Capítulo 46: Dançando na chuva

47 8 91
                                    


Quando desço as escadas, encontro Kiran cozinhando com o meu avental branco. Lembro-me dessa cena antes da nossa viagem ao Egito e uma sensação de nostalgia invade meu peito. O jovem parecia concentrado pois cantarolava jogando a panqueca para cima. Desta vez, a massa não ficou presa no teto e bato palmas em comemoração. Ele dá um pulo surpreso ao ouvir as palmas, girando os calcanhares com a frigideira em mãos.

— Oh! Bom dia, Sakura!

— Bom dia, Kiran! — digo parando ao seu lado. — Você conseguiu, parabéns!

— Haha. Eu pratiquei muito em casa! — comenta apoiando a mão na cintura com um sorriso convencido e dou um leve soco em seu ombro. — Aí!

— Eu vou preparar o café.

Enquanto isso, conversávamos sobre assuntos aleatórios e ríamos ao comentar sobre professores que tínhamos em comum. Ao sentarmos à mesa, coloco um pouco de café na xícara de Kiran.

Parecemos casados.

Paraliso com tal pensamento, deixando o café derramar da xícara ignorando os protestos do rapaz. Quando estava no ensino fundamental, sonhava com momentos assim ao lado do Yatori, onde vivíamos como um casal perfeito e sem preocupações. Sempre quis ser boa nos afazeres domésticos porque pensava que, um dia, poderia orgulhá-lo como uma boa dona de casa. Como eu era idiota, né?

— O café é só na xícara, Sakura. Não precisa colocar na mesa também.

— D-Desculpa, estava um pouco distraída.

Respiro fundo, bebericando o café enquanto fitava as panquecas à minha frente junto com várias frutas. Kiran comia tranquilamente, comentando algo sobre a viagem ao Triângulo das Bermudas. O sorriso em seus lábios é tão evidente que posso ver com clareza cada um dos dentes alinhados. As covinhas de suas bochechas, às vezes, aparecem e eu acho aquilo uma graça. Gradativamente, as palavras somem do rapaz e ele devolve o contato visual.

Engulo seca ficando corada e pigarreio alto.

— Kiran, nunca pensou em ser modelo?

Não sei porque essa pergunta veio em minha mente, mas gostei da reação do indiano. Ele engasgou com a própria panqueca e bebeu o café em goles rápidos; só então percebeu que havia queimado a língua. Enquanto Kiran respirava com a língua para fora, buscava palavras para se expressar.

— Eu já recebi algumas propostas. — finalmente começava a se explicar, após o mini surto com o café quente. — Mas eu não consigo me sair bem com tantas pessoas me encarando.

— E aquela reunião na China? Suponho que precisou enfrentar várias.

— Aquela situação era totalmente diferente. Eu precisava fazer aquilo pelo bem da empresa, mas não me senti confortável. O único momento em que me sentirei bem entre pessoas será quando for professor de história.

— Porque é algo que você ama.

— Isso mesmo.

— E eu realmente não teria tempo para desfilar em passarelas. — ele completa. — Tenho que ajudar em casa, as aulas de luta, treinar o piano, escola e sobre nossos planos.

Nossos planos...

— Como consegue fazer tantas coisas? — pergunto curiosa. — Eu não sei como consegue lidar com tudo isso de uma vez.

Ele desvia o olhar um pouco envergonhado, apertando as mãos sobre a mesa e decide olhar em meus olhos após longos segundos.

— Quando eu tinha cinco anos, fui diagnosticado com Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade.

Entre amor e vingançaOnde histórias criam vida. Descubra agora