Capítulo 25

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Farah

Dois dias ANTES.

Soube que eu pisara na Índia só pelo cheiro. Depois de passar tantos dias respirando o ar puro da Grécia, meu olfato passara a se incomodar com odores peculiares mais facilmente. Não precisei olhar para as grandes muralhas vermelhas para saber onde eu estava.

Saltei do carro sonolenta e de cara amarrada para os mercenários. Eu os reconheci sem que precisassem me dizer seus nomes. Me espreguicei após horas de um voo cansativo e um percurso longo de carro. Ouvi minhas articulações estalarem e respirei aliviada quando o desconforto cessou.

— Onde ele está? — perguntei para Raj.

— Lá dentro. — O indiano me respondeu, arisco.

Tchalô! — Me apressou o outro e eu andei aos tropeços até conseguir firmeza nos pés.

Atravessamos o caminho de pedras juntos. Tirei minhas sandálias e esperei até que Manish chegasse com a xícara de café na mão e a gravata retorcida no colarinho da camisa branca. Não houve cumprimento, um abraço com suas mãos de calos incrustrados, e tampouco um beijo para adocicar minha boca.

— O que faço aqui? — perguntei.

Seus olhos castanhos me hipnotizaram. O cabelo escuro com pitadas de raios dourados permanecia o mesmo.

— Eu recebi seu cartão-postal e achei que fosse seu sinal de fumaça que combinamos. O espanto não devia fazer parte das suas feições.

Engasguei com a saliva.

— Não o mandei como um sinal... Você me disse que devíamos esperar pelo menos um pouco, até que meu pai desistisse de nos separar. O que mudou?

Ele olhou por cima do meu ombro e eu vi o sinal que deu para os outros se afastarem de nós. Deixou sua xícara em cima do balcão e foi com uma mão em meu cabelo curto, em um movimento ruim, e me fitou com ojeriza. Me desfiz como pétalas.

— O que fez aqui? — Ignorou minha pergunta, me lançando em uma fria preocupação.

— O cortei — fui firme na resposta. — Não gostou?

— É um pouco tarde para pedir a minha opinião — retrucou, os lábios retorcidos aparecendo em demasia, e desistiu do toque. — Preciso que faça um explosivo para mim.

Um silêncio assolador me invadiu. Respirei.

— O que pretende explodir?

Ele colocou seu corpo em movimento e seguiu pelo corredor da casa. Fui atrás, vendo como estava exatamente como eu me lembrava, cinza, repleta de armas, pedaços de canos, produtos químicos que fediam, pó em cada mísero objeto, fendas abertas por pregos que já não sustentavam quadros engordurados.

— Raj vai te passar tudo o que precisa saber. — Se esquivou da pergunta, alterando a pulsação dos meus batimentos cardíacos.

Minhas pernas travaram e eu fui incapaz de obrigá-las a continuar. Ele queria atacar, não me contar o quê e ainda por cima queria a minha ajuda. Aquilo me aborreceu muito.

— Por que agora? Pensei que conversaríamos mais sobre isso.

Ele se virou e disse sem nenhum tremor:

— Porque finalmente estamos prontos. Chegou a hora de anunciarmos a transformação — e acrescentou ainda mais resistente: — Meus ideais não vão mudar.

Eu sempre soube que Manish fazia parte de um grupo que tinha como intuito revolucionar o nosso país, sempre soube que ele era infeliz vivendo ali como um intocado e que sua intenção era fazer algo grande para mudar sua vida. Enquanto algumas mulheres recebiam rosas, eu ganhava pólvora e outros tipos de insumos para me transformar em uma especialista em explosivos. Ele sabia que eu tinha um amplo conhecimento em química enquanto ele ainda tinha sérios problemas com qualquer tipo de leitura. E eu aprendi, depois de anos de estudos e muitas tentativas, mas Manish nunca me pedira para fazer uma para usá-la em pessoas reais.

O Corvo das Ilhas Gregas (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora