UM

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Sei que estou consciente, mas não consigo abrir os olhos. Meu corpo está pesado, tudo dói, inclusive minha cabeça.
A última recordação que tenho é de estar em uma crise de pânico e uma enfermeira aplicar algum sedativo no meu braço.
Um gemido deixa meus lábios quando tento me mover, mas consigo ficar em uma posição melhor, quase sentada. Forço o braço direito para colocar a mão na cabeça e tentar encontrar algum machucado que esteja a fazendo doer tanto, mas algo me impede.
Abro os olhos devagar, acostumando minhas vistas com a luz não muito forte do ambiente. O cheiro de hospital me dá ânsia de vômito, odeio este cheiro. Ao conseguir enxergar com clareza, olho para o meu pulso direito e sinto algo como desespero passar por meu peito. Uma algema está me prendendo ao metal da cama, beliscando levemente minha pele marcada por um hematoma roxo com tom esverdeado ao redor. A sensação de estar presa é horrível, ainda mais quando eu nunca mereci estar.

— Oh! Você está acordada! – Uma enfermeira aparece, sorridente demais para o meu gosto.

— Acho que sim. Que horas são? – Minha voz está muito baixa e rouca. Minha garganta dói pelo esforço.

— São três da madrugada, querida. Faz algumas horas que você está aqui, mas receberá alta logo pela manhã.

Estou muito ansiosa por isto, não quero ficar aqui por muito mais tempo ou ficarei louca de verdade. Chega a ser engraçado de tão irônico.

— Você pode me dar um pouco de água? – Tento limpar a garganta com um pigarrear.

— Vou buscar para você.

Ela sai, me deixando sozinha. Olho para onde ela estava mexendo e vejo marca de agulha, então respiro fundo e tento não entrar em desespero.
Tudo o que quero é ir para minha casa, tomar um bom banho no meu banheiro e dormir na minha cama. Mas não sou burra, sei muito bem o que vai acontecer comigo por culpa daquele monstro.

— Aqui, beba. – A enfermeira está de volta e me oferece um copo de plástico com água.

Enquanto bebo penso em como isto é bom, minha garganta parece mais leve, mesmo que ainda esteja doendo.

— Por que estou presa? – Pergunto ao estender o copo para ela.

— Os policiais acham que você é uma ameaça e poderia fugir se acordasse.

— Com toda a dor que estou sentindo, eu duvido muito que consiga dar um passo sem ajuda.

— Eu te dei outro remédio, ele é analgésico e vai te fazer relaxar, talvez você durma um pouco mais. Antes de você ir o médico vem examiná-la.

Apenas aceno com a cabeça e fico olhando suas costas até a porta ser fechada.
Tento me aconchegar um pouco no travesseiro macio em baixo de mim, mas nada tira a sensação horrível dentro de mim. É a sensação de impotência, de fracasso.
As coisas seriam diferentes se eu não tivesse sido tão burra, mas fui, e agora não posso reverter a história porque todos acreditam que sou louca.

Todos acreditam que tentei matar o inocente Jack Bailey.

Meu coração acelera quando penso em seu rosto satisfeito ao me ver ser levada injustamente, minha irritação é tanta que não consigo controlar, sinto vontade de socar alguma coisa ou alguém.
Pensando bem, os policiais estão certos, eu sou mesmo uma ameaça.

Acordo mais uma vez, e o desejo de estar na minha cama enorme e de tudo não ter passado de um terrível pesadelo não passa despercebido. Porém, só o que vejo é um policial me esperando e um médico anotando alguma coisa em uma prancheta.

— Scarlet, você está em perfeito estado. – O homem de meia-idade e jaleco comenta.

Não respondo, não quero falar nada. O melhor a se fazer agora é ficar em silêncio o máximo que eu puder. Finjo estar perturbada demais em minha própria mente para ter sequer ouvido o que ele disse, principalmente do que me chamou.

— Não adianta conversar com gente louca, doutor, eles não compreendem. – O policial diz com um sorriso arrogante.

O médico olha para mim por dois segundos e suspira, me dando as costas.

— Ela está liberada. – E nos deixa sozinhos.

Ouço o barulho das chaves, o ridículo de farda abre a algema e coloca um conjunto de roupas no meu colo.

— Vista isto.

Olho para seu rosto, mas ele não move um dedo do lugar. Ergo uma sobrancelha, ele abre outro daquele sorriso e cruza os braços.
Levanto-me da cama com dificuldade, ficando primeiro sentada, para depois colocar os pés no chão.
Pego a calça jeans gasta e coloco por baixo da camisola, cortando qualquer expectativa do policial idiota de me ver nua. O problema é quando preciso tirá-la por cima para vestir a blusa, meus seios estão arrepiados pelo ar gelado do hospital. O par de olhos pretos parecem nunca ter visto um par de peitos antes.

— Até que você é bonitinho, mas trate de parar com os olhares. – Digo quando termino de vestir a camiseta grande.

Ele pega meu braço com força e me algema novamente, empurrando meu corpo para fora do quarto. Sorrio, um pouco satisfeita por ter o irritado.
Saímos do hospital, finalmente. O dia está bonito, o céu está limpo e me traz um pouco de paz, mesmo que eu esteja olhando-o de dentro de uma viatura policial que está me levando direto para um manicômio judiciário.
O que me deixa um pouco mais confortável é saber que vou estar mais segura lá dentro do que aqui fora.

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