No dia seguinte, o galo cantou na fazenda ao lado da pousada, o sol entrou no quarto sem ser convidado, e Luccino piscou os olhos, acordando de um sono profundo e muito confortável.
Pela primeira vez em toda a sua vida, por mais estranho que parecesse, ele acordava em uma cama de casal, enrolados a cobertores que não eram seus, com braços ao redor de sua cintura, um corpo grudado ao seu, e uma respiração lenta e calma contra seu ombro.
Nunca que ele se imaginaria naquela situação a meses atrás. E agora, ali estava ele. Querendo fechar os olhos e dormir de novo naquele ninho tão aconchegante.
Mas claro que eles tinham que levantar, nem que fosse somente para dar satisfação para Mariana e Cecília. Suspirando, ele levantou uma das mãos que estavam jogadas sobre seu corpo e a levantou para seus lábios, a beijando de leve, a palma, as costas, cada dedo e cada nó.
- Otávio? – ele murmurou, dando um último beijo em sua mão antes de virar a cabeça. Otávio soltou um barulhinho, um grunhido de fundo de garganta, mas não parecia muito acordado.
Ele era lindo dormindo.
- Otávio, acorde – Luccino insistiu, com um pesar no coração, se virando completamente para encará-lo com muito cuidado para não o machucar. – Otávio.
- O que? – Otávio murmurou de volta, sua voz manhosa e bem baixinha e arrastada. Luccino riu baixinho, acariciando a cabeça de seu amado e penteando seus cabelos desarrumados.
- Nós temos que levantar... vamos? – ele pediu, mas Otávio gemeu baixinho e negou com a cabeça, quase não se movendo.
- Não... – ele respondeu, manhoso, como se fosse chorar. Luccino queria rir ainda mais, mas ele estava muito fofo assim.
- Vamos Otávio. Hoje nós vamos passear pela mata – ele tentou mais um pouco, roubando um beijo rápido dos lábios de seu major e observando quando ele bufou baixinho. – Você não quer ir na cachoeira comigo?
- Quero dormir – ele murmurou, mas sua voz já não estava tão manhosa ou sonolenta, e ele parecia perto de abrir os olhos. Luccino riu baixo e roubou um beijo casto de sua boca, para ver se o animava.
- Por favor, acorda – ele pediu, esfregando seus narizes juntos e observando o sorriso aparecer sob o bigode do major.
- Está bem... está bem – Otávio murmurou, bocejando e piscando os olhos, os abrindo lentamente. – Mas é bom que você me retribua por esse desfeito. Eu estou de férias pela primeira vez desde que entrei no exército.
- Pode deixar. Amanhã eu deixo você dormir quanto quiser – Luccino prometeu, beijando o nariz de Otávio e sorrindo. – Agora vamos nos trocar. Temos que encontrar Mariana e Cecília, prometemos que iriamos mostra-las os arredores.
- E como nós vamos mostra-las qualquer coisa se nem nós mesmo não conhecemos o lugar? – Otávio perguntou, esfregando os olhos e se sentando lentamente na cama enquanto Luccino já levantava.
- Intuição!
- Meninas, estão prontas?! – Luccino perguntou, sorrindo de orelha a orelha enquanto ele e Otávio se aproximavam da mesa na qual Mariana e Cecília se sentavam, aproveitando o café da manhã.
- Estamos consumindo energia para aguentarmos a caminhada – Cecília riu enquanto Mariana os olhou, sorrindo de canto.
- Dormiram bem meninos?
Os dois sabiam muito bem das segundas intenções daquela frase.
- Dormimos sim, obrigado por se preocupar – Luccino respondeu enquanto Otávio se sentava, sorrindo para a garçonete que veio pegar os pedidos.
- Bom dia – ele falou, sempre educado – Eu gostaria de uma média escura e um pão com manteiga na chapa, por favor.
- O mesmo – Luccino completou, sorrindo e se sentando finalmente, sorrindo para as mulheres, que sorriam de volta e comiam um pedaço de bolo e tomavam café. – Hoje, nós vamos explorar essa terra. Estão animadas?
- Nós podemos até estar, mas ninguém está tão animado quanto você Luccino – Cecília comentou, e Luccino riu, sem graça. – O que está te deixando assim, tão alegre?
- Ah... eu nunca saí para viajar antes – ele deu de ombros. – Mas assim, eu estou muito animado para conhecer esse lugar... especialmente se for tão bonito quanto o Otávio disse que disseram.
- Eu só reproduzi o que me contaram – Otávio deu de ombros, trocando olhares com Cecília. – Conseguiu ler algum livro ontem?
- Comecei um sim. Dom Quixote, conhece?
- Sim, sim. O cavaleiro louco. O espanhol – Otávio sorriu, e Cecília sorriu de volta. – As histórias dele são muito divertidas.
- Com certeza! Eu acho as aventuras dele tão incríveis, apesar de bizarras muitas vezes.
- Era por conta da loucura do próprio personagem, que via monstros aonde só haviam moinhos.
- Ah! Um clássico dos contos de Dom Quixote!
Os dois continuaram em sua conversa até depois dos pães e das médias chegarem. Enquanto isso, Mariana e Luccino se distraíam conversando sobre motos, corridas, ou escutando a conversa dos outros dois.
E se no dia anterior, Luccino tinha sentido ciúmes ou raiva daquele encontro de almas literárias, agora ele estava contente que Otávio tinha arranjado uma amiga.
Mas, eventualmente, todos acabaram de comer e a conversa, que estava muito boa, teve que ser adiada para depois que todos se trocassem e ficassem prontos para a caminhada. Assim, Mariana e Cecília voltaram para seu quarto, para pegarem seus trajes de banho, e Luccino e Otávio fizeram o mesmo, os quatro levando uma mochila cada um com os essenciais.
Quando se encontraram na porta da pousada, sorriram um para o outro e saíram com Otávio a frente, com o mapa.
- O treinamento militar vai ser bem útil nesse momento – Mariana comentou enquanto eles seguiam pela estradinha de terra ao redor da pousada. Otávio riu, e a olhou.
- Saiba então que eu me perdi na floresta na maioria dos treinamentos – comentou, fazendo Mariana rir e Cecília olha-lo preocupada.
- Major, tem certeza que quer nos guiar? Talvez Luccino possa... ser melhor em ler mapas? – ela sugeriu, e Luccino se aproximou da leitora, sorrindo.
- É uma aventura, Cecília! Viva a aventura! Depois nós achamos o caminho de volta – ele empurrou o ombro dela gentilmente com o seu próprio, e Cecília riu, mais calma.
- Tem razão. Vamos nos aventurar então! Esqueça esse mapa! Vamos vamos! – ela riu, correndo na frente do grupo e pegando Otávio pelo braço. – Vamos! Aventura!
- C-Cecília! – o major gaguejou, assustado com a reação da moça, que correu floresta adentro sendo seguida por uma risonha Mariana.
- Vamos meninos! Ou querem perder para duas damas?! – ela gritou, seguindo sua irmã por entre as árvores.
- Luccino, elas estão completamente loucas! Nós não conhecemos a região... – Otávio se virou, somente para ver um vulto correndo na direção de Mariana, rindo. – Luccino! LUCCINO!
- Vem major! Chega de pensar, só se diverte! – ele gritou e continuou correndo, e Otávio suspirou alto antes de pegar o mapa e fechá-lo, colocando em sua mochila e saindo correndo atrás dos outros três.
E ali ele sorriu, se deixando sentir aquele medo de se perder, e a curiosidade da descoberta de algo tão simples, mas ainda assim, muito interessante.
E só de ver Luccino sorrindo assim já valia mais do que qualquer outra coisa.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Felizes Para Sempre
RomanceSe havia algo que dona Nicoletta tinha de sobra, era amor de mãe para dar, á torto e à direito. E agora, que todos os seus filhos tinham voltado para casa, e Virgílio tinha sido perdoado por seus feitos, tudo que ela queria era uma grande festa, com...