Degustação

3.8K 135 69
                                    

— Você não deveria ter voltado

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

— Você não deveria ter voltado.

— Eu não voltei por você!

— É claro que não foi por mim. — Pedri me encarava com uma mistura indecifrável no rosto. Seria raiva ou tristeza? Eu não queria fazer parte disso, de todo caso. Ele quem me arrastou para esse encontro de mentira pensando que as coisas se resolveriam em minutos de conversa. — Você só pensa em si mesma, Alexia.

Em mim? Sério?

Ele achava o quê? Que eu esqueceria de tudo assim? Na maior cara de pau? Eu não fiz curso de teatro para conseguir fingir que o nosso passado ainda não doía. Já se passaram anos e a cena da última vez que nos vimos continuou, infelizmente, impregnada na minha memória.

— Você fala como se a culpa tivesse sido minha.

— E não foi? — o encarei fixamente enquanto sentia a distância entre nós diminuindo. — Você quem fodeu com tudo. Todos os anos de confiança se acabaram por causa da sua imprudência.

— Minha imprudência? — apontei para mim mesma. — É sério isso, Pedri? Você vai mesmo jogar a culpa em cima de mim?

Não, de jeito nenhum eu assumiria esse barco sozinha!

— Eu não vou ficar aqui escutando você me acusar de uma coisa que você fez. — apontei enfurecida. — Eu vou embora!

Nós estávamos no meio de uma das ruas da cidade enquanto a chuva encharcava os nossos trajes de gala. A roupa social que ele usava dava a impressão de estar mais pesada agora, com o terno escuro e muito bem alinhado colando nos músculos que não existiam no período da escola. A barba rala e o porte de homem mostravam a diferença do menino rico que eu havia me acostumado a brincar e a confidenciar segredos.

Mas as coisas haviam mudado. Ele estava diferente. Pedri González não era mais o mesmo. Não só fisicamente, mas na maneira de agir também. Ele desviou a atenção para o lado e mesmo com a intensidade forte das gotas de água, pude captar as mãos sendo levadas ao quadril, com a nítida negação em sua expressão facial.

— Você vai me deixar de novo?

De novo? Do que ele.....

— Por que é tão difícil de entender que eu nunca faria nada que te machucasse?

Engoli em seco, processando o significado daquelas palavras.

— Porque você já fez isso uma vez.

— Isso não é verdade.

— Pedri.

— Por acaso você se esqueceu do que fez comigo? — a voz ficava cada vez mais perto. — Depois de todos esses anos você ainda continua fazendo estragos na minha cabeça, Alexia. Esse é o poder que você tem sobre mim.

— E eu ainda estou aqui! — me virei, esbravejando e percebendo que a minha intuição estava certa em sentir que ele ficou mais próximo. Pedri me observava agora a poucos centímetros do meu corpo e eu nem sentiria vergonha se ele notasse as minhas lágrimas se misturando com o temporal. — Depois de todos esses anos eu simplesmente não consigo te odiar! Esse é o poder que você tem sobre mim, Pedri! Para de falar que eu estraguei tudo!

— É a verdade! — ele gesticulou. Os cabelos pretos se encharcavam da mesma forma que os meus estavam estirados pela água. — Não tem reconciliação no mundo que nos faça voltar como era antes!

— Eu sei!

— Então por que você não consegue me odiar?

— Porque eu te amo!

Que coisa! Como ele nunca percebeu isso?

— Você acha que eu não queria te odiar? — o empurrei entre socos no seu peito. — Eu sei que não damos certo. Desde a época do colégio você só me via como uma melhor amiga e nada mais. — continuei com a série de raiva mesmo que ele não fizesse questão nenhuma de me parar. — Sempre esteve na nossa cara que nunca passaria disso. Você se lembra do que todo mundo falava?

Pedri abriu levemente a boca, mas não proferiu nada.

É claro que ele se lembrava. A menina pobre sendo amiga da promessa do Barcelona. O que ele estava pensando ao andar com ela? Ela o obrigava ou o chantageava com algum segredo?

Vai ver eu também não estava pensando direito sendo amiga dele.

— Isso precisa de um ponto final.

— Eu sei. — concordei, suspirando com força para recuperar o fôlego de antes. — Acabou, Pedri. — então passei a mão no meu cabelo e o ajeitei para trás. — Acabou. Definitivamente acabou. Eu não conheço você e você não me conhece. Fim.

Seria algo impossível o vendo diariamente?

Não sei.

O importante era que eu iria fazer de tudo para ter as engrenagens desse esquecimento funcionando.

Nos fitamos por alguns segundos e quando fiz a mesma ação em seguir para o caminho oposto, senti a mão dele me puxando e me obrigando a retornar para o meu exato lugar de origem, nem dando tempo para processar quando os lábios de Pedri beijaram agressivamente os meus. As mãos foram por baixo dos meus cabelos, a sensação começou a queimar no meu peito..... E eu até tentei empurra-lo no início, me negando a compactuar com a minha vontade cuja era a mesma que a dele, porém se tornou novamente uma coisa difícil para o meu sistema recusar. As nossas bocas entraram em sincronia e aos poucos, Pedri consegui trocar o peso da balança com a fúria temporária para o gosto da saudade.

E isso era ruim, não era? Eu queria tanto dizer que sim. Queria tanto esquecê-lo de uma vez e voltar para a minha vida onde eu o via apenas nos jogos da minha televisão.

— Eu te amo. — ele se afastou, permanecendo com o rosto próximo do meu. — Mas você não deveria ter voltado.

Sim, eu sabia. Eu também não queria ter voltado. Fazia tanto tempo. Os segredos..... Os momentos..... Ele sabia de muita coisa minha e eu sabia de muita coisa dele. Quando abri a boca para perguntar o motivo, o meu queixo foi erguido para olhá-lo com plena atenção.

— Você me assombrou por tempo demais, Alexia. — senti os dedos acarinhando a minha bochecha, completamente diferente da seriedade que os olhos escuros do jogador esboçavam. — Agora é a minha vez de assombrar você.

— Pedri.....

— Fique avisada. — e logo toda aquele sentimento de melancolia se transformou em algo diferente. Algo novo. Mais vivo. Eu não me lembrava de tê-lo visto alguma vez desse jeito. — Eu não vou pegar leve com você igual na escola. — ele apontou. — Você cometeu um erro.

Não, não, não! Eu não fiz nada! Por que ele......

— E nada mais justo que comece a pagar por ele.

Glitch • Pedri GonzálezOnde histórias criam vida. Descubra agora