Da janela, uma moça observava a paisagem de Hampshire. Tinha para si todas as qualidades que destacavam uma bela jovem de sua estirpe: rica, bonita e educada. No entanto, Georgiana Young sentia um enorme vazio em seu peito, cujo preenchimento ela tinha certeza do qual deveria ser: uma excelente amizade.
Na região, as pessoas escutavam sobre a filha dos Young que não socializava. Os pais, extremamente protetores, aguardavam o dia em que poderiam, enfim, apresentar sua única herdeira à sociedade. O Sr. Young acreditava que uma menina, antes de debutar, seria alvo fácil aos oportunistas e interesseiros; tratando-se de Georgiana, tais figuras poderiam ser muito mais insistentes, visto que a menina já garantia sua fortuna por longas gerações. O Sr. Benedict Young e sua esposa, Katharine, não suportavam a ideia de ter sua mimada filhinha aos olhos cruéis de cavalheiros que poderiam causar-lhe algum mal e se beneficiarem com tais condutas. Assim, trancafiaram-na na luxuosa residência de Gardenfield Park a fim de superprotegê-la dos perigos do mundo.
A família Young era a mais rica de Hampshire, seguida pelos Blackall. Os Young e os Blackall, historicamente, desenvolveram-se em conflitos e rivalidades; tinham-se como inimigos declarados. Todavia, para o cobiçoso Richard Blackall, esses desentendimentos deveriam pertencer apenas ao passado. Quem sabe, ao apresentar Georgiana à sociedade, um dos gêmeos não poderia cortejar a princesa reprimida?
Georgiana, por sua vez, alegrava-se porque dali a um ano teria seu tão aguardado baile. Pouco importavam os pretendentes que viriam a segui-la por um bom tempo até a idade ideal para um próspero casamento; o mais importante era ter finalmente sua liberdade. A garota cansara-se de estudar com sua preceptora amargurada; não suportava mais aprimorar-se ao piano e ao canto; os bordados eram-lhe enfadonhos; os livros, só serviam para nutrir ainda mais a chama da realização de uma aventura. O que Georgiana mais queria era sair daquela prisão que chamava de lar; encerrar, de vez, a proteção exagerada de seus pais. Sabia, contudo, que isto não seria fácil: por mais que fosse apresentada à sociedade, a garota bem entendia que o Sr. e a Sra. Young continuariam com as preocupações. O debute era apenas uma forma de ser vista, mas apenas o casamento traria o sossego necessário.
A jovem não desprezava totalmente o casamento. Na verdade, fora criada a compreender que o matrimônio era uma troca: ambas as famílias, do noivo e da noiva, deveriam ser beneficiados. E bem sabia que esse benefício vinha em forma de dinheiro. Ela, rica, casar-se-ia com alguém de posição parecida com a sua. Nenhuma surpresa ou revolta por parte de Georgiana, apenas um anseio de que esse dia logo acontecesse, pois sua independência — mesmo que fajuta — nascia desse monótono momento.
Georgiana Young aprendera a não confrontar os fatos ou questionar a importância ou a veracidade deles. Como uma boa dama deveria ser — segundo os parâmetros de seus pais —, a menina Young acatava as ordens sem nenhuma reclamação. Refinada e bem apessoada, a moça apenas decorara suas funções, e, mecanicamente, as praticava.
No entanto, naquela tarde, observava a quietude do dia através da janela com um vazio sentimento de melancolia. Em seu íntimo, quase uma nostalgia invadia seu peito, como se ela tivesse algo na memória para tratar com grande afeto. Então, deu-se conta de que era exatamente esse o problema: nada em suas lembranças havia algo especial para ser recuperado; em todos aqueles anos de existência, Georgiana apenas respirava, mas nada vivera.
Desconfortada e angustiada, logo afastou tais pensamentos. Certamente, os pais a repreenderiam por tamanhas reflexões desprovidas de utilidade. Todavia, quando estava prestes a sair de seu posto de observadora da janela, reparou que, ao longe, uma garota — mais ou menos da sua idade — acenava sem nenhuma preocupação quanto à falta de intimidade entre ela. Georgiana, incomodada por ter sido flagrada por uma desconhecida, afastou-se abruptamente da janela, fechando as cortinas como se uma assombração a tivesse perseguido.
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Casamento Branco
Historical Fiction[VENCEDORA DO WATTYS2020 | CATEGORIA FICÇÃO HISTÓRICA] Frederick e August Blackall são irmãos gêmeos não-idênticos. Aos doze anos, iniciam aulas particulares com o reverendo George Stanhope, um homem viúvo com três filhos: Thomas, Arthur e a caçula...