Capítulo XX -

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Uma opacidade preenchia o espaço de um canto ao outro. Por sorte, eu já havia me acostumado com a escuridão. Sabia que ainda não havia amanhecido, mesmo estando alguns níveis abaixo da terra, então a luminosidade repentina acabou chamando minha atenção bem mais do que o fato de não ouvir o som de passo algum pelo recinto, embora ficasse sabendo logo em seguida que haviam chegado pelo menos três pessoas. Cochichavam à espreita. Fui deixando meus olhos se habituarem a luz que irradiava enquanto ainda despertava e também fui conseguindo diferenciar mais vozes com cada frase que ouvia.

— Ale, quem é essa baesyn de cabelos vermelhos? Ela parece familiar, como uma...

— Ignel, ter o cabelo dessa cor não significa que...

— Eles... eles estão dormindo juntos.

Interrompendo a fala de Alexandra, uma nova voz, mais baixa e delicada em um misto de pergunta e afirmação agora vinda uma menina aparentemente um pouco envergonhada, entrou no meu campo auditivo. Despertei totalmente ao escutar esta última indagação, ainda que sem compreender exatamente do que se tratava, girei meu corpo dando de cara com Eirie que ainda dormia serenamente e depois me afastei um pouco desajeitada.

— Todos tivemos que dormir juntos, pequena lady. Sua irmã esqueceu de avisar que só haviam dois colchões.

Ainda meio sonolenta me sentei na beirada do colchão, esfreguei os olhos me espreguiçando e observei duas crianças correndo e se atirando ao pescoço de Philip, que vinha secando o rosto em uma toalhinha qualquer.

— Falha minha.

Alexandra ergueu as mãos, assumindo a culpa de uma forma brincalhona e depois se aproximando de mim enquanto os outros se cumprimentavam calorosamente.

— Passou bem a noite?

— Você quer saber se tive pesadelos com você invadindo a minha mente? Não, não tive.

— Eu não posso dizer que sinto muito. Você precisava ver com seus próprios olhos...

O som de risadas preencheu o pequeno espaço e faz Eirie resmungar tapando os ouvidos com um travesseiro. Nós duas olhamos para ele, mas apenas Alexandra se aproximou e com as mãos brilhando abriu uma pequena esfera de luz rosada que foi tomando forma com os movimentos graciosos de suas mãos. Acompanhei todo o processo, estupefata. Era uma magia totalmente nova para mim, bem mais do que a elemental. Ela duplicou a esfera de luz e retirou o travesseiro de cima dele, colocando uma em cada um de seus ouvidos. Quando elas entraram, o brilho cessou imediatamente e sua agitação também.

— Você enfeitiçou ele?

— Conhecendo Eirie como conheço, posso apostar que ele não teve um bom sono. As esferas podem ajudar.

O olho de relance. Haviam algumas mechas desordenadas de seu cabelo escuro se derramando sob seus olhos, isso lhe dava um ar despreocupado e uma certa serenidade. Não que ele realmente estivesse, mas em minha mente parecia mais fácil imaginar dessa forma do que conceber que por dentro daquela fachada de calmaria, havia caos. Como se eu já não o tivesse visto em ação.

— Por favor, me desculpe pelos meus irmãos. — Volto-me para a garota ao meu lado que mudara de assunto, pela primeira vez, parecia resignada. — Minha mãe não pode descobrir que não os levei para a escola, mas eles insistiram em reverem os garotos e conhecerem você.

Notei o quanto ela parecia desconcertada e receosa de estar sendo invasiva ou como se não quisesse soar como alguém que estava levando seus irmãos para verem algo exótico em exibição. Peguei uma de suas mãos como se a tranquilizasse e ela sorriu de canto.

— Ficarei feliz em conhecê-los.

— Padma e Ignel! Venham cumprimentar Lizlee.

Uma menina pouco mais grandinha e um rapazinho vieram correndo até mim. Os dois possuíam os mesmos cabelos e peles muito claros e os olhos total e profundamente escuros de Alexandra. A menina aparentava ter uns quatorze anos e o menino cerca de uns dez. Suas vestimentas pareciam uma espécie de uniforme, com as faixas verdes amarrando suas capas de cor preta e um brasão bordado com os dizeres "Escola Lanoviense de Artes Místicas".

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