VINTE E NOVE

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Eu não podia evitar o medo que estava sentindo. Meu corpo está fraco, não sei há quanto tempo não consumo nenhum alimento satisfatório o bastante para o meu organismo.

— Você é uma vadia querida, Samantha.

Olho para o lado na velocidade em que meu cérebro permite, não pronunciando uma só palavra.

— Aqueles filhos da mãe estão dispostos a fazer muito por você. Muito.

Não sei para onde estamos indo, mas o carro está balançando tanto que posso sentir meu estômago embrulhar.

Ainda estou seminua, Jack não fez questão de me cobrir. Não pude nem mesmo lavar o rosto ou limpar os ferimentos que ele deixou em mim. Meu nariz ainda arde quando minha respiração se eleva, mas tenho sorte por não ter quebrado com a força do chute.

Não sou capaz de sentir meu próprio cheiro no momento, mas sei que não deve ser dos melhores. Suor, sangue, poeira...

— Chegamos! – Sorri, fingindo empolgação.

Ele desce do carro, então dá a volta e abre a porta de onde estou, me puxando pelo braço, me causando dor. Policiais apontam armas para ele no mesmo instante, mas o mesmo não parece ter medo, então mostra um revolver para os homens fardados logo à nossa frente.

— Fizemos um acordo, Cornell. – Jack quase grita. — Trouxe a nossa detetive favorita, agora quero minha liberdade.

— Você só estará livre quando Samantha estiver segura conosco. Solte-a! – Philip Cornell ordena.

O maldito Jack Bailey me puxa para si, insistindo em me beijar, mesmo com minhas mãos o empurrando.

— Adeus, vagabunda. – Sorri. — Ou não.

Então ele me deixa ir, mas se empenha em apontar sua arma para mim. Imediatamente me afasto dele, ainda de costas, com medo de ser pega desprevenida por um tiro.
Quando chego a um dos policiais, Jack corre para o carro e sai de ré, em alta velocidade.

Olho para o chefe, angustiada, mas ele se aproxima com um cobertor, envolvendo-o em mim.

— Não se preocupe, a ficha dele continua suja. Ele será pego em algum lugar. Vamos para a ambulância, você está muito machucada. – Segura-me cuidadosamente e me acompanha até uma ambulância que está logo ao lado.

Um paramédico e uma enfermeira me acolhem, colocando-me para descansar na maca.

— Sente dores? – A enfermeira pergunta, me dando atenção.

— Meu nariz dói quando me mexo rápido demais – respondo, encarando o teto branco.

Ela auxilia o paramédico que me examina ali mesmo, limpando meus machucados devidamente e colocando curativos em alguns. Foi preciso dar dois pontos no meu nariz e três na cabeça, mas nada muito grave.

— Vamos levá-la ao hospital para ser completamente examinada. Não sente dores internas? – É o paramédico quem questiona.

— Não.

Minha resposta é curta, mas as lágrimas que deixam meus olhos são longas e pesadas. Lembrar de cada momento me machuca de uma forma inexplicável.
Sei que preciso falar sobre o estupro, mas me sinto envergonhada em dizer em voz alta.

A enfermeira me ajuda a sentar assim que alguém invade a ambulância, que é fechada em seguida.

Oliver se apressa até mim, me abraçando com um pouco de força, mas relaxa logo em seguida, talvez receoso por meus ferimentos.

— Samantha... eu sinto muito.

— Não foi culpa sua – sussurro, o afastando para ver seu rosto.

Vejo seu maxilar tomar forma, dois de seus dedos acariciam minha têmpora que está levemente roxa e minha bochecha, do lado onde o canto da minha boca tem um corte pequeno e um leve tom amarelado.

— O que aquele desgraçado fez com você? – Posso sentir a raiva em cada letra que sai de sua boca.

Aperto os lábios, evitando chorar mais.

— Prefiro não me lembrar, Oliver. Foi horrível! – Soluço.

Ele me abraça novamente, e então se deita comigo na maca enquanto sou encaminhada para o hospital.

▪️

Eu estava usando uma camisola do hospital, mas Oliver havia saído, prometendo trazer alguma roupa e comida para mim.

No quarto, encaro o nada enquanto soro é injetado em minha veia. Estou me sentindo um pouco melhor, mas com muita fome e sede, mesmo uma enfermeira me dando água o tempo todo.

Um médico entra no quarto após bater na porta, sorrindo de forma educada para mim.

— Pronta para os exames? – Soa empolgado, em uma tentativa comum de médicos em me animar um pouco mais.

— Acho que sim.

— Consegue ir andando? – Ergue as sobrancelhas.

— Consigo, claro. – Sorrio um pouco.

Ele mesmo cuida em tirar toda a aparelhagem de mim e me acompanha, segurando meu braço direito com cuidado.
Ao sairmos do quarto, vejo Oliver chegar com uma bandeja com comida e água.

— Estou levando-a para alguns exames, deseja acompanhá-la? – O médico é gentil.

— Sim, já estou indo. – Entra no quarto e volta, segundos depois, com as mãos vazias.

Nós três nos encaminhamos para a área de raio-x, onde o doutor garantiria que está tudo bem dentro de mim.

▪️

De volta ao quarto, George Stewart, o qual descobri ser o nome do médico atencioso e gentil, me faz perguntas.
Oliver está sentado na poltrona, me observando comer, quase desesperada, a comida deliciosa.

— Você sofreu algum tipo de abuso, Samantha?

De repente, a comida encontra dificuldade para ser engolida. Olho para Oliver e limpo a garganta, vendo-o engolir em seco e bater as pontas dos dedos umas nas outras.

— Sim. Sexual. – Sinto meu estômago revirar.

— Com licença. – É Oliver. Ele sai do quarto, parecendo irritado.

— Parece que temos muito o que fazer, não?

Não digo nada, apenas deixo o doutor fazer seu trabalho.

▪️

Tive alta pela manhã, já que passei a noite no hospital. Oliver Gutierrez se mostrou um grande homem, me ajudando no que pôde em todo momento e não saindo de perto de mim por nada.
Agora, estamos indo para o hotel onde estávamos hospedados.

— Como está se sentindo?

Olho para ele e sorrio.

— Bem melhor, obrigada. Você está sendo muito prestativo.

— Devo isso a você, me sinto culpado por não ter ficado no seu pé a cada segundo. – Bufa.

— Não se culpe, você não tem nada com os meus problemas, Oliver. Eu é que te devo desculpas por te envolver nisso.

— Aquele filho da puta está preso, vai ser transferido em breve para algum presidiário ruim o bastante para ele, sem direito a julgamento ou a qualquer coisa que o favoreça. Falaremos com Cornell mais tarde, você precisa saber tudo o que ele fez. Isso ainda não acabou, Samantha, você vai ver.

Aquilo não era apenas ameaça ou achismo, era uma promessa.

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