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Angel

   Hoje por fim era o dia mais esperado pela minha pessoa, confesso que minha barriga não está bem e é tudo culpa do meu estômago. Me olho no espelho com a roupa de frio, agradeço e nunca pensei querer tanto que o inverno fosse embora, mas semana que vem já estaremos na primavera e nunca quis tanto sentir o sol realmente queimar minha pele. Acho que nunca desejei tanto vestir um vestido e me sentir livre. Já estamos no terceiro mês prestes a ir para o quarto e desde que ganhei a chave da galeria hoje é o primeiro dia em catorze anos que vou lá.

  Me pego a entrar no carro pensando como o tempo voou até aqui, caramba! Nem parece que sou uma adulta de vinte anos, não me sinto assim é como se eu quisesse por uma vez voltar e viver tudo de novo para ter certeza, penso que agora não me lembro de antes, penso que não aproveitei o tempo, quero voltar e ter aulas novamente sobre a União Soviética e querer aprender mais, sinto que perdi tantas coisas mesmo não tendo perdido nada. Sei lá, o tempo passou tão rápido que me faz pensar o que são míseros cinco ou dez anos, para nós pensamos que o futuro está longe, mas puft! Está bem aqui. Suspiro pesado ao parar no semáforo, pensamentos rondam minha mente enquanto escuto a rádio, já perdi muita coisa na minha vida e me impressiona que boa parte das perdas foram pessoas, pessoas muito especiais para mim, agora, o tempo parece realmente traiçoeiro, se pudesse o parar para aproveitar cada mísero segundo ao lado das pessoas que perdi, Luce, vovó e Fernanda, não gosto de pensar que poderá ter um próximo.

   Me aconchego ao casaco grosso que visto enquanto ando pelas ruas, faltam poucos quarteirões até chegar no lugar, o final do mês se torna mais frio e está pegando realmente pesado conosco. Estou muito pensativa em tudo que está acontecendo em torno de mim, são tantas coisas a realizar essa semana e, ao mesmo tempo, o passado insiste em me nocautear de todos os lados, agora me pego a pensar na palestra, não tenho necessidade de escrever nada que irei dizer, sei que na hora irei mudar tudo como um ator improvisa quando esquece da fala, não preciso decorar nada de um papel, aliás, estou indo lá para falar da minha vida, não dá vida de alguém. Paro em frente ao lugar, que agora nem mesmo parece o que vi quando tinha seis anos, Carl deixou realmente minha cara e digo isso mesmo sem nem ter entrado, mas agora a cor prata foi substituída por um vermelho e o cinza foi reforçado, os detalhes vermelhos são metálicos, a porta de vidro se torna preta e não vejo nada do que há lá dentro, mas só estou parada a ver a frente do lugar, meus cabelos voam e a coragem nunca me vem para dar um passo se quer. Quando por fim faço coloco a chave na fechadura, meus dedos tremendo, ao girar sinto meu coração subir a garganta e uma vez dentro do lugar deixo que uma lágrima caía dos meus olhos. Acendo as luzes, a decoração de dentro, não mudou da de fora, as paredes têm uma cor de cinza-escuro, detalhes em cinza-claro e a decoração de tudo está em vermelho, o carpete é preto e há poucas coisas em detalhes prata. Subo as escadas próximas a mim e a parte de cima já tem uma pequena mudança, os objetos decorativos mudam de uma cor vermelha para cinza fosco, indo por outro corredor acho a porta, o escritório de mamãe, ao entrar percebo que também arrumou aqui, mas ainda parece do mesmo jeito de antes, ao abrir a porta ao lado da secretária encontro os demasiados quadros, os quadros que mamãe deixou, os quadros que seriam talvez a sua próxima coleção lançada se não houvesse o acidente, se não estivesse morrido. Seguro o choro e respiro fundo torcendo o nariz pelo pó. Acendo a luz e com um espirro seguro um quadro, sorri com a imagem de um cavalheiro talvez, vasculhando os quadros encontro aquele que talvez seja a arte que tanto me perguntei como seria, o quadro que Luce disse que fez para mim, era uma tela pequena, pronta para virar o quadro, segurava aos braços o bebê ilustrado que havia asas, Angel, sou eu o bebê, a mulher que está a evaporar, é ela. Estou agachada no meio de tantas obras, que mundinho pequeno aqui, o mundo que um dia foi da minha mãe.

Me levanto do lugar a olhar a pequena sala, deve ter umas quarenta obras aqui, já tenho uma boa quantidade para inaugurar esse lugar, espero que pelo menos um quadro saía das paredes nesse dia, será uma grande vitória. Limpo as mãos na minha calça espanando o pó, observo os quadros entulhados e meus olhos param em um, já perto da porta, pronta para sair da sala, um quadro em específico me chama a atenção, é o único que não está no chão, parece que também é muito especial. Ando até o mesmo que tem uma moldura preta, quando o viro meu coração acelera tão rápido quanto quando cheguei naquela porta, então era por isso que ele não queria me dá a chave?

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Destinados - Um Novo Recomeço- Livro 02Onde histórias criam vida. Descubra agora