24. Alergia a agulhas.

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Emma e Joel realmente haviam saído cedo. Tão cedo que nem os vi pela manhã. Quando acordei encontrei um bilhete colado na geladeira pedindo para que eu recebesse uma encomenda que chegaria entre hoje e amanhã.

Fui para a faculdade e depois para o hospital. Felizmente, fomos dispensados mais cedo por causa de um surto de Cólera no hospital. Em nosso contrato quando estagiamos está bem explícito de que quando há uma doença contagiosa ou algum surto de doença no hospital, não podemos permanecer nele porque, legalmente, não somos parte dos funcionários e nem somos pacientes.

Cheguei em casa por volta das quatro da tarde. Zabdiel chegaria somente daqui duas horas. Mandei mensagem avisando para ele vir direto para o apartamento, senão ele passaria no hospital e teria perdido a viagem.

Ficar com ele três dias seguidos, dormindo e acordando juntos me pareceu uma boa ideia no começo. Não que agora não seja, mas é que pensei em mil e uma coisas que poderiam acontecer. E se descobríssemos que não temos mais aquela química de antes? E se algum assunto surgir e discutirmos? E se ele voltar a falar de Matthew? E se Matthew aparecer?

Minha cabeça parecia um circo atrapalhado, naqueles em que os macacos tocam pratos irritadamente o tempo todo. Então, tentava arranjar respostas simples para todas as questões que estavam me assombrando.

É Zabdiel, somente ele. Se brigássemos, minutos depois faríamos as pazes, como todas as outras vezes. Se ele quiser falar de Matthew, vamos falar, afinal ele é meu amigo agora. E caso ele apareça, também, mesmo achando muito difícil essa ultima parte já que quando contei que Zabdiel ficaria comigo durante esses dias Matthew rolou os olhos e bufou, resmungando de que "ele realmente tinha voltado".

Pensei em cozinhar algo para o jantar, mas o sofá me parecia tão confortável. Tomei banho e depois passei as últimas horas jogada nele assistindo Friends. Mal percebi quando o sol de pôs e a lua apareceu.

No meio de um dos episódios ouvi o interfone tocando. Levantei e atendi. Era Zabdiel. Sua voz parecia tão animada que me fez sorrir no mesmo instante.

Segundos depois ele estava batendo na porta. Quando abri, a figura que estava apenas na minha imaginação se fez presente em minha frente. Um Zabdiel um tanto quanto animado e sorrindo para o vento. Estava com uma mochila nas costas, o que me fez olhar engraçado pra ele.

Dei espaço para ele entrar, mas antes de fazer isso Zabdiel se inclinou e me deu dois selinhos, um em seguida do outro.

Só depois dele jogar sua mochila no sofá pude reparar um pouco mais. Estava com uma calça jeans larga, uma camiseta preta e com um boné virado para trás. Ele parecia ter dezoito anos vestido assim, ainda mais com aquele sorriso bobo no rosto. Não reparei, mas tinha ficado parada na porta olhando para ele e rindo sozinha.

— Sentiu saudade? — ele perguntou, depois de perceber que eu não parava de o olhar.

— Eu? Quase nenhuma. — brinquei, fazendo-o me olhar com os olhos semi cerrados.

Depois disso ficamos no sofá por mais uma hora porque havia esquecido que Zabdiel também gosta de Friends. Acabamos assistindo mais alguns episódios. No meio do último, parei de prestar atenção no que estava na TV. Minha atenção foi totalmente voltada e paralisada em Zabdiel e naquela situação.

Ele estava quase deitado no sofá, apoiava a cabeça em seu braço, e eu deitada em seu colo. Suas mãos alternavam entre meu cabelo e meu braço. Ele insistia em ficar me tocando o tempo todo, e eu adorava isso. Nossas risadas se misturavam e tornavam-se uma só quando algo engraçado acontecia na TV, e se tratando de Friends, era constante. E então eu comecei a pensar que ter Zabdiel comigo me fazia feliz. Me deixava leve, pisando nas nuvens, como se nunca tivéssemos deixado de fazer isso. E eu tentei, tentei muito. Até baixei um aplicativo de relacionamentos alguns meses depois, mas nenhum dos caras era ele. Nenhum chegava aos seus pés.

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