Nathan nem errou o caminho.
Oh céus.
Levou Miguel de volta para a casa dele depois de voltarem do trabalho voluntário, mas não saiu do carro por motivos óbvios. Isso aconteceu há um bom tempo, Nathan não deveria lembrar o caminho.
Mas se lembrava. Tanto que quase não olhou para o GPS enquanto dirigia.
Exatamente como antes de entrar no restaurante mexicano durante a sexta à noite, Nathan estava parado dentro do carro, à frente da casa de Miguel, em uma vaga quase mágica que, em qualquer outro momento, seria motivo de vitória.
Mas não agora que não tinha Roger consigo para incentivá-lo enquanto se sentia assustado demais para sair do carro.
A casa de Miguel parecia muito confortável e simpática. Ele morava à três quadras de distância do parque, que era perto da casa de Nathan. A casa também possuía dois andares como a de Nathan, mas era pintada em marrom escuro e possuía um jardim bem cuidado na entrada logo após o portão.
Assim não ia dar.
Nathan já havia contado os gnomos de jardim da casa de Miguel, já havia dado um sermão motivacional para si mesmo e também já havia jogado tempo fora só falando com Roger enquanto ele o mandava figurinhas motivacionais de Pokémon.
Se distrair ou se motivar não estava adiantando para deixá-lo calmo o suficiente para tocar a campainha de Miguel.
Nathan só conseguiu chegar até ali por conta das conversas que trocou com Miguel ao longo dos dias, em que ele explicava que não iria apresentá-lo como alma gêmea, e que os pais eram realmente liberais e não se importariam se eles fossem mais do que só amigos da mesma forma.
A família de Miguel era muito unida e por isso era normal que conhecessem os seus amigos. A visita de Nathan não era nada demais e não iria ser tratada de outra forma.
Mas Nathan não conseguia esquecer o real motivo de estar ali e relaxar.
Então o celular dele começou a vibrar e tocar agressivamente.
Bom, ok, o celular não tocou de forma agressiva, porém, por ter cortado o momento de pura ansiedade de Nathan, foi assim que o percebeu, como água gelada causando choque térmico.
"Alô?" tentou soar o mais casual possível ao atender, mesmo falhando miseravelmente.
"Hã, por que você 'tá parado na frente da minha casa?" essa era a voz de Miguel do outro lado.
Nathan olhou para a casa de Miguel, procurando achá-lo com o telefone no ouvido. Foi só nesse momento que percebeu a grande janela no segundo andar, agora com as cortinas afastadas, mostrando um Miguel apoiado suavemente no vidro, acenando ao encontrar os olhos de Nathan.
Ele arrumou os óculos dourados no rosto após isso, usando uma jaqueta jeans com um moletom cinza por baixo, aproveitando o tempo frio, e aparentemente calças jeans escuras. Não conseguiu reconhecer a camiseta dele mesmo se quisesse. Seus cachos pareciam menos armados, provavelmente ainda molhados de um banho.
Havia um assento branco embutido na janela, e era ali que Miguel estava sentando o observando. Nathan conseguia vê-lo sentado ali lendo por horas ou tocando violoncelo.
"Sua janela fica de frente 'pra rua." Nathan observou da forma mais inteligente do mundo.
"Sim...? O que tem?" Miguel fez uma careta confusa.
"Só para eu saber quando eu quiser jogar pedrinhas de madrugada."
Miguel revirou os olhos, mas sorria.
"Eu duvido muito, Romeu. Você não consegue entrar 'pela a porta da frente de dia, imagina 'pela a minha janela de noite."
Aí, viado.
Podia ter dormido sem essa, Nathan.
Nathan grunhiu.
"Há quanto tempo você 'tá me vendo aqui?"
"'Pelo o seu tom de voz, mais do que você realmente passou parado aí. Eu acabei de sair do banho e me trocar e dei a sorte de te ver." Miguel soltou um suspiro. "Olha, 'tá vendo essa janela aqui de baixo? Se meus pais te virem por ela, eles vão te obrigar a entrar ou te obrigar a sair. É melhor você fazer qualquer um dos dois primeiro, por si mesmo."
Nathan respirou alto, deixando a cabeça cair sobre a buzina sem acioná-la.
"Eu preciso de um momento."
Nathan não viu o sorriso meio que Miguel deu observando-o.
"Você já teve mais do que um momento, Nathan."
Foi a vez de Nathan suspirar.
"Você acha mesmo que eles podem gostar de mim? Tipo, seus amigos é uma coisa, mas os seus pais..."
"Do mesmo jeito que eu comecei a gostar de você."
A cabeça de Nathan se ergueu na velocidade da luz. Miguel continuava com o mesmo sorriso meigo, e Nathan não conseguia dizer se ele corava ou não, mas percebeu que o garoto ficou um pouco mais tímido graças ao seu comportamento corporal.
Nathan queria se aproximar. Queria vê-lo, tocar nele, sentir o calor dele. Poderia fazer tudo isso agora, apenas tinha que sair do carro.
"Como eu te disse antes, eu sou muito próximo dos meus pais. Eles participam de todas as coisas grandes da minha vida. Se eu não te apresentasse agora, iria te apresentar depois."
Então... Eu entro nessa categoria? Mais do que só a alma gêmea problemática que você arranjou sem querer?
Miguel não foi óbvio o suficiente até agora, Nathan?
Ele sabia que sim.
Nathan encarou Miguel e foi encarado de volta com a mesma expressão gentil e sorriso meigo. Queria gravar a imagem para usá-la como um amuleto da sorte.
"Eu vou entrar, então." Nathan murmurou distraído. Miguel deu uma risadinha do outro lado.
"Prometo atender a porta 'pra você não assustar de cara. Eu juro, às vezes você age como um animal arisco de rua."
Nathan só conseguiu sorrir de volta e sentir o coração estremecer e esquentar por aquele garoto bobo.
Quando Nathan finalmente conseguiu abrir a porta do carro e sair, ele encarou a casa e o seu jardim florescido e bem cuidado por mais alguns instantes, até decidir que só havia duas coisas a fazer: Seguir em frente e entrar.
Nathan sabia fazer o primeiro muito bem, só precisava aprender o segundo. Aos poucos, Miguel estava o ensinando.
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Peixes Fora do Aquário (✔)
HumorNathan Breno Duarte Maldonado, ou Maldotado como costumam chamá-lo, vive em um mundo em que todos possuem uma alma gêmea e a denominação disso está escrita no seu pulso como a primeira frase que vai ouvir dessa pessoa. Nathan cresceu complexado com...