Capítulo XXV -

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A mulher de cabelos platinados em um tom perolado puro, quase cintilante, preso em um coque desalinhado quase se desfazendo, meneou a cabeça e apontou para a saída da caixa metálica enquanto eu tinha meus olhos completamente fixos na escuridão do suposto cômodo a minha frente. Seria uma armadilha? Afinal, segundo as crianças com que conversamos, aquela seria uma das funcionárias que ajudavam nos procedimentos experimentais. Ainda que não pudesse enxergar o que havia do lado de fora, já que as luzes estavam apagadas, notei Honn sinalizando que eu poderia sair.

— Você não vai entrar? — Questionou a mais velha após mais alguns instantes de completa imobilidade.

— Não tenho certeza. — Minha resposta saiu em um sussurro.

— Imagino que pense se tratar de uma armadilha, portanto, permita que eu vá na frente.

Meus olhos se arregalaram quando ela pareceu ler meus pensamentos, mas no momento em que os pés daquela que chamavam de doutora Charper alcançaram a parte de fora da caixa, todas as luzes se acenderam e minha visão foi preenchida por diversas máquinas e equipamentos tecnológicos desconhecidos, assim como a minha audição foi tomada pelos sons diversos que elas emitiam, como se tudo ali apenas estivesse esperando por nós para começar a funcionar. De fato, era apenas um laboratório.

Não havia decoração no local que sugerisse um tom mais pessoal, mesmo assim era possível notar que a doutora Charper passava muito tempo por ali – a julgar por uma mesinha e uma cadeira ambas voltadas para uma parede branca onde ainda se encontravam restos de algum tipo de comida de fatia triangular em um prato e um copo grande com líquido escuro quase no fim.

O cômodo não estava sujo, embora visualmente estivesse um caos com papéis espalhados sobre as mesas, pranchetas, livros, uma espécie de esquema tridimensional inacabado e peças de aparelhos eletrônicos desmontados bem como ferramentas. Parecia que a mulher pretendia construir alguma coisa e não soubesse exatamente como fazer isso. Ao lado de todas essas coisas também havia os únicos elementos que poderiam dizer algo sobre ela: um cinzeiro com um cigarro com a ponta recém apagada e uma garrafa de algum tipo de bebida aparentemente alcoólica.

Não pude deixar de notar que, definitivamente, jamais havia visto um lugar como aquele na capital Leeland ou em todo o restante do Grande Lizma – mesmo em departamentos do Governo Cupular onde as coisas eram particularmente mais desenvolvidas. Eu estava bastante distraída com as novidades existentes no laboratório e com a quantidade de objetos se movimentanto para todos os lados e simultaneamente piscando, girando, apitando ou tudo ao mesmo tempo, que nem dei atenção a uma outra voz feminina ao meu redor, afinal deduzi que ela viesse de Honn. No entanto, ao assimilar a entonação robotizada e o modo frio com que a doutora Charper dava instruções, percebi que se tratava de uma máquina executando sua função. 

— Preparando procedimento. — Avisou a voz robótica.

A mulher segurou em minha mão, que por instinto puxei de volta para junto do corpo e fiquei a encarando com desconfiança. Ela rapidamente pareceu compreender o que estava acontecendo.

— Ah, me perdoe. Deveria ter explicado que você precisa entrar neste tubo para realizar uma esterilização.

— O que é isso? — Dei alguns passos para trás, na direção da porta da caixa metálica, pronta para fugir se fosse necessário. 

— É só uma limpeza. Garanto que você já passou por coisas mais dolorosas. — Ela respondeu sorrindo como se isso fosse amenizar minha desconfiança. Estava enganada, então: — Mostrarei como funciona, se isso for deixá-la mais tranquila.

Ao ouvir suas últimas palavras, abandonei a postura do susto inicial – lembrando do que Eirie havia me dito uma vez sobre nunca mostrar intimidação – cruzei os braços e fiz um sinal com a cabeça para que ela fosse em frente. A mulher soltou um risinho curto e analasado como se não acreditasse um só instante na minha coragem. Virei o rosto para o outro lado, com certeza enrubescida, quando a vi retirando suas roupas e ficando apenas com as peças íntimas colocando as demais em um compartimento separado.

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