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"Espera ai!" Nathan exclamou ao segurar o braço de Miguel. Miguel puxou o braço, olhando feio para ele. Tinha o rosto vermelho e o cabelo muito cacheado se encontrava bagunçado, parecia até mais armado.

Por algum motivo vê-lo emburrado como um bebê fez com que muita da raiva de Nathan se desfizesse. Miguel não era muito intimidante nem mesmo quando irritado, pelo o contrário. O garoto deveria ter dificuldade em escapar de valentões.

Mas NÃO era isso que Nathan deveria estar pensando agora!

"Não me toca!" para acentuar a ordem Ana Júlia começou a rosnar para Nathan. Ele deu um passo para trás, com Brutus firme no seu colo para que não tentasse entrar na briga. Não seria muito bonito.

"Nossa, como ele rosna bonito." Nathan transbordou sarcasmo. "Foi você que ensinou 'ele ameaçar as pessoas?"

"Quem você pensa que é para falar da Ana Júlia, sendo que o seu cachorro sai por ai roubando a comida dos outros?"

"Você nomeou um husky de Ana Júlia?"

"É um clássico!"

Nathan teve que dar um tapa na própria testa. Ele não conseguia acreditar que aquilo estava acontecendo. Sentia a sua ressaca retornando.

"Eu não sei o que é pior, você ter o husky e não merecer, para colocar um nome assim, ou fato que você gosta dos Los Hermanos."

"Uau!" Miguel gritou. Ele era bem escandaloso quando irritado. Nathan não havia tido uma conversa com ele que não envolvesse a população inteira do parque. "Eu estou tão feliz de te conhecer. Sério. Além de ter colocado um pinto no meu pulso, você é um machinho escroto com péssimo gosto musical."

"Ei." Nathan ergueu um dedo ao ar, tendo uma pausa dramática. "Meu gosto musical é ótimo." Miguel arqueou as sobrancelhas. "Eu escuto rock de verdade, porra."

"Ah, é isto. Chega. Esse foi o meu limite. Eu vou voltar para casa e fingir que esse dia nunca aconteceu. Boa vida para você, Senhor Qualquer Coisa Menos A Minha Alma Gêmea."

Miguel iria embora, de novo, mas dessa vez Nathan foi mais rápido e o bloqueou. Ele quis fugir, mas não conseguiu.

"Você vai me ouvir, nem que seja só por cinco minutos." Nathan demandou. Miguel não estava convencido a obedecer. "Deixa de ser idiota, cara." resmungou, erguendo o livro que ele lia antes de Nathan chegar e que usou como arma.

Seus dedos queimavam segurando o objeto, assim como o rosto acertado. Ele estava vermelho e irritado por conta da dor. A sorte era que Nathan estava acostumado com agressões piores (afinal ele sempre gostou de brigar, e quem briga apanha), se não aquele livro de capa dura teria lhe dado um K.O.

E Miguel tinha um bom arremesso, para alguém com os braços finos. Miguel arregalou os olhos ao ver o livro, notando que deixara com Nathan ao jogar nele e sair andando.

"Eu deveria estar te dando um soco, mas eu vim aqui devolver o seu livro."

O garoto pegou o livro de volta, abaixando o rosto por um instante, mas logo voltou a encarar de forma irritada Nathan nos olhos.

"Você quer um prêmio ou coisa parecida?"

"Caralho, eu não sei o que você passou, mas não é motivo para sair jogando livros de capa dura nas pessoas. Depois de ter chutado elas. Até agora, eu não fiz nada para você."

Nathan tinha razão.

O bico de Miguel piorou ao ouvir isso. Foi nesse momento que Nathan notou que ele não parava quieto. Chacoalhava o corpo de várias formas, balançando as pernas, mexendo os pés, cutucando os próprios dedos ou movendo a cabeça da forma mais imperceptível o possível.

Parecia uma máquina com problema vinte e quatro horas por dia.

"Tudo bem." Miguel finalmente murmurou. "'Me desculpe." resmungou sem olhá-lo nos olhos. "Eu explodi com você. E te machuquei sem motivo."

"Olha, maturidade. Eu estou chocado."

Miguel o olhou feio novamente.

"Sobre o que você falou da Brutus," Nathan retomou, com a cadelinha segura em seu colo. Ela pensava sobre as teorias de Platão enquanto ponderava sobre o quão longe estava do chão naquele momento. "vai tomar no seu cu. Não dá para comparar esse ser inocente com a máquina de matar que você tem ai."

Miguel demorou um pouco para responder.

"É uma cadela."

"Eu acabei de usar o feminino, não usei?"

"E por que o nome dela é Brutus?" Miguel questionou. Nathan arregalou os olhos, notando a merda que havia feito. Então, Miguel riu. "Você é muito bobo."

"Ei, 'tá tentando me ofender? A sua cachorra se chama Ana Júlia."

Dessa vez o comentário não irritou Miguel. Ele balançou o rosto negativamente, sorrindo. Passou a mão por Brutus, que acordou para o que acontecia ao seu redor, e o encarou com interesse. Ela sempre estava pronta para receber carinho, independente de quando e como.

Brutus era fácil demais.

"Eu posso pagar um sorvete para vocês." Miguel ofereceu. "De pedido de desculpas para Brutus, é claro."

"Que porra? Quem levou um livro na cara e um chute na canela foi eu."

Miguel deu de ombros, debochado.

"É pegar ou largar. Ou eu posso ir embora e a gente pode fingir que isso nunca aconteceu, e seguir as nossas vidas."

Nathan grunhiu.

"Tá bom, caramba. Eu vou tomar esse maldito sorvete."

Nathan acabou tendo que aceitar naquele dia que ele era tão fácil quanto Brutus. 

Peixes Fora do Aquário (✔)Onde histórias criam vida. Descubra agora