Eu estava me arrumando para ir para a casa de Luísa quando Clarisse me ligou chorando. A desgraçada da mãe dela que fez ela sofrer tanto na adolescência, foi encontrada morta por overdose. Porém, mesmo de um jeito torto, era mãe dela e ela estava sofrendo.
Desde a infância, Clarisse nunca recebeu amor da família. Os Montenegro eram uns filho da puta e eu agradecia a Deus por não carregar esse nome nos meus documentos.
Quando criança a mãe deixava ela comer qualquer porcaria porque nunca cuidou dos filhos e Clarisse ficou acima do peso. Na adolescência ela sofreu abuso psicológico da mãe porque não conseguia ser magra como a irmã.
A mãe queria que as duas fossem modelo, mas só a mais velha tinha estatura e peso para isso. Além disso, Clarisse sempre gostou de cantar, mas a mãe sempre dizia que ela não ia passar duma contorna de boteco.
Foi numa das brigas entre as duas que Clarisse foi me procurar. Com os anos nos tornamos uma família. Clarisse era como uma irmã para mim.
Quando Clarisse me ligou com a voz chorosa eu não pensei em mais nada a não ser pegar o carro e ir até ela. Eu temia que ela fosse capaz de fazer alguma besteira.
Conheci a minha prima quando ela estava um caco. Ela não confiava em sí mesma, não gostava da sua imagem apesar de ser linda e não era aberta a se relacionar com as pessoas. Também tinha muitas marcas de automutilação.
Eu queria distância de qualquer Montenegro, mas quando ela apareceu eu tive o instinto de protege-la como se fosse uma irmã, uma filha. Éramos dois renegados e quando Luísa foi embora, ela me ajudou a passar pelos dias sombrios.
Hoje, ela não se cortava mais e fez tatuagem em toda o quadril para cobrir as marcas. Nos braços ela tinha alguns sinais quase imperceptível. Mas, com o choque da perda da mãe, eu temia que ela tivesse uma recaída.
Quando cheguei na kitnet que ela estava morando, vê-la sentada no chão com o cabelo bagunçado e olhos inchados me partiu o coração. Meu coração bateu acelerado quando a vi com uma faca na mão.
_Clarisse, eu estou aqui. Me dê essa faca._ eu falei abraçando ela e procurando sinais de corte ou sangue.
_Ela não merece que eu sinta dor. Ela não merece que eu faça mal a mim._ ela falou me entregando a faca.
_Vamos sair daqui._ eu ajeitei seus cabelos._ Onde você quer ir?
_Eu quero ir no enterro.
_Você tem certeza?_ eu não achava que era uma boa ideia, nem queria ver aquela família, mas se ela precisasse disso eu a levaria.
_Tenho. Mas, você não precisa ir.
_Clarisse, você só tem a mim de família._ ela concordou com a cabeça._ Eu vou com você.
_Você é meu irmão, Ruan. Eu sei que você sempre estará comigo. É só que acho que eu tenho que enterrar todo o meu sofrimento junto com o corpo dela.
_E eu estarei com você quando fizer isso._ falei firme e ela concordou.
_Vou tomar um banho e dormir. Pode ir para sua casa, se quiser. Venha me buscar pela manhã.
_Eu ficarei aqui mesmo. Se precisar de mim, me chame.
_Tá bom._ ela me deu um beijo no rosto._ Obrigada, Ruan.
Mandei uma mensagem de texto para Luísa pedindo desculpas por não ter ido a casa dela, mas não houve resposta. Ela devia está dormindo ou ficou magoada.
No outro dia, já em Santos que era onde a mãe dela morava, ficamos em frente ao cemitério no carro. Clarisse não quis comparecer ao velório, apenas iria esperar pelo enterro. Mas, quando ela viu os parentes chegando, ela desistiu e mandou que eu tirasse ela dali.
Não questionei e dirigi até Campinas, para a casa da minha mãe que havia se tornado uma mãe para a Clarisse também. Chegamos exaustos da viagem, mas minha mãe logo animou a Clarisse e a convenceu ficar com ela por uns dias.
Voltei sozinho para São Paulo na sexta feira de manhã, mas Clarisse voltaria a tarde porque tinha apresentação em um bar. Ela sempre gostou de música e aprendeu a usa-la para extravasar seus sentimentos.
Luísa não atendeu nenhuma das minhas chamadas na quarta, então resolvi dar espaço a ela. Eu iria resolver nossos problemas pessoalmente, pois assim ela não seria capaz de fugir.
Nós ainda não havíamos nos acertado de fato. Luísa me disse que não queria relacionamento, mas eu sabia que ela queria a mim.
No começo, eu jurei que não deixaria ela me abalar. Pura ilusão. Eu a quis no momento exato que ela subiu no palco no dia da inauguração. E a forma como ela me olha diz que ela também me quer.
Então, quero recomeçar do zero com ela. Esquecer o passado e conhecer a nova mulher que ela se tornou. Mas, Luísa é como água. Parece que a todo momento ela vai escorrer pelos dedos e ir embora.
Quando cheguei na empresa, não a vi por lá. Leandro me disse que ela não aparecia por lá desde quarta porque estava na empresa do Albuquerque.
E por falar em Albuquerque, aquele velho seboso quase engoliu a Luísa no dia da reunião. Mas, o que me preocupava é que Elisa me pediu para investigar umas coisas erradas na empresa do pai dela. Ela suspeitava que ele estivesse envolvido com políticos corruptos, mas eu ainda não tinha nenhuma prova concreta a não ser umas reuniões que ele não deixava nem um de seus advogados participarem. Se houver algo podre e vier à tona, todos os que trabalham na empresa podem ficar com a imagem comprometida e eu quero poupar Luísa disso. Por sorte, ela não aceitou a proposta dele de imediato.
Passei no escritório de Elisa para acertar umas coisas de trabalho com ela. Bati na porta e ela me atendeu.
_Oi, Ruan. Entre!
Passei pela porta e me sentei na poltrona.
_Elisa, quero um favor seu._pedi.
_E esse favor se chama Luísa?_Concordei._ Tem total ajuda.
_Pode sair com ela para algum lugar hoje?
_Posso e vou. Marcamos salão hoje porque amanhã eu vou viajar com o Leandro e lá posso propôr a ela de irmos na mesma boate daquele dia.
_Ótimo. Só não deixa aqueles filhinhos de papai ficarem em cima dela._ pedi lembrando da outra vez que tive que arrancar um sanguessuga gringo de cima dela.
Elisa começou a rir do meu pedido.
_Acho linda a historia de vocês. Parece um romance de filme.
_Bem dramático mesmo._ concordei._Era isso, Elisa. Obrigado.
_Não achou nada ainda?_ ela perguntou sobre o pai e eu neguei._ Acho que é só cisma minha. Mas, continua buscando. Eu não vou deixar meu pai afundar a empresa da minha mãe.
_Pode contar comigo.
Me despedi e voltei ao meu trabalho. Eu estava contando os minutos para a noite chegar. Uma ajudinha dos amigos e eu iria quebrar o muro que Luísa ergueu ao redor do coração.
Se os meus planos dessem certo, hoje a noite prometia.
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DE VOLTA PARA MIM. (CONCLUÍDO)
RomanceApós uma decepção traumática quando Luísa ainda era apenas uma adolescente, seu coração fechou-se para o amor. Oito anos depois, o destino lhe prega uma peça colocando-a cara a cara com seu amor do passado, abalando as estruturas da mocinha. Será q...