Quando Nathan sentou no banco do carro, estava explodindo com tanto sentimento, sensação e pensamento diferente guerreando dentro de si. O interno de Nathan era quase a Segunda Guerra Mundial. Mas ele nunca foi do tipo de se martirizar e guardar para si mesmo.
Por isso a primeira coisa que saiu da boca, antes mesmo de pensar sobre, foi:
"Desculpa."
Foi o pedido de desculpa mais sincero da sua vida inteira, provavelmente. No máximo ele se desculpava com a família (Roger estava incluso nisso, óbvio), mas tentava se equilibrar em uma linha tênue entre completo babaca e decepção e decente o suficiente para não extrapolar o limite da família super liberal e ser expulso de casa.
Miguel o olhou surpreso, parando de colocar o cinto. Os dois não haviam conversado no caminho, na verdade ficaram em um clima terrível de tão tenso e que só tendia a piorar se Nathan não tivesse praticamente expelido o pedido de desculpa.
Eu não sei se deu para pegar... Mas o caminho do Matagal até a Engenholândia é bem longo. Beeeem longo. O encontro deles, e provavelmente o relacionamento, já estava arruinado só por esse silêncio gigantesco cheio de coisas não ditas e difíceis de lidar.
"Pelo o quê?" Miguel acabou perguntando, genuinamente confuso.
Nathan respirou fundo. Já estava começando a se acostumar com aquele jeito de Miguel, dificultando as coisas mesmo quando não tinha a intenção.
Miguel era tipo um desafio. Para a sorte de Nathan, ele sempre gostou de enigmas e jogos de desafio. Seu nível de perseverança era alto, foi assim que ele conseguiu entrar na faculdade no curso de Engenharia, no final das contas – e continuar dentro dela com o menor número possível de reprovações, detalhe importantíssimo.
"Pela a sua marca." Nathan falou baixinho, completamente diferente do seu jeito normal. "Por eu ter estragado a sua vida por um negócio tão idiota."
Miguel demorou um instante para responder. Nathan o observou, encontrando um garoto que ele não conseguia descrever de outra forma a não ser fofo, desconcertado no banco do seu carro.
E, claro, claro que o seu coração teve que pular uma batida da forma errada que nem bêbado em bloquinho do Carnaval, pela a espera ansiosa da resposta ou pela a ansiedade causada pelo o momento vulnerável, era impossível de identificar para Nathan.
Tudo bom? Problemas cardíacos tão cedo? Um encontro com Miguel e Nathan já considerava visitar três médicos no mínimo. Será que eles eram os únicos ou existiam outras almas gêmeas com esses problemas?
"Não, olha..." Miguel coçou a têmpora de forma nervosa, respirando fundo antes de falar. "Eu acho que eu também tenho que te pedir desculpa. Não pela a marca, porque eu não fiz nada de errado." constatou de forma enfática. Nathan tentou, mas não conseguiu não fechar a expressão ao ouvir isso. "Mas sobre o jeito que eu reagi e continuo reagindo. Eu concordei em tentar, mas se eu estivesse cem por 'cento seguro disso, eu não continuaria reagindo desse jeito."
Suspirou por fim, como se estivesse decepcionado consigo mesmo. Nathan franziu o cenho.
"Essa é a segunda vez que você pede desculpa por um lance estranho. Tipo, deu para ver que você tem muito ressentimento em relação a essa marca pelo o jeito que me deu um chute, uma livrada, me xingou..."
"Tá bom, tá bom, eu já entendi." Miguel o cortou. "Sim, eu tenho. A minha marca tinha uma palavra horrível que rendeu um bom material de zoação na escola. Por isso eu nunca tive esperanças sobre você. Na verdade, eu sempre te julguei, no mínimo, a pior pessoa do mundo."
Nathan só pode engolir as próprias palavras e ouvir, sentindo-se pessoalmente atacado.
"Ao mesmo tempo, eu ficava pensando se eu não ia fazer algo tão errado que faria você reagir desse jeito. Então os únicos sentimentos que eu tinha em relação à minha marca ou eram raiva ou eram culpa." esticou o pulso no ar, olhando feio para as palavras gravadas na pele. Nathan se perguntou quantas vezes Miguel tivera feito isso durante a vida. "Mas 'daí quando eu te conheci, esses sentimentos explodiram. Por que foi não foi nada do que eu pensei. Você não era nada do que eu pensei. Essa frase idiota no meu pulso era só o seu jeito idiota de dar oi para as pessoas. Foi completamente gratuito e desnecessário."
"Eu falei sem pensar."
"É, eu percebi que você faz muito isso." Miguel continuou. "Pelo o que eu entendi foi um engano para você também."
"Eu sempre achei que o contexto era outro." Nathan tentava gesticular com as mãos para se distrair, sentindo-se um pouco sufocado no carro e perdido. "Eu 'tava no modo defensivo." então, mais baixo: "Eu sempre 'tô no modo defensivo."
Miguel assentiu, desviando o olhar de Nathan.
"Mas se eu parar para pensar, essa marca horrível não me deu só coisas ruins." Miguel deu um sorrisinho amarelo, voltando a olhar para a marca e agora passando seus dedos levemente sobre a frase. "Foi por conta dessa marca que eu me aproximei da Mô e virei o melhor amigo dela. Chamavam a gente de Dupla do Pinto."
Nathan riu alto, só percebendo depois a merda que fez e olhando nervoso para Miguel. Mas para a sua sorte, Miguel ria também.
Nathan esqueceu até de respirar o vendo rir.
"É engraçado, eu sei." Miguel revirou os olhos de forma divertida. "Teve outras coisas boas, também. Foi por isso que eu acabei decidindo te dar uma chance e tentar. Afinal de contas, não dá para dizer o que diabos vai acontecer." isso era verdade: A única certeza na relação deles é a de que seria bastante imprevisível, nada tinha acontecido do jeito que eles queriam ou tinham planejado até o momento.
Era a porra do Destino, não? Se ele queria que peixes ficassem fora d'água e continuassem respirando, isso iria acontecer.
"Então realmente eu não deveria ficar voltando atrás desse jeito. Entendeu agora?"
"Eu entendi que a gente deveria ter conversado sobre isso antes."
"É." Miguel riu mais. "Com certeza."
Nathan não conseguia parar de sorrir, desde que Miguel começara. Só nesse momento o bobão notou que ainda não havia ligado o carro, ou colocado o cinto, e acabou fazendo tudo isso aos risos clandestinos com Miguel como se fossem duas crianças de cinco anos.
Aquele clima ruim? Desapareceu como se nunca tivesse existido.
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Peixes Fora do Aquário (✔)
HumorNathan Breno Duarte Maldonado, ou Maldotado como costumam chamá-lo, vive em um mundo em que todos possuem uma alma gêmea e a denominação disso está escrita no seu pulso como a primeira frase que vai ouvir dessa pessoa. Nathan cresceu complexado com...