12 - Feridas

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Para meu azar, Elisa estava com cólicas horrorosas. Completamente indisposta para fazer qualquer coisa que não envolvesse estar estirada no sofá. Que decepção, a minha ideia de juntar os dois teria que esperar.

Chamei Isabel para ir com a gente, mas ela já tinha planos com o Pedro. Ela sugeriu irmos os quatro. Encontro de casais?! Não, obrigada!

E se eu ligasse para o John e dissesse que também estava com cólicas? Ponderei seriamente sobre fazer isso, mas... Que ridículo! Não seja medrosa, Alma! Quando foi que eu me tornei tão covarde? Não é um encontro! Eu vou sair com um amigo e a gente vai se divertir. Só isso.

Peguei um elástico dentro da gaveta e... a ponta da caixa de veludo que continha uma pulseira exótica apareceu. Enfiei ela mais para o fundo. Droga de Gael Ávila! Ele tinha mesmo me obrigado a guardar aquilo. Era isso ou a minha mãe continuar abrindo a porta para ele.

— Imbecil. — grunhi e fechei a gaveta com força.

Prendi o cabelo em um rabo de cavalo, peguei a minha bolsa e avisei aos meus pais que já estava indo e não voltaria muito tarde.

Subi as escadas para o terraço, ainda faltava um pouco até o horário marcado e eu pretendia arriscar uns passos de dança enquanto isso. Me ajudava a relaxar. Abri a porta que dava acesso ao espaço aberto e fiquei paralisada por aquele olhar.

O verde-dourado estava lá em cima. O olhar gélido e colérico que Gael me lançou me fez encolher. O maxilar estava trincado e o rapaz me olhava sem nenhuma hesitação. Nada de melindre ou vacilação. Não. Direto e furioso. Era evidente que a raiva era direcionada a mim. Mas eu não fiz nada para ele! Juro! Não fiz nada!

Eu já estava desistindo da ideia de dançar e pensando em voltar para casa quando Gael se desencostou do parapeito e veio andando com passadas firmes sem tirar os olhos de mim. A hostilidade exalava da sua linguagem corporal. Ele passou por mim cuspindo fogo pelos olhos, mas completamente em silêncio... e foi embora. Eu esperava que ele fosse bater a porta com tudo, num estampido seco, mas o objeto se fechou com suavidade.

Sozinha no terraço, percebi estranhamente que já não estava mais com tanta vontade de dançar. Além da raiva o verde daquele olhar exibia boa parte de mágoa. Mas por quê? O meu coração corria apressado dentro do peito sem explicação. Eu sabia que ele achava que nós dois ainda estávamos conectados, mas nós não tínhamos mais nenhuma ligação. Será que ele esperava mesmo que eu usasse aquela pulseira?

Mais uma vez me senti como se estivesse em dívida. Como se eu estivesse sendo uma pessoa ruim, simplesmente por não ser mais a mesma pessoa de antes. Eu me sentia culpada e nem sabia explicar isso direito.

É errado mudar? É errado seguir em frente? É errado não amar mais uma pessoa? É errado deixar alguém para trás? Eu não sou mais a pessoa que ele conheceu. Por que ele não podia aceitar isso?

Me virei num rompante e cobri o pouco espaço que me separava da porta. Abri o objeto bruscamente.

— Você não está sendo justo! — disparei para o rapaz que estava no meio do caminho escada abaixo. Ele estacou no lugar. Ficou ali parado por alguns segundos, então virou o rosto, me olhando por cima do ombro de olhos semicerrados.

Eu não estou sendo justo?! Eu?! — me encarou, desafiando-me a prosseguir.

— Não é minha culpa!

Ele subiu tão rápido as escadas que quando eu pisquei as esmeraldas já estavam bem na minha frente.

— E é minha? — parado dois degraus abaixo de onde eu estava, nós dois ficávamos à mesma altura.

Noite Sombria | 3Onde histórias criam vida. Descubra agora