04:38 da manhã, Domingo
O silêncio absoluto que tomava o quarto não era em nada reconfortante, porém também não era de todo ruim, era apenas silencioso e vazio. A quentura que Willian passava, apesar de reconfortante, também era, de certa forma, fria, pois fazia o desolamento e a realidade se tornarem muito mais nítidos e plausíveis. O cheiro agora familiar de seu corpo inundava a cama, os lençóis e os travesseiros contaminando o ar como veneno mortal, e Ethan se encontrava sentado na cama ao seu lado o encarando com atenção enquanto era lentamente intoxicado por aquele cheiro pungente no ar, o observando em seu sono, percebendo o quão bonito ele era. Dolorosamente bonito.
O garoto parecia tão singelo e calmo, tão inalcançável. Sua respiração pesada fazia cócegas em suas coxas, pois seu rosto estava perigosamente perto de suas pernas. Aquele pensamento fez um arrepio subir por sua coluna. Os lábios de Willian eram realmente rubros e macios, lhe convidando a saboreá-los, seus longos cílios tremeram levemente quando ele suspirou em seu sono, talvez por estar sonhando com algo. Ethan podia ver seu peito subir e descer com a respiração pausada de seu sono, a pinta que o garoto tinha no pescoço, a qual ele achava tão charmosa, estava à mostra e suas clavículas eram visíveis, o que ele achava muito atrativo.
Ethan podia notar que apesar dos músculos o garoto era esbelto, com traços sofisticados e músculos cuidadosamente trabalhados; já havia percebido aquilo antes, mas nunca tivera realmente a oportunidade de observá-lo com detalhes e de tão perto enquanto ele estava com a guarda tão baixa. Notou que os cabelos dele estavam maiores do que quando o tinha visto pela primeira vez no colégio. Por esse motivo agora viviam desgrenhados, lhe dando um ar merecidamente rebelde que parecia fazer muito mais jus a ele do que os fios curtos e arrumadinhos. O garoto também parecia diferente, de alguma forma. Sua aura parecia mais distinta, talvez porque agora já o conhecia melhor. Ele já não parecia mais o garoto certinho que conhecera e também já não era assim tão misterioso como aparentava ser no início.
Com o passar das horas, os primeiros raios de sol começaram a entrar pelas brechas da cortina deixando o quarto com sombras, dando a Ethan o lembrete de que finalmente amanhecera. O garoto então se levantou com cuidado para não acordar Willian e saiu da cama lentamente pegando a primeira roupa que viu, que se encontrava jogada em um canto do quarto escuro, próxima as malas. Willian não se moveu um centímetro. Honestamente, Ethan não pensou muito no frio da manhã, apenas saiu do quarto em seus jeans simples, blusa de manga longa e chinelos, descendo as escadas cauteloso enquanto pensava em como chegar até a cozinha e roubar alguma coisa da geladeira sem ser flagrado. Sua barriga roncava loucamente, tanto que era difícil se concentrar em mais alguma coisa que não fosse comida.
Ethan se aproximou do cômodo iluminado pela luz matinal sem muita cerimônia, afinal não achou que teria alguém de pé tão cedo, e por esse motivo se assustou ao se deparar com um par de íris verdes muito intensas lhe encarando de não muito longe. A pessoa estava sentada em uma das cadeiras da mesa tranquilamente comendo algumas torradas. Ethan engoliu em seco encarando o Sr. Clifford, que comia confortavelmente enquanto, ao seu lado, um pequeno rádio tocava música clássica baixinho.
O garoto paralisou onde estava, sem saber o que fazer, e sua boca secou ainda mais quando o homem lhe lançou um olhar penetrante, como se o convidando a se aproximar, mas com a leve ameaça inclusa de que era melhor se aproximar, e Ethan não conseguiu o ignorar, saindo de seu transe e caminhando como se pisasse em vidros até estar ao lado do homem, tenso como uma estaca fincada ao chão. O homem porém parecia muito à vontade e até levemente divertido com sua reação de óbvio nervosismo.
— S-Senhor... n-não achei que já tivesse alguém acordado a essa hora.
— Não consegui dormir... — fez uma breve pausa onde limpou a garganta, sua voz soava rouca, cansada. — Às vezes é difícil ignorar a dor.