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Nathan não queria se sentir irritado, mas se sentia.

Irritado, cansado e preocupado.

Roger era do tipo que falava pelos cotovelos. Ele sempre tinha algo a dizer. Então, quando ficava quieto como agora, Nathan não podia evitar a preocupação. O pior de tudo é que Nathan sabia que ele se culpava.

Ele foi quem não conversou com Mônica e se sentiu mal quando ela decidiu se relacionar com outra pessoa.

Distorcendo a história, a culpa poderia ser toda dele.

Nathan entendeu, então, que essa poderia ser a sua situação com Miguel se o garoto não decidisse discutir a relação o tempo todo. A cada dia ele aprendia de verdade como relações não eram fáceis, principalmente relações entre almas gêmeas.

A relação entre almas gêmeas era exatamente o contrário do que a sociedade pintava. Nada magicamente se resolve quando você encontra a sua alma gêmea.

Existiam muitos problemas, pequenos ou grandes, que precisavam ser abordados quando você decide ficar com alguém para sempre que, por muitas vezes, possui uma vida completamente diferente da sua.

Graças à persistência de Miguel, Nathan sabia em que ponto eles estavam. Mas só não sabia para onde iria com ele, principalmente depois desse fiasco entre Mônica e Roger.

Em teoria não deveria afetá-los... Mas na prática afetava e muito.

"Haha, eu posso dormir aqui?" Nathan soou cansado para Lisa quando ele e Roger chegaram na casa dele. Seus pais e os pais de Roger estavam rindo e conversando na cozinha, esperando os dois garotos para que Nathan levasse Lisa e Ricardo para casa.

Lisa alongou os olhos surpresa, sem esperar o pedido. Nathan não pedia mais permissão. O que fazia sentido, pois ele era um adulto, e possuía meios de fazer o que quisesse mesmo que os pais desaprovassem.

Mas ele pedia por estar exausto - seja lá o que ele e Roger fizeram na rua por todo aquele tempo até voltarem - sem estar raciocinando cem por cento. Lisa percebeu ainda quando ele era novo que os neurônios racionais do filho fritavam depois de muito uso.

Ela também percebeu como Roger estava triste, sem falar com ninguém por preferir o isolamento, indo direto para o seu quarto mais uma vez. Lúcia e Fernando preferiram não o importunar, sabendo que ele acabaria falando sobre em algum momento.

Roger sempre foi muito transparente sobre todos os seus sentimentos, o que causava certa inveja em Lisa quando seu próprio filho era fechado e difícil de ler.

Às vezes parecia que Nathan só se deixava sentir sentimentos destrutivos – como vingança, desprezo, raiva - e isso a preocupava.

Mas nos últimas dias Nathan demonstrara sentimentos positivos e sentimentos negativos que não eram destrutivos, como o cansaço atual e certa preocupação.

Exatamente como ele fazia quando mais novo, sem nenhum problema, sem se preocupar o que pensariam dele ou o que deixariam de pensar. Naquele momento, Lisa quase pode ver Nathan mais novo e menos complexado.

"O Rô 'tá bem?" Ricardo perguntou em vez de responder, aproximando-se dos dois. Lúcia e Fernando arrumavam as coisas do jantar ao fundo, dando a privacidade que a família precisava.

Quando Lisa olhou para Ricardo percebeu que ele via o mesmo que ela.

"Não." Nathan murmurou incomodado. "Por isso eu queria ficar."

"Claro que pode." Lisa deu de ombros. Ricardo não podia discordar dela. "Os Cartaz podem nos dar uma carona de volta."

"Vai ligar o carro então, Fernando." Lúcia disse simplesmente, focada em lavar a louça, sem parecer que ouvia até responder. Fernando piscou lentamente, até que todo mundo presente na sala olhou para ele, e a pressão foi o suficiente.

"Claro, já volto." resmungou não muito contente. Ricardo, Lisa e Lúcia riram como se fosse uma piada interna. Nathan franziu o cenho com o fato que os boomers sabiam aproveitar a noite melhor que ele e Roger.

"Só descansem de verdade e não fiquem acordados até tão tarde." Lisa avisou, sem conseguir controlar o senso de mãe, mesmo sabendo que era exatamente assim que afastava Nathan novamente.

Porém, contrário da reação que esperava, Nathan simplesmente assentiu e disse boa noite de forma respeitosa antes de subir exatamente como Roger havia feito.

Os três adultos ficaram surpresos na sala/cozinha, olhando para o lugar que Nathan esteve anteriormente tentando entender a mudança agradável de atitude.

Bom, não era exatamente uma mudança. Não para quem o conhecia antes de entrar na puberdade. Lisa sabia que Nathan era sincero com Roger e vice-versa, e ficava feliz que o filho tinha esse tipo de suporte. Provavelmente, se os dois não fossem amigos eles teriam se tornado muito diferentes.

Nathan poderia ter se tornado muito pior.

Mas Lisa queria vê-lo sendo sincero com o mundo – não só com Roger. Ele não percebia como a vida poderia ser mais fácil se não se esforçasse tanto para afastar as pessoas e machucá-las no processo. Desde pequeno, Nathan só sabia ver o lado negativo das coisas.

Lisa não evitava pensar que, talvez, Nathan achou alguém nos últimos dias que estava o incentivando a fazer exatamente isso: Ser mais sincero, pelo menos quando seus sentimentos eram mais fortes.

Sentiu um pouco de inveja, por alguém conseguir o que ela e o marido não conseguirem, mas o resto era só satisfação por aquilo estar acontecendo com Nathan antes que fosse muito tarde.

Antes que ele machucasse alguém de verdade.

Peixes Fora do Aquário (✔)Onde histórias criam vida. Descubra agora