem respondo. Quando ela sai eu finalmente relaxo no sofá e estico o corpo. Minha cabeça viaja na voz de Danielle. Um atropelamento. Uma tia doente. Respiro fundo. Pronto. Nenhum sinal de excitação.

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