Quando Nathan estava na primeira série, com seus sete aninhos recém-feitos, a professora pediu que as crianças apresentassem um desenho sobre como eles imaginavam suas almas gêmeas no futuro.
Nathan mostrou um desenho (mal feito, como o de boa parte das crianças nessa idade) de uma princesa e um príncipe, lado a lado.
"Um desses dois é a minha alma gêmea, e eu vou amá-los muito independente de qualquer coisa!" exclamava com dificuldades para falar por ser banguela e não ter total domínio de nenhuma das línguas que já sabia falar nessa época: Português e japonês.
A professora assentiu para encorajá-lo a prosseguir, contente por que todas as crianças começaram de forma parecida. Em um mundo em que sua alma gêmea pode ser tanto um garoto quanto uma garota, homofobia não existia de verdade. Porém, esse mundo ainda era igual o nosso, e machismo e racismo eram normais.
Com o encorajamento da professora, Nathan continuou:
"E ai, quando eu conhecer ele ou ela, ela vai dizer assim: "Nossa, o seu é tão pequenininho!" e ai nós vamos se casar!"
"Como assim pequenininho?" uma menina exclamou confusa. A sala começou a falar ao mesmo tempo, igualmente confusa como a menina.
A professora entrou em leve pânico, por que ela nunca pediu para os alunos falassem das suas marcas, e agora o estrago estava feito. Mas ela não reagiu rápido o suficiente para evitar o que iria acontecer.
"A minha mamãe disse que é o meu coração. Por que eu sou pequeno, então meu coração também é pequeno."
Então, as crianças começaram a rir. E Nathan não entendeu por que elas estavam rindo até um daqueles garotos precoces demais para a idade exclamar:
"Ela 'tava falando do seu pinto, japa!"
E todos riram mais ainda. Mas as crianças rirem, não foi o que traumatizou Nathan. O que traumatizou Nathan foi olhar para a única figura adulta da sala, a professora, e ver que lutava fortemente, sem sucesso, para segurar a risada.
Então ela riu, de leve, mas riu.
E se a professora riu, então é verdade: É uma piada Nathan ser japonês e ter um pinto pequeno, sem entender nenhum desses conceitos ainda. Ele olhou para o próprio desenho, com a princesa e o príncipe sorrindo, e só quando uma das suas lágrimas manchou o papel que notou que chorava.
E foi ai que ele entendeu que, independente de quem fosse a sua alma gêmea, ela iria rir da piada de Nathan ser japonês e ter pinto pequeno e ele iria se sentir mal e chorar. Mas como ele era muito pequeno, Nathan só conseguiu projetar a raiva que sentiu em uma das figuras: Na princesa.
Por que ela era a mais parecida com a professora. Era mais fácil de odiar, também.
Jurou nunca deixar a princesa rir da piada dele ser japonês e ter pinto pequeno, por que estavam rindo de si agora, e ele não gostou de ouvir as risadas dos outros e chorar e ficar mal consigo mesmo.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Peixes Fora do Aquário (✔)
HumorNathan Breno Duarte Maldonado, ou Maldotado como costumam chamá-lo, vive em um mundo em que todos possuem uma alma gêmea e a denominação disso está escrita no seu pulso como a primeira frase que vai ouvir dessa pessoa. Nathan cresceu complexado com...