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Angel

   Como ir realmente bonita para uma festa num frio de seis graus? Olho para meu guarda roupa sem saber o que vestir. Fernanda não me deu nenhuma dica de onde iríamos e o pior, não tenho nada de como me vestir em mente. Decidindo que olhar o guarda roupas não irá me ajudar muito, seguro em uma meia fina colocando rapidamente sentindo minha pele se arrepiar, uma calça térmica e logo uma de couro por cima, depois da segunda pele ponho uma blusa normal preta, ninguém a verá mesmo, pondo mais uma blusa fina de manga longa e um casaco. Um coturno e um cachecol, preciso de tudo isso para não pegar gripe. Faço uma leve maquiagem e me olho no espelho. Está melhor que nada, pelo menos estou apresentável para onde quer que vá me levar. Quando saio do quarto a mesma me encara, me analisa e sorri.
   — Ainda bem que não escolhi a boate — ela gargalha e temo pelo que vem a seguir.

   Pegamos um Uber, aliás, táxis não passam mais há essa hora, fora que andamos muito até chegar num ponto que o carro passaria pela neve. Ainda tento adivinhar o que ela está aprontando. Quando paramos em frente ao edifício tenho uma pequena teoria do que será e vendo seu interior fico ainda mais feliz em saber que se trata de um teatro. Há muitas pessoas no corredor a espera do espetáculo, algumas bebem, outras conversam. Espero Fernanda com os ingressos, a olhar uma pintura, aquarela.
   — É bonita não é? — a voz reconhecível não sei se me traz calafrios, medo, talvez desconfiança ou raiva por estar na onde estou.
   — Não parece diferente de muitas das obras que vi feita por suas mãos — olho o homem atrás de mim, veste um terno e esbanja um t-shirt branca por baixo do social. Seus cabelos estão jogados para o lado, o que nunca foi habitual, tem sua barba amostra, uma personalidade diferente daqui conheci.
   — Queria mesmo encontrar você — sorri de lado.
   — Pois acho que anda me seguindo — ouço a risada baixa e rouca, o modo que abaixa seu olhar aos pés, as covinhas aparecem num sorriso sincero e carismático.
   — Queria te convidar para um jantar. Como amigos — me surpreende o convite! — nada de conversa rápidas ou esbarrões. Apenas, para lembramos o passado — é algo que eu não quero meu caro, acredite, é lembrar-se do passado.
   — Pode ser — enfim, concordo. Não posso deixar de lado a minha curiosidade sobre o que andou a fazer, talvez até porque não me visitou.
   — Bom, daqui dois dias te pego em casa? — faço meus cálculos, daqui dois dias é sábado, não trabalho, pensou bem Carl.
   — Daqui dois dias então — o rapaz a sorrir pequeno se direciona para longe e meus olhos vão com ele, até parar ao lado da mesma mulher que saiu do apartamento, era o mesmo olhar de desdém. Segura seu braço e entra para o teatro. Fernanda chegou logo após e também fomos para nossos lugares, éramos uma das últimas, com uma visão privilegiada do espetáculo. Mas daqui, consigo o ver e mesmo não o olhando, sinto o seu olhar em mim. Era a mesma queimação de sempre. Não consigo disfarçar, ainda tem um efeito sobre mim o seu olhar tão intimidante. Carl não sumiu da minha mente, apenas descansou por um tempo. O meu olhar cruzou com o seu e agora tenho certeza que não prestou atenção no espetáculo por nenhum minuto desde que sentou ali, não fez menção de virar o rosto nem disfarçar, continuou a me encarar. Não desviou, quero descobrir o porquê, desde hoje até então, ficarei ansiosa para o sábado. Para saber talvez de coisas que possa me dizer, não irei apertar o gatilho de imediato. Irei reagir como uma total estranha a ele, como ele é agora para mim. É um jantar de desconhecidos a se conhecerem formalmente. Eu nunca conheci realmente Carl Gutemberg.

   No fim da peça eu e Fernanda já caímos de sono, à volta para casa foi uma luta para manter os olhos abertos, confesso que meu aniversário foi bom e posso dizer que tenho oficialmente vinte anos. Amanhã ainda tenho um dia de aula e acordar cedo será difícil, não tão difícil quanto foi manter o foco no teatro essa noite. Mas será, agora só desejo a minha cama e um bom sono. Para melhorar tudo, ainda tive que dividir o elevador com a garota loira tagarela ao celular, por sorte o homem de olhos verdes desconhecido por mim, não acompanhou a sua... Amiga? Namorada? Eu não sei e nem quero pensar muito nisso.

   Faço um chá e o tomo quente mesmo, nesse frio você nem sente queimar a língua. Deito na minha cama soltando um longo suspiro pelo relaxamento dos meus músculos. Olho à janela vendo a neve cair me agarro aos lençóis e me encolho na cama para uma perfeita noite que logo acabará e ouvirei o despertador às sete.

Destinados - Um Novo Recomeço- Livro 02Onde histórias criam vida. Descubra agora