26 - Eu Quero Você Hoje a Noite

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O ar gélido lá de fora nem se comparava ao clima horrivelmente frio que pairava dentro da casa. Apesar do aquecedor estar ligado, a sala estava mais fria que nunca. A tensão ao redor da mesa era quase sufocante e Willian não podia dizer que estava surpreso, afinal já esperava por aquilo no momento em que resolvera ir até ali. Sabia também que no momento em que decidiu levar Ethan consigo, tinha que estar preparado para lidar com a mãe, pois sabia o quanto ela podia ser maldosa quando queria e sabia que ela não deixaria passar o fato de seu novo amigo ser um garoto famoso.

Willian queria desesperadamente sair daquela mesa, sentia-se sufocado. Era difícil respirar o mesmo ar que aquelas pessoas, só estava aguentando mesmo por causa de seu avô, afinal era por ele que estava ali, e também porque Ethan não tinha comido nada o dia inteiro e parecia realmente faminto, mas o pobre garoto parecia tão desconfortável na presença de todas aquelas pessoas desconhecidas, que nem sequer tinha tido a chance de tocar em sua comida. Ainda tinha o fato, é claro, de que sua mãe não o deixou em paz desde o momento que haviam sentado à mesa, o que só piorava a situação.

Ela, como sempre, havia falado coisas totalmente desnecessárias e maldosas, o fazendo desconfiar que suas palavras tinham magoado o garoto. Ele, porém, havia ficado um tanto surpreso com a reação de Ethan, afinal o garoto nunca havia demonstrado se importar com aquilo antes e nunca tinha tentado esconder dele.

Quando Willian finalmente terminou de comer o que tinha em seu prato, engolindo como se tentasse engolir pregos — de tão chateado que se sentia com todo o falatório da mulher — olhou para seu avô e este olhou dele para Ethan fazendo gestos para que eles saíssem, então apenas agradeceu silenciosamente, ergueu-se e pegou Ethan pela mão levando-o para fora daquele lugar.

Não queria que ele lhe visse daquela forma, tão pouco que visse o quão ridícula era a sua família. Sentia-se tão irritado que temia tratá-lo mal, então resolveu mostrá-lo seu lugar favorito ali, o lugar onde se escondia para fugir das brigas entre seus pais e também de seu irmão, que sempre se negava a brincar com ele e na maioria das vezes lhe ignorava ou dizia coisas cruéis para afastá-lo.

Willian puxou Ethan pela mão sem nem mesmo perceber o que fazia, apenas queria chegar logo lá, pois era o único lugar que lhe acalmava quando estava ali. Quando finalmente alcançou o caminho de terra e grama amarelada, enfeitado com folhas secas e desgastadas, já estava completamente escuro e a meia-lua daquela noite já ia alta no céu. Ao sentir o cheiro familiar de terra e grama morta, sentindo o vento refrescante que lhe avisava que o lugar estava perto, o garoto sentiu o peito apertar por um momento com a sensação de nostalgia que lhe atingia com força. Ethan lhe encarava com dúvida e uma pitada de irritação nos olhos cinzas quando finalmente pararam, mas Willian anunciou que haviam chegado ao seu destino e o guiou para o lado afastando-o das árvores que lhes cobriam a visão e ouvindo com satisfação o suspiro de admiração e incredulidade do garoto.

Era exatamente aquela sensação que tivera ao descobrir o lugar, depois de sair correndo após uma briga com seu irmão — talvez uma das últimas que tivera. Willian descobriu também que seu avô fora quem construiu aquele espaço. Um pequeno paraíso dentro do inferno que era aquele lugar. O garoto guiou Ethan até o banco do observatório já sentindo-se leve. Quando estava ali era como se seus problemas e medos desaparecessem, pelo menos, momentaneamente. A brisa fria que soprava em seus cabelos fazendo-os esvoaçarem, apesar de gélida, não era em nada desagradável, do contrário, parecia trazer esperança de dias melhores. Pelo menos foi o que sentiu de início, mas agora também possuía uma aura sépia de nostalgia envolta em melancolia, pois sem seu avô, nada daquilo fazia sentido.

Ele continuou pensando nisso por mais alguns momentos, até virar para o lado e seus olhos se fixarem no rosto enternecido que Ethan mostrava. Com uma expressão tão serena no rosto jovem e belo do garoto, era quase impossível não se sentir contagiado com o sentimento de satisfação por ter a oportunidade de estar ali. De ser capaz de ver um céu tão belo como aquele ao lado da pessoa que amava. Sim, naquele momento sentia-se abençoado e grato por ser quem era, mesmo dentro do turbilhão de problemas que era sua vida.

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