Estava decidida a encarar aquela situação de outra forma. Eu poderia ir procurar os outros Guers-Matriz e deixar Eirie fazer o que ele bem entendesse, contanto que bem longe de mim. Por outro lado, cada dia que se passava mais eu percebia que precisava dar razão as preocupações de meu falecido pai e do tio James – embora ainda achasse que eles lidaram com toda a situação da maneira errada.
Talvez os outros fossem mais maleáveis ou, no mínimo, com um melhor senso de relações diplomáticas. Afinal de contas, a primeira experiência com outro igual a mim só havia me causado medo e dor. E eu me lembro muito bem o que e quem me causara a dor que estava sentindo naquele momento. Eu também sabia que nada e nem ninguém era confiável naquele lugar. Minha tentativa de acordo com Eirie não havia saído muito como o esperado e eu não conseguia parar de pensar que as Divindades haviam cometido um erro ao colocarem a segurança de uma raça inteira nas mãos de dois adolescentes que defendiam ideologias completamente opostas.
Irônicas demais essas Divindades, pensava. O que eu deveria fazer? Será que era possível me encontrar com as Divindades e renegar meus poderes? Ou será que elas poderiam pelo menos mandar um sinal, um caminho a seguir? Incansavelmente tentava encontrar a saída para o problema em que me encontrava e nem percebi as horas se passando. Somente me dei conta da noite perdida quando senti a pálida primeira luz do sol contra a minha pele e a brisa soprando por entre as árvores. Entretanto, apesar da paz e tranquilidade do local, não me deixava enganar. O inimigo espreitava.
— A Lady Desastre finalmente acordou.
Ao ouvir aquela voz pouco familiar, um arrepio percorreu meu corpo. Se ele soubesse que nem havia dormido, faria alguma diferença? Virei levemente a cabeça e apenas avistei um borrão – provavelmente ainda sob efeito do veneno. Forcei a visão um pouco mais para ganhar foco. Do íntimo da minha alma, brotava uma raiva que aos poucos foi tomando conta de mim. Bruscamente me ergui e tentei alcançar aquela figura, que ao meu ver se tornara a personificação de tudo que havia de mais odioso no mundo. Ao correr para ele com a intenção de devolver-lhe pelo menos uma fração do que me causou e descontar a raiva que estava sentindo percebi que não poderia. Minhas mãos estavam envolvidas por luvas de metal e presas por correntes que rodeavam uma árvore.
— O que você fez comigo? — Tentei gritar contra ele. Minha voz saiu fraca e engasgada.
— Te acorrentei. Não é um tanto óbvio? — Ele apontou e revirou os olhos.
— Você é um mau caráter e um covarde que precisou me atacar pelas costas por não ter coragem de me enfrentar.
Tentei erguer a mão contra ele e lembrei que seria impossível esmurrar sua cara, apesar de que era tudo o que eu mais queria.
— Você não me deixou escolha. Agiu com agressividade e recebeu o que mereceu.
— Eu nem te conheço mas sinto que já o odeio.
— É o meu karma, eu causo esse efeito nas pessoas. — Reagiu como se aquilo não fosse nada. Na verdade, ele pareceu se divertir e até riu. Como se odiá-lo fosse um favor que eu o fizesse. — Tentei avisar, mas você subestimou a compaixão do meu Regente.
— Compaixão? Chama tudo o que fizeram contra mim de compaixão? — Ergui as mãos indignada, fazendo com que as correntes se agitassem.
— Você não compreende nada. Apesar de ter nossos poderes, você é um ser medíocre e inferior igual aos Não-Guers. Não merece nem ser tratada como um de nós.
Ele deu de ombros. Eirie, aparentemente como todos os outros Guers, acreditava que eles eram superiores aos demais pelas habilidades que possuíam ou talvez por poder usar essas habilidades para conseguir o que queriam subjulgando os que discordassem. Já eu, achava que tanto uma coisa quanto a outra eram absurdas. Suspirei de frustração e de desânimo após alguns minutos de silêncio.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Legado e Ascensão
FantasyLizlee Deskran é uma garota que nasceu e viveu em Leeland - a capital do novo mundo, conhecido como Lizma - até o ano 6240 (4.180 anos após um fenômeno global, desencadeado por uma sucessão de cataclismos, resultado de armas biológicas e nucleares q...