Sozinhos

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Quando as moças voltaram de seu passeio na cidade, Luccino e Otávio já estavam na mesa, se preparando para jantar, mantendo uma conversa calma. Cecília sorriu, vendo seus amigos, mas Mariana tinha que tirar algo a limpo, e por isso, pediu que a irmã mais nova os desse alguns minutos de privacidade. Cecília, ainda que confusa, aceitou sem esbravejar, e se retirou para o quarto depois de um olá rápido para os homens da mesa, enquanto Mariana se sentava ao lado de Otávio, de cenho franzido, claramente preocupada e levemente irritada.

- Só não lhe dou um esporro porque Luccino me parece um tanto alegre e, portanto, acredito que vocês tenham se entendido – ela disse, firme, antes de pegar as mãos de Otávio nas suas e o virar para si. – Otávio, que ideia foi essa de fugir floresta adentro em plena noite?

- Eu acredito que devo pedir perdão a você também, Mariana – ele falou, honestamente, e suspirou, olhando para as mãos da moça nas suas. – Foi uma reação sem razão lógica, movida a um sentimento que eu não podia explicar. Mas não queria a preocupação de nenhum de vocês...

- Eu sei, meu amigo. Eu compreendo. Mas imagine se algo te acontecesse? – ela replicou, soltando uma de suas mãos e levantando a cabeça de Otávio para olhá-lo nos olhos. – Otávio... você é nossa família agora. Não pode fugir assim. Está bem?

- Está bem, me desculpe – ele sorriu, um tanto encabulado, mas Mariana só sorriu e puxou o amigo para um abraço apertado. Otávio ficou sem reação por um instante antes de abraça-la de volta, suspirando com mais calma e sentindo o afeto que Mariana exalava.

Ela era realmente a melhor pessoa que ele conhecia, depois de Luccino, claro.

Os dois logo se afastaram e Mariana pulou de lugar para ficar ao lado de Luccino, deixando o espaço ao lado de Otávio para Cecília, que chegou logo em seguida, sorrindo. Ela se sentou no lugar vago, sorrindo para os outros três e começando a contar sobre o dia que ela e Mariana tinham passado na cidade, antes de perguntar sobre o dia de Luccino e Otávio. Os dois contaram do dia pacato que tiveram, mas que aproveitaram muito descansando e lendo alguns livros. Depois, eles pediram seus jantares e conversaram sobre o dia seguinte, sobre as possíveis cachoeiras que poderiam ir, as coisas que poderiam fazer, e depois de jantarem, voltaram para seus quartos para se banharem e dormirem até o dia seguinte.

Naquela noite (por precaução própria), Luccino insistiu que ele e Otávio tomassem banhos separados, e ao se deitarem, insistiu que conversassem um pouco antes de dormirem. Ele se manteve um pouco afastado de Otávio, por medo de fazer algo que o constrangesse, mas eventualmente, o sono e a carência falaram mais alto, e quando viram, já estavam aninhados um contra o outro, conversando sobre as coisas mais diversas possíveis. Sobre a viagem, sobre a razão da viagem, sobre Brandão, sobre Mariana, sobre Cecília, sobre casas, sobre filhos, sobre animais e cachoeiras.

E depois de conversarem tanto, ficaram em silêncio, e Luccino colocou seu rosto contra o peito de Otávio, enquanto Otávio deixou seu rosto se emaranhar nos cabelos cheirosos de Luccino.

Abraçados, acabaram por dormir, um sono tranquilo e quieto, que realmente trouxe uma paz para ambos, até que o dia clareou e eles acordaram, sem qualquer pressa.

E quando se encontraram com as garotas novamente no café da manhã, decidiram seguir para uma terceira cachoeira um pouco mais próxima da pousada, que era mais frequentada que as outras. O dia estava um tanto sombreado, então nenhum deles acreditava que encontrariam muita gente na cachoeira, e todos já tinham concordado em um banho de chuva caso a água caísse do céu.

Assim, pegaram suas coisas (e deixaram os livros na pousada dessa vez) e seguiram para a cachoeira, chegando até ela em pouco menos de vinte minutos de caminhada.

Como tinham esperado, o lugar estava vazio, o céu estava acinzentado, e a água estava um tanto escura por conta da falta de sol, mas tudo era lindo mesmo assim. Eles abriram seus panos no chão, colocaram as cestas de comida sobre eles e se sentaram para conversar um pouco antes de Luccino pular na água que estava particularmente muito fria naquele dia sem sol.

Os quatro conversaram por um longo tempo, contando histórias, inventando contos e dividindo opiniões, tudo na maior calma e serenidade, causada por seus pensamentos parecidos e o lugar aonde estavam. Beliscaram algumas frutas que tinham trazido, contaram piadas, brincaram de mímica, e riram muito juntos, até o horário do almoço se aproximar.

Foi então que Cecília se lembrou de algo, e quis voltar para a pousada, a fim de ligar para Rômulo e conversar com ele sobre algum assunto sério para ela, e que parecia não ter importância nenhuma para Mariana. Ainda assim, as Beneditos voltaram sozinhas, deixando Luccino e Otávio sozinhos na cachoeira.

- Honestamente, eu acho que já ficamos mais sozinhos durante essa viagem do que junto com elas – Luccino comentou, sorrindo enquanto se aproximava de Otávio, que dava de ombros e sorria de volta para ele.

- Talvez... talvez sim, talvez não. Não me importa muito – ele admitiu, colocando uma de suas mãos sobre a face de Luccino e o trazendo para perto, roubando-lhe um beijo casto. – Eu gosto de ficar sozinho com você.

- E você acha que eu não gosto? – Luccino replicou, se inclinando novamente e também roubando um beijo de Otávio. – Eu adoro ficar sozinho com você. Ficaria por todos os anos da minha vida, e nunca enjoaria.

- Que bom. Porque eu sinto o mesmo – ele murmurou, puxando Luccino para outro beijo, lento e delicado, que transmitia muito amor e muito respeito da parte de ambos. Parecia que da noite para o dia, a relação entre eles tinha evoluído anos. Os dois se sentiam muito mais sóbrios agora, muito mais integrados, trabalhando no mesmo ritmo.

Era um amadurecimento que nem eles entendiam, mas gostavam. E muito.

Quando se separaram do beijo, suspiraram, suas testas coladas, e Luccino abriu os olhos, um sorriso brincalhão em seus lábios.

- Vamos dar um mergulho?

Otávio suspirou imediatamente.

- Luccino, não.

- Vamos por favor!

- A água deve estar trincando de gelada, eu não vou entrar.

- Por favor!

- Não!

Enquanto discutiam, em meio a risadas e bufadas, não perceberam que alguém se aproximava novamente, voltando para buscar um pedaço de sua roupa que tinha ficado no lago.

Os dois já estavam de pé quando se aproximaram, e Luccino ria abertamente, puxando Otávio na direção do lago enquanto o militar impedia o movimento, puxando Luccino para si, longe do lago. Foi só questão dos pés de Luccino escorregarem sobre uma pedra solta que ele foi levado até Otávio, e segurado pelo mesmo, que sorria.

- Viu? Nem a natureza te quer no lago – ele falou, antes de puxar Luccino para um novo beijo, no qual o mecânico retribuiu sem segundos questionamentos, colocando suas mãos no pescoço do militar.

Os dois só se separaram ao ouvirem passos altos se aproximando, e imediatamente se viraram, afastados, encarando a chegada da cachoeira.

Mas já era tarde.

Mariana chegava afobada, correndo, mas Cecília já estava lá.

Ela já tinha visto tudo.

E parecia estar vendo um fantasma de tão branca que estava.

- Cecília! – Mariana gritou, correndo até a irmã mais nova, enquanto Luccino e Otávio não sabiam o que fazer, para onde olhar, como reagir.

Então, os três ficaram se encarando enquanto Mariana se aproximava.

E Otávio tinha certeza que naquele momento, tinha perdido a amiga que tinha feito em tão poucos dias.



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